Gangues assustam escolas, diz pesquisa da Unesco
Chamadas de "patotas" por uns e "organizações juvenis" por outros, as gangues estão cada vez mais presentes no cotidiano das escolas públicas, na maioria das vezes associadas à violência. Estão tão presentes que 20,4% dos alunos da rede pública de cinco capitais brasileiras dizem haver gangues nos locais onde estudam, sendo que 94,2% deles enxergam ligação com a violência na escola. O maior índice está no Distrito Federal, onde 30,5% dos alunos dizem haver gangues nas escolas. O menor é o de Salvador (11,2%). Foram ouvidos ainda alunos em Belém, Porto Alegre e São Paulo. Os dados são da pesquisa "Cotidiano das Escolas: Entre Violências", elaborada pela Unesco (braço da ONU para a Educação, Ciência e Cultura) e em fase de finalização. Com base em mais de 12 mil questionários, pesquisadores estão tratando temas desde roubos até agressões e armas. A Unesco aponta que a presença das gangues é tida como um fator de fomento do "sentimento de insegurança e, portanto, de falta de confiança na escola". Iniciado em 2003, o estudo tem o objetivo de captar e analisar como a comunidade escolar percebe casos de violência no cotidiano e o modo que lida com eles. A professora Eliene Maria Carvalho, que trabalha no ensino médio no Centro Educacional 4, em Sobradinho 2, considerada uma das regiões mais violentas no DF, reclama da falta de apoio. "A gente não dá conta sozinho. Não temos estrutura para atender todas as necessidades dos jovens", diz. A pesquisa da Unesco procura mostrar que o termo gangue é usado genericamente para designar desde uma organização juvenil visando criar identidade entre os integrantes até grupos que praticam assaltos e usam drogas. "A gangue tem um papel facilitador em um momento difícil da vida da juventude e pode aparecer como um pseudo-refúgio simbólico e mágico", diz o trabalho. Para a cientista política Maria das Graças Rua, do Centro de Pesquisas e Pós-Graduação sobre as Américas da UnB (Universidade de Brasília), o jovem quer ser respeitado e construir sua identidade. "O tempo de vida do jovem é curto. Ele não consegue pensar no longo prazo, quer tudo para agora", diz ela, que é co-autora do livro "Gangues, Galeras, Chegados e Rappers", editado pela Unesco. O depoimento de Neytor, um ex-pichador, no livro "Carlos & Astro: Uma Vida, Dois Mundos", descreve essa percepção. "Não sabemos bem o porquê de entrarmos nesta vida louca. Se foi para obter fama ou mesmo para expressar nossa rebeldia." Esse caminho perpassa casos como o descrito por uma professora em Belém: "Eu estava dando aula. Aí entraram aquelas gangues batendo no aluno". Ou o caso narrado por um aluno: "A gente tem de ficar calado". Apesar de não estar explícito na pesquisa da Unesco, esse medo pode ser um dos motivos que explicam o alto índice de entrevistados que responderam "não saber" se existe gangue nas escolas.
Fonte: Folha de S. Paulo, Luciana Constantino, Brasília, 12/04/2005 Projetos atraem ex-membros de gangues no DF
Projetos para tentar reduzir a violência praticada por adolescentes são um caminho trilhado por alguns ex-integrantes de gangues no entorno de Brasília. É o caso de Iranildo Gonçalves Moreira e Carlos Washington Chagas Correa, o Astro. Moreira, que passou a juventude em Sobradinho, é hoje vice-diretor do Grupo Azulim, uma organização não-governamental que nasceu há cinco anos e desenvolve oficinas de hip hop e capoeira para jovens. Já Astro, que vivia em Ceilândia e liderou gangues de rua no Distrito Federal, escreveu o livro "Carlos & Astro: Uma Vida, Dois Mundos" e hoje é um dos colaboradores do projeto Picasso Não Pichava. O projeto começa neste ano uma nova etapa: terá cursos de serigrafia, com a previsão de comercializar os trabalhos. "Hoje o Astro nos ajuda contando sua experiência de vida aos alunos e mostrando que há outros caminhos", afirma Carlos Vogado, coordenador-geral do Picasso Não Pichava. Fonte: Folha de S. Paulo, 12/04/2005.. |