Universidades federais poderão ser obrigadas a cobrar mensalidades
O governo Lula está sendo eficiente em transmitir más notícias. Depois da reforma da Previdência e da Ação de Inconstitucionalidade contra a transposição de regimes de 1990, o mais novo ataque está voltado, entre outros alvos, para as universidades federais. O Ministério da Fazenda divulgou, no último dia 13, um roteiro para ampla reforma do gasto social no Brasil, cujos "obstáculos" principais seriam o financiamento das instituições públicas de ensino superior e as deduções dos gastos com educação e saúde no Imposto de Renda da Pessoa Física. A justificativa é que essas são formas de "os mais ricos" se apropriarem de uma grande fatia dos gastos públicos na área social. O documento de 47 páginas é específico no caso das universidades: "(...) estimativas indicam que o esforço fiscal e social médio por aluno associado a (sic) oferta gratuita de ensino superior no Brasil é superior ao esforço realizado em países mais ricos e bem superior ao de países em desenvolvimento", segundo consta na página 35. Só faltou escrever que deverá haver cobrança de mensalidades. Tem mais: "A canalização de grande parte do orçamento da educação para o financiamento das instituições federais de ensino superior reduz o montante de recursos disponível para os demais estágios da educação". Ou seja, não existe qualquer sugestão para reduzir o pagamento de juros da dívida externa, mas as verbas do ensino superior são consideradas sufocantes para os demais níveis de ensino. Os absurdos não param aí. "Cerca de 46% dos recursos do Governo Central para o ensino superior beneficiam apenas indivíduos que se encontramentre os 10% mais ricos da população". No entanto, dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE de 2001, só disponíveis neste ano, mostram uma outra realidade. Metade dos estudantes das escolas privadas fazem parte dos 10% mais ricos da população, com uma renda amiliar média de cerca de R$ 4.500 por mês; no setor público, só 34,4% têm essa renda. No outro extremo, 11,7% dos alunos do setor público vêm da metade mais pobre da sociedade, com renda familiar de R$ 482 ou menos, enquanto a proporção deste grupo no setor privado é de 5,4%. No setor privado, 80,7% dos estudantes se definem como brancos, enquanto no setor público são 67,1%. Também não deverá faltar apoio ao setor privado da Educação, segundo o documento do Ministério da Fazenda (disponível em www.fazenda.gov.br, com o título "Gasto Social do Governo Central: 2001 e 2002"). Em outro trecho, da mesma página 35: "(...) a expansão dos empréstimos a estudantes de baixa renda, com taxas subsidiadas permitiria ampliar o acesso de estudantes de baixa renda ao ensino superior, com custos mais reduzidos para o setor público, através do FIES (programa de crédito educativo)." E a reforma universitária nessa história? Curiosamente, para não dizer outra coisa, a "bomba" do Ministério da Fazenda é nunciada simultaneamente aos trabalhos da recém criada comissão interministerial que deve presentar uma reforma das universidades federais. O Ministério da Fazenda compõe o grupo. Não foi à toa, portanto, que a Plenária Extraordinária do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, realizada em Belo Horizonte, no início deste mês (para aproveitar a realização do FSB), aprovou uma moção em que considera ameaçada a autonomia universitária, com a criação da tal comissão interministerial. De acordo com o texto aprovado no evento: "Neste sentido, os participantes da Plenária Extraordinária do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública se manifestam contrariamente a qualquer medida que restrinja ou ameace a plena autonomia da universidade brasileira e reafirma a proposta para a universidade brasileira contida no Caderno Andes, nº 2 (3ª edição atualizada e revisada. Brasília – DF, outubro/2003); na proposta de Universidade Cidadã para os Trabalhadores (Fasubra) e no Plano Nacional de Educação: Proposta da Sociedade Brasileira". Fonte: Jornal da ADUFRJ,17/11/2003. Enquanto isso, ... REVISÃO
SOCIAL
É mais do que custam as deduções das despesas com educação no Imposto de Renda - um dos grandes alvos da reforma proposta pela Fazenda no documento "Gasto Social do Governo Central", divulgado há dez dias. A Receita Federal deixará de arrecadar neste ano R$ 626 milhões com o abatimento dos gastos com educação no Imposto de Renda da Pessoa Física.
A Fazenda avalia que esse último
benefício fiscal privilegia os brasileiros mais ricos. E o fim da "proteção
exagerada" aos brasileiros mais abastados é o que norteia o roteiro de
reforma sugerido pela Fazenda. Uma reforma que o ministério prefere
classificar de "diagnóstico". O fim do incentivo às filantrópicas, sugerido muito sutilmente pela Fazenda, conta com o apoio de João Carlos Di Genio, reitor da Unip (Universidade Paulista), a entidade privada com o maior número de alunos, segundo o último Censo da Educação Superior: mais de 88 mil matrículas.
Formado em medicina pela USP, ele diz que
o aumento das matrículas não pode se concentrar no ensino privado:
"Atualmente sobram vagas porque falta aluno com capacidade de pagar, e a
inadimplência média é de 30%".
Em troca da suposta benemerência, as
filantrópicas têm isenção da quota patronal de 20% sobre a folha de salários
para o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), além de outros impostos.
A Receita Federal não divulga dados sobre o custo dos benefícios tributários
a essas instituições. Na opinião do ministro Cristovam Buarque (Educação), uma alternativa para atender aos universitários carentes é a concessão de bolsas de ensino na rede privada pagas pela União. Em contrapartida, esses alunos prestariam serviços sociais, como a participação em programas de alfabetização. A proposta, que prevê beneficiar 30 mil estudantes e precisa de aprovação do Congresso, está na Casa Civil.
Fonte: Folha de S. Paulo, Marta Salomon, Luciana Constantino, 23.11.2003. |