Governo debate conversão da dívida em verba para educação 
 

Compromisso de criar um grupo de trabalho para debater questão
foi assumido durante reunião da Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Educação
com os ministros José Dirceu,
da Casa Civil, e Tarso Genro, da Educação.


O governo federal vai criar um grupo de trabalho para discutir formas de tornar viável a proposta de conversão da dívida externa em recursos para a educação. O compromisso foi assumido, quarta-feira (27), durante reunião da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) com os ministros José Dirceu (Casa Civil) e Tarso Genro (Educação). Em janeiro deste ano, a CNTE lançou uma campanha pela conversão da dívida como alternativa para o financiamento do ensino público. Na ocasião, a entidade entregou um documento no Palácio do Planalto que reivindicava a abertura de um canal de negociação com a sociedade civil para discutir essa questão. O encontro faz parte da VI Semana Nacional em Defesa e Promoção da Educação Pública, que inclui uma série de atividades como seminários, audiências públicas e marchas pelo país.  

“A educação precisa de dinheiro novo e não vamos conseguir esse dinheiro sem a resolução do problema da remessa de recursos para amortização e pagamento de serviços da dívida”, afirma Juçara Vieira, presidente da CNTE. A entidade defende que, para uma educação pública de qualidade, precisam ser destinados R$ 180 bilhões anualmente, o que corresponde a 10% do PIB. “A proposta é viável, apesar de haver muitas dificuldades para isso. No entanto, já existem algumas experiências bilaterais neste sentido como, por exemplo, entre Argentina e Espanha. O ambiente no cenário internacional é propício, já que muitos países não conseguem pagar a dívida. Também temos suporte social e a mobilização pode ganhar corpo com a campanha”, acredita. Até agora a proposta já conta com o apoio do MEC e de diversas entidades e movimentos sociais como a Organização dos Advogados do Brasil (OAB), Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Unesco e Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed).  

A reunião com os ministros foi antecedida por uma marcha dos trabalhadores em educação, que paralisaram suas atividades em todo o país, da Catedral de Brasília até a Esplanada dos Ministérios. Participaram da manifestação cerca de 10 mil pessoas, que chegaram em caravanas de diversos lugares do Brasil para pressionar o governo e o Congresso Nacional por maiores investimentos no ensino público. Na parte da manhã, os profissionais de educação participaram de uma audiência com o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, na qual entregaram um documento pedindo apoio dos parlamentares ao Movimento pela Conversão da Dívida Externa em Recursos para a Educação. Outra preocupação apresentada por esses trabalhadores ao presidente da Câmara e aos ministros diz respeito à proposta do Fundeb (Fundo de Educação Básica), atualmente engavetada pelo governo federal, que ainda não resolveu o problema de onde tirar os recursos necessários para viabilizar o fundo. Eles querem que ela seja encaminhada para o Congresso Nacional o mais rápido possível e pressionaram para que a tramitação também seja ágil.  

A campanha pela conversão da dívida em recursos para a educação também pretende traduzir para a sociedade o que é o problema da dívida, explicando por meio de cartilhas, aulas públicas e seminários, o que poderia representar a aplicação desses recursos na educação brasileira. “São gerações que nem sabem como foi contraída a dívida, a título de quê. Queremos tornar mais popular esse tema, para que ele deixe de ser apenas técnico”, explica Juçara.  

Aula pública

O ministro Antonio Palocci (Fazenda) e outros líderes governamentais e do Congresso participam, nesta quinta (28), de uma aula sobre o que é preciso para melhorar a educação brasileira. Se não comparecerem de fato, ao menos estarão representados por 32 bonecos de papelão, personalizados com a caricatura do rosto de cada um, e em tamanho real, que participarão de aula pública em frente ao Ministério da Fazenda, na companhia de parlamentares, sindicalistas, educadores, grupos juvenis e integrantes do MST. Todos eles foram convidados e caso alguns apareçam para assistir à aula, os bonecos correspondentes serão retirados. Essa é uma das atividades da quinta edição da Semana de Ação Mundial, que ocorre de 24 a 30 de abril, organizada pela Campanha Global pela Educação, da qual estão participando mais de cem países neste ano. No Brasil, as atividades ocorrerão em diversos Estados, coordenadas pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, com o tema “Chega de desigualdades! Educar para superar a pobreza”.  

Os professores dessa aula especial serão pessoas que representam segmentos fundamentais da educação, como um professor e uma estudante da rede pública e uma mãe de aluno, que também é educadora popular no MST. No conteúdo, a importância da educação para enfrentar as desigualdades, dados da atual situação da educação no país e do orçamento para ela. Além disso, serão apresentadas ações concretas para mudar essa realidade, como a criação do Fundeb, a derrubada dos vetos do Plano Nacional de Educação (PNE), a retirada dos investimentos destinados à educação das metas do superávit primário, e a realização da Conferência Nacional de Educação.  

“Convidamos para a aula as pessoas que de fato gostaríamos que ouvissem o conteúdo dela e levassem isso em conta no processo decisório. Estamos cansados de ouvir que educação é prioridade. Esse consenso vazio precisa ser transformado em medidas concretas que garantam a implantação de uma educação pública de qualidade. Queremos pressionar essas pessoas para que saiam do discurso, sobretudo na questão do financiamento”, afirma Denise Carreira, coordenadora da Campanha Nacional pelo direito à Educação. Com a presença dos bonecos, eles querem mostrar a dificuldade enfrentadas por movimentos e redes da sociedade civil em conseguir falar diretamente com essas pessoas. Também irá acompanhar a aula uma boneca representando uma mulher negra, com uma interrogação no rosto, para questionar o fato das principais lideranças, ou seja, aqueles que realmente participam das tomadas de decisão mais importantes no país, serem homens e brancos. A pressão virtual é outra ferramenta que está sendo usada pela Campanha durante a Semana de Ação Mundial. Está disponível em sua página na Internet (www.campanhaeducacao.org.br) um cartão virtual cobrando do Palocci e da equipe econômica os recursos necessários para o Fundeb.  

Além disso, será feita em todo o país a pesquisa “Participar para transformar” para identificar as formas e os espaços de participação, existentes na escola e na comunidade, comprometidos com a transformação da realidade desigual brasileira e a melhoria da educação pública. A pesquisa, que não terá caráter científico, também quer ouvir de estudantes, profissionais da educação, familiares, organizações e grupos comunitários o que impede as pessoas de participarem de ações coletivas e o que as faria participar mais. “Acreditamos que a desigualdade só muda com a pressão e participação da sociedade civil, nada vai ser concedido. As diferentes formas que a população se organiza são fundamentais nessa construção. Queremos abordar o conceito de participação com um olhar ampliado, incluindo grupos culturais, temáticos e esportivos, para não cair no discurso de que nosso povo não participa”, diz Denise. A metodologia foi elaborada em parceria com o Instituto Paulo Montenegro/Ibope, por meio do Projeto Nossa Escola Pesquisa Sua Opinião (Nepso).

 

Fonte: Ag. Carta Maior, Fernanda Sucupira , 28/04/2005.


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