A expansão da
Universidade federal Todas as iniciativas para a abertura de vagas e o crescimento de matrículas em Universidades federais partiram delas próprias. A sociedade brasileira reclama, com justa razão, a expansão do ensino superior, seja pelo interesse coletivo de prover o país de mão-de-obra qualificada, seja pelo legítimo desejo individual de ascensão social. Publicamente, todos concordam com a necessidade de aumentar a oferta de vagas. A meta está no Plano Nacional de Educação (PNE). Na prática, barreiras silenciosas, porém concretas, se apresentam. A falta de prioridade política, custos elevados, legislação restritiva, corporativismo e baixo poder aquisitivo, entre outras. Desde a década de 60, os governos têm respondido a essa demanda com incentivos para o crescimento do setor privado. Ao lado de limitações financeiras do Estado, essa opção refletiu, com intensidade variada no tempo, uma atitude ideológica. Ocorre que esse modelo está se exaurindo – basta verificar os índices de inadimplência e o de vagas ofertadas e não ocupadas. Nos anos 90, ocorreu uma explosão de vagas, meritória, mas ainda insuficiente. Esse fenômeno teve pelo menos quatro características: hegemonia do setor privado, desigualdade regional de ofertas, baixa qualidade dos cursos e é irreversível. Todas fruto do elemento regulador desse processo, o mercado, e da ausência de fiscalização. Nesse contexto é que se insere o papel das Universidades federais e da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) na expansão. A ação do Estado, quando planejada, e o comprometimento das instituições públicas podem corrigir distorções. Registro: o papel das instituições de ensino superior estaduais é fundamental para o alcance da meta do PNE. Em 1994, a Andifes propôs – e o MEC aceitou- e, de forma inédita, foi estabelecido um critério técnico para ser feita a distribuição dos orçamentos de investimento e de custeio de cada Instituição Federal de Ensino Superior (Ifes). Ele aloca mais recursos em função do número de alunos, incentiva cursos noturnos e a interiorização e força a eficiência na relação entre ingressantes e concluintes. Em 1998, a Andifes tomou a iniciativa e firmou com o MEC um protocolo de expansão. As Ifes cumpriram a sua parte, mas o governo não correspondeu. No entanto, salienta-se que a instituição da gratificação de estímulo à docência ajudou na otimização da carga de trabalho dos professores. No dia 5 de agosto de 2003, os reitores das Universidades federais foram recebidos pela primeira vez por um presidente da República. A Andifes novamente apresentou uma proposta de expansão com 13 metas, entre as quais a de dobrar o número de alunos nas Ifes. Em contrapartida, era necessário consolidar a autonomia, recompor a força de trabalho diminuída nos últimos anos e financiar adequadamente cada projeto, que deveria compor um planejamento nacional. Portanto, a criação de novas Ifes e novos campi pelo atual governo -que merece aplausos- surgiu desse encontro. Por isso, é forçoso reconhecer que todas as iniciativas para a abertura de vagas e o crescimento das matrículas nas Universidades federais partiram delas próprias e receberam maior ou menor acolhida dos governos. Do Congresso Nacional nunca faltou apoio às propostas que ali chegaram. Hoje, observamos várias ações do MEC e das Ifes para expansão. Isso finalmente nos permite dizer que a batalha ideológica foi vencida. Existem mais de 50 campi ou instituições, além de cursos, em implantação. Superou-se o tabu de não expandir o ensino superior com novas vagas federais, isto é, públicas, de qualidade e gratuitas. O mérito da nova visão, porém, não a exime de falhas. O modelo peca pela falta de critérios e de sustentabilidade. Em um ambiente de demanda real e generalizada, qualquer nova vaga pública se explica e será comemorada, mas, além disso, em um país com enormes desigualdades sociais e regionais, com escassez de recursos, é preciso que cada ação de governo também se justifique. Os insumos para a instalação dos novos campi têm se restringido aos recursos financeiros iniciais, mas, sem constar do Plano Plurianual, compromete a continuidade. Nenhuma vaga de professor ou técnico-administrativo foi criada. Está em curso um perigoso processo de canibalizacão das vagas existentes -que já são insuficientes-, o que compromete a qualidade do sistema atual. Os dados do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) e da Secretaria do Tesouro Nacional comprovam que até 2003 o número de alunos aumentou, e os gastos atualizados, inclusive com pessoal ativo, diminuíram, assim como os recursos humanos das Ifes. Essa relação inversa conduziu a capacidade de funcionamento dessas instituições ao limite. Por isso, a expansão, que reflete o desejo da sociedade, deve ser planejada, programada e sem prejuízo do sistema existente.
Se assim for feito, as
Ifes, como órgãos de Estado, cumprirão melhor o seu papel de instrumentos da
sociedade para ampliar e corrigir as falhas da expansão baseada no setor
privado, superando as desigualdades regionais, promovendo o desenvolvimento
nacional e a democratização do acesso ao ensino superior. *Gustavo Balduino, engenheiro mecânico, especialista em planejamento, orçamento e gestão pública pela FGV, é secretário-executivo da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), co-autor do livro "Brasília 2002, memórias de uma eleição". Artigo publicado na “Folha de SP”. Fonte: Folha de S. Paulo, 20/1/06 |