Gestão de floresta pública gera polêmica 

  

Onze florestas nacionais (flonas) podem ser repassadas ainda este ano a empresas
privadas para exploração econômica

O governo quer assinar ainda este ano os primeiros contratos de concessão à iniciativa privada da gestão e exploração econômica de florestas públicas.

Segundo o diretor-geral do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), Tasso Azevedo, onze florestas nacionais podem ser repassadas à administração de empresários ou ao uso de comunidades locais ainda em 2007, de acordo com as regras previstas na Lei de Gestão de Florestas Públicas, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no ano passado.

As florestas estão localizadas no Pará (10) e em Rondônia e despertam o interesse da iniciativa privada.

Azevedo diz que representantes dos setores de construção civil e de cosméticos, por exemplo, já informaram ao Ministério do Meio Ambiente a disposição de disputar as licitações para as concessões. Os dois segmentos cobiçam, respectivamente, madeiras e óleos.

Além disso, bancos privados querem participar – diretamente ou via concessão de empréstimos – de projetos de "desenvolvimento sustentável".

A possibilidade de negócios é amazônica, mas enfrenta resistências no meio acadêmico e no Congresso.

O geógrafo Aziz Ab´Saber e os senadores Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) e Geraldo Mesquita Júnior (PMDB-AC) dizem que o governo contribuirá para a desnacionalização da Amazônia ao conceder à iniciativa privada a gestão de florestas nacionais.

Os ganhos de conhecimento e financeiros obtidos pelos empresários em contratos de até 40 anos, reforçam os críticos, ultrapassarão as fronteiras nacionais.

"Testa-de-ferro"

"É o aluguel das florestas. É o primeiro passo para internacionalizar a Amazônia, e de maneira legal", critica Cavalcanti, que promete ajuizar uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a lei.

Líder do PTB no Senado, Cavalcanti declara que o governo não tem estrutura para fiscalizar o que será feito nas áreas sob gestão da iniciativa privada nem saber quais são os verdadeiros beneficiários da exploração econômica.

"Um brasileiro pode ser testa-de-ferro de um estrangeiro que vem à Amazônia fazer pesquisas sobre biodiversidade e produtos farmacêuticos."

Para Mesquita Júnior, o governo corre o risco de contribuir para a internacionalização da Amazônia porque caiu na "esparrela da pseudo-vocação da região para ser fornecedora de matéria-prima bruta".

Eleito na mesma chapa da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, o senador peemedebista afirma que o governo deveria investir mais no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Transformá-lo em uma espécie de Embrapa do desenvolvimento sustentável.

Com pesquisadores e cientistas, o Inpa teria condições de explorar a biodiversidade e municiar uma grande indústria farmacêutica nacional.

Escravidão

"O desenvolvimento sustentável será, na verdade, a atividade das populações locais, como trabalhadores escravos, sustentando os ganhos das grandes corporações", acusa Mesquita Júnior.

Azevedo alega que a lei impede a privatização das florestas nacionais, ao deixar claro que não podem ser vendidas. Ou seja, fecha – e não abre – brechas para a posse do território por estrangeiros, que podem comprar terras públicas à vontade no Brasil.

"A lei resguarda o patrimônio brasileiro e cria regras claras sobre como usá-lo", diz Azevedo.

O secretário acrescenta que o novo modelo prevê fiscalização redobrada. O Ibama cuida da parte ambiental, o SFB do cumprimento dos contratos e, auditorias independentes, da observância das regras por governo e concessionários. 

Azevedo ressalta que a lei não dá às empresas o direito de fazer registro de coleta de recursos genéticos, que é o primeiro passo para a obtenção de propriedade intelectual. Assim, coíbe a biopirataria.

O secretário reconhece, no entanto, que, se os recursos saem ilegalmente do País, a defesa da biodiversidade brasileira fica sujeita a interpretações dos tratados internacionais.

Quatro flonas têm planos de manejo já aprovados

Das onze florestas nacionais (flonas) que podem ser concedidas à iniciativa privada, quatro despontam como favoritas para estrear a modalidade, porque já têm planos de manejo aprovados.

São elas: Carajás, Saracá-Taquera, Tapirapé-Aquiri e Jamari. As três primeiras estão localizadas no Estado do Pará. A última fica em Rondônia. Juntas, têm área de 1,258 milhões de hectares.

Segundo o diretor-geral do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), Tasso Azevedo, ainda não foi decidido se as áreas serão destinadas à iniciativa privada ou ao uso das comunidades locais. Há ainda a possibilidade de adoção, ao mesmo tempo, das duas medidas.

Na semana passada, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, discutiu com o presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Demian Fiocca, a criação de duas linhas de crédito para financiar atividades nos distritos florestais sustentáveis e concessões de manejo florestal.

Nenhuma decisão foi tomada no encontro, no qual foi discutida, por exemplo, a situação de Carajás.

O plano de manejo de outras três florestas está em elaboração pelo Ibama. Localizadas no Pará, Altamira, Itaituba I e Itaituba II têm 1,372 milhão de hectares.

Amanhã, termina o prazo para inscrição na disputa pelo direito de elaborar planos de manejo de mais quatro florestas situadas em território paraense: Trairão, Jamanxin, Crepori e Amaná, cuja área somada é de 2,837 milhão de ha.

O governo espera que em dez anos a área máxima sob gestão da iniciativa privada seja de 13 milhões de hectares (cerca de 3% da Amazônia).

Estima que as concessões gerem receita anual de R$ 187 milhões com a cobrança de taxas pelo uso e arrecadação de R$ 1,9 bilhão ao ano em tributos.

 

Fonte: Gazeta Mercantil, Daniel Pereira, 31/1/2007.


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