Duas faces 

 

Projeto de Reforma Universitária tem viés dirigista
 

Depois de meio mandato de Luiz Inácio Lula da Silva ninguém se surpreende mais com um governo de duas faces.

Há o governo da responsabilidade fiscal e da seriedade no manejo da macroeconomia; mas há também o que solta as rédeas dos gastos públicos correntes, e com isso engatilha um problema que poderá causar sustos ao próprio presidente na campanha da reeleição.

Há o governo das amplas alianças políticas, de diversos coloridos ideológicos, e existe aquele do aparelhamento da máquina do Estado; de filosofia dirigista, sempre preocupado em subordinar a sociedade a interesses de corporações.

Essa outra face do governo Lula produziu o projeto do Conselho Federal de Jornalismo — com acerto, engavetado no Congresso.

Também gerou a Ancinav, proposta ainda a ser encaminhada aos parlamentares e que, disfarçada de agência de promoção da indústria audiovisual, é na verdade uma intervenção arbitrária no setor.

Agora, acaba de lançar mais um projeto, dentro do mesmo figurino: o da Lei de Educação Superior, que trata de uma reforma universitária ampla e irrestrita, para os setores público e privado, e na qual transparecem os mesmos cacoetes dirigistas e intervencionistas.

O anteprojeto da lei, colocado pelo Ministério da Educação em discussão pública até 15 de fevereiro, para depois ser levado ao Congresso, na prática revoga a autonomia universitária.

Dentro das características desse outro governo Lula, o dirigista, a proposta se subordina a uma idéia perigosa de justiça social cujo resultado é a revogação do conceito de mérito na vida universitária e a submissão do ensino superior e da pesquisa a difusos interesses da “comunidade” e da “sociedade civil”.

Na verdade, trata-se de abrir de uma vez por todas a universidade à pressão de grupos políticos organizados. O principal instrumento dessa intervenção serão “conselhos comunitários sociais”, em que reitores se sentarão lado a lado com sindicalistas e representantes da “sociedade civil”.

Mas o projeto vai além disso. Daí, e pela importância do tema para o futuro do país, aconselha-se ao MEC estender o prazo para as discussões.

 

Fonte: O Globo, Editorial, 12/1/2005


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