Faltam 710 mil professores no país 

  

Estimativa do Ministério da Educação aponta que faltam cerca de 235 mil professores no ensino médio no país. Os números do déficit de profissionais no ensino fundamental de quinta a oitava séries são ainda mais pessimistas.

De acordo com as projeções, 475 mil cargos de docentes seriam necessários para completar os quadros. Isso mostra um amplo mercado para quem quer prestar vestibular e se licenciar para dar aulas.

Os dados são baseados no censo escolar de 2002 e apenas dão uma idéia geral da situação. Eles referem-se às chamadas "funções docentes", expressão que está relacionada a cada cargo -ou seja, um professor que dá aula em duas escolas tem duas funções docentes.

Entre as disciplinas, a demanda é maior por licenciados em matemática, física, química e biologia, segundo o MEC.

Mas o atrativo do emprego quase certo é obscurecido pelas longas jornadas, salas de aula cheias, conflitos, baixos salários. Ainda assim, há quem não mude a resposta para a famosa pergunta "O que você vai ser quando crescer?". Professor.

É o caso de Gabriel Stornioli Lemos, 18, que decidiu prestar licenciatura em história. "É o curso que mais gosto. Não consigo me ver em outra coisa. Quero dar aulas", diz.

Foi a influência dos educadores que levou Luciana Barone Vitorello, 41, ao magistério no colégio Dante Alighieri, onde é responsável por uma sala de 26 alunos do pré. "Quem vai escolher a carreira tem de optar com o coração. É impressionante nossa importância no crescimento das crianças", diz.

Nos últimos dez anos, o curso de pedagogia foi um dos que tiveram maior crescimento de procura na Fuvest. O número saltou de 1.027 inscritos para 3.310, sendo que as vagas passaram de 120 para 180.

É que a LDB (Lei de Diretrizes e Bases), de 1996, estabelece a necessidade de nível superior para dar aulas na educação infantil e ensino fundamental de primeira a quarta séries.

Mesmo assim, para a presidente da Anfope (Associação Nacional pela Formação de Profissionais da Educação), Helena Costa Lopes de Freitas, é difícil motivar o jovem para seguir a profissão, já que historicamente ela veio sendo desvalorizada.

"A juventude não se mobiliza só por razões econômicas. Nessa etapa da vida, o jovem tem seus ideais. E a profissão de professor é uma das atividades mais criadoras."

Roberto Leão, secretário-geral da CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação), diz que quem quer prestar vestibular para se tornar um educador é muito bem-vindo.

"O país precisa de pessoas que aceitem o desafio para que a profissão recupere o prestígio de outras épocas."

No Estado, professora lida com conflitos

"O que pesa é que o aluno não tem interesse. O número de alunos por sala é muito grande, são mais de 40. A gente acaba como uma administradora de conflitos. Não temos horário para preparar aula, ler e corrigir as provas. Tudo isso a gente faz em casa. O salário também não é bom. Tem muita gente que tem de dar aula em várias escolas para complementar a renda", conta a professora de português Eva Volite Coelho, 36.

Há nove anos, ela tornou-se docente do ensino médio da Escola Estadual Padre Manuel da Nóbrega, conhecida como Matão, no bairro da Casa Verde, zona norte da capital.

Mesmo com as dificuldades, Eva nunca pensou em deixar o emprego. "A convivência também tem um lado positivo. É muito interessante quando a gente vê um estudante entusiasmado. Sei que participei um pouquinho da evolução dele", diz.

Antes de chegar ao magistério, Eva experimentou o trabalho em empresas na área de vendas. Foi só depois de concluir a faculdade e de prestar concurso público que tomou contato com a realidade.

"Quando comecei, fiquei decepcionada. Eu achava que só iria ensinar, mas tinha muitos conflitos para resolver", conta.

Eva não observa interesse de lecionar em seus alunos. "Até eles reconhecem que não é fácil nossa profissão."

Rede particular paga até seis vezes mais 

As escolas particulares representam 20,8% dos estabelecimentos de ensino do país e são responsáveis por apenas 13,1% de todas as matrículas, desde a educação infantil até o ensino médio, segundo dados de 2005 do MEC. Mas elas podem ser o caminho mais satisfatório para os professores.

"Se o ensino público tem uma enorme necessidade de professores, mas não valoriza os salários e a carreira, a escola particular é uma profissão rendosa", afirma Maurício Pietrocola, professor da Faculdade de Educação da USP.

"Os profissionais que fazem o curso em boas faculdades são muito procurados pelo mercado privado e chegam a ganhar até seis vezes mais que os professores de escolas públicas", diz.

O piso salarial até a quarta série em São Paulo é de R$ 668,09 (para uma jornada de 24 horas semanais). Da quinta série até o ensino médio, fica em R$ 773,41. Na rede particular, o piso salarial é um pouco maior e calculado sobre a hora/aula. Mas as escolas "top" costumam pagar até bem mais que o piso.

O presidente do Sinpro (Sindicato dos Professores de São Paulo), que representa os docentes das escolas particulares, Luiz Antonio Barbagli, afirma que o mercado tem se mostrado estável nos últimos anos, mas ele aponta um lado negativo na rede privada.

"A carreira é estagnada. O professor só cresce economicamente quando muda de escola."

Há espaço para quem tem boa formação. Em 2005, apenas 47,7% dos professores de primeira à quarta série tinham nível superior. Em 1999, quando os dados começaram a ser disponibilizados, só 23,3% tinham atingido esse grau de escolaridade.

A porcentagem dos professores licenciados aumentou a partir da Lei de Diretrizes e Bases de 1996. Ela apontava como formação ideal a de nível superior.

Em 1998, eram 240 os cursos de pedagogia. Em 2005, já eram 1.731 de pedagogia e 1.180 de curso normal superior (regulamentado em 1999).

 

Fonte: Folha de S. Paulo, Simone Harnik, 12/9/2006.


Opiniões sobre os artigos ...


Coletânea de artigos


Home