REFORMA UNIVERSITÁRIA
Para o ministro da Educação, haverá interferência do Congresso nas reformas em andamento. Mesmo assim, o MEC entregará a versão definitiva da reforma universitária ao presidente no final de julho. Depois de passar pela última análise de uma comissão técnica do Ministério da Educação, no dia 28 de julho, a terceira versão do projeto de reforma universitária deve ser finalmente entregue ao Presidente da República. Daí, segue para tramitação no Congresso Nacional, onde, historicamente, a conjuntura para a defesa do ensino superior público é desfavorável. O setor privado ocupa espaços importantes na Comissão de Educação do Congresso e também no Conselho Nacional de Educação. A probabilidade, portanto, já grande, de que mudanças durante a tramitação levem a um desvirtuamento da reforma se potencializa ainda mais num momento de crise política do governo. Desde que foi colocada para debate em dezembro do ano passado, a versão preliminar do Anteprojeto da Lei de Educação Superior vem sofrendo mudanças significativas, numa tentativa de ganhar apoio das instituições de ensino privadas e da bancada que a defende em Brasília. Uma delas foi em relação à existência de fundações nas universidade públicas. E extinção desses órgãos, prevista na primeira versão do anteprojeto, já desapareceu. Hoje, a reforma universitária trataria apenas de regulamentar seu funcionamento. Já os Conselhos Comunitários Sociais, que seriam responsáveis pelo controle social das instituições privadas, ganharam um caráter meramente consultivo, e podem desaparecer nos debates travados pelos parlamentares. Nesta quinta-feira (30), ao participar de um evento em São Paulo organizado pelo Projeto Brasil, o ministro da Educação, Tarso Genro, descreveu as discussões realizadas acerca do projeto de reforma universitária como uma tentativa de “busca de consensos”, e não como uma cessão às pressões das universidades particulares. “A proposta de extinção das fundações na primeira versão foi deliberadamente provocativa. Há quadros do ministério que achavam que elas tinham que ser extintas, mas esta não era a média”, disse. “Tudo são negociações. Não temos vergonha de dizer que negociamos com o setor privado. A reforma é um processo de negociação. Só podemos valorizar o ensino público com o apoio do setor privado, até porque sabemos que eles têm uma bancada muito forte no Congresso. É um processo de disputa política”, disse Genro. O ministro disse que não é possível prever se haverá uma deformação da proposta no Parlamento. Mas, depois de sondagens feitas junto às comissões da Câmara e do Senado, o MEC acredita que há condições de se conseguir uma bancada de apoio ao ensino superior público. “Do PFL ao PT, o Senado considerou a proposta extraordinária para se iniciar o debate. Há um clima positivo no Congresso Nacional. Por isso temos vontade de encaminhar o projeto independente da crise política”, afirmou o ministro à Agência Carta Maior. O trabalho por um razoável grau de consenso que possibilite a aprovação da reforma no segundo semestre também deve contar com a pressão política da sociedade civil junto aos deputados. O maior receio, no entanto, é o de que a crise política paralise completamente o andamento da pauta em Brasília. O ministério admite que haverá interferência do Congresso nas reformas e que pode haver um bloqueio da reforma universitária. E aí não seria apenas a Lei de Educação Superior que ficaria na fila. A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que cria o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), enviada ao Congresso há duas semanas, também pode não ser votada. “Há uma indeterminação política no processo que estamos nos esforçando para corrigir. O Fundeb é um exemplo. Se não houver a votação da PEC, ainda teremos o Fundef [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério] no ano que vem. Se houver e ela for aprovada, em vez de 4 bilhões do Fundef em 4 anos teremos 43 bilhões para o Fundeb em 10 anos”, compara Genro. Outro projeto que corre o risco de ser prejudicado pela crise política é o que destina recursos para a formação de professores de português e matemática e para licenciaturas em locais onde faltam docentes. Se não forem votados em agosto, o MEC pedirá ao presidente que edite uma Medida Provisória para garantir as verbas. A esperança – a última que morre – é a de que os deputados separem da conjuntura atual os debates de projetos de mais longo prazo, que precisam seguir em andamento. “A crise política tem conseqüências que ainda não podemos prever. Mas se conseguirmos isolar o que está acontecendo conjunturalmente dos debates de Educação, de Saúde, de um projeto para o país, podemos mobilizar as forças saudáveis pra isso. A reforma universitária é um projeto de longo prazo. É a primeira que está sendo feita em um regime democrático. Temos essa oportunidade agora e não podemos desperdiçá-la”, acredita Fernando Haddad, secretário-executivo do MEC. No entanto, uma parcela significativa de entidades acadêmicas de base, conselhos universitários, pesquisadores, diretórios acadêmicos e executivas de curso ainda temem que o lobby do ensino privado liberalize ainda mais o setor e atue para derrubar os artigos que regulamentam questões como a gestão democrática nas universidades privadas e o mínimo limite imposto à entrada do capital estrangeiro no ensino. “Todas as boas propostas da reforma universitária, mesmo as tímidas, serão barradas pelo lobby no Congresso Nacional”, acredita Rodrigo Pereira, diretor da União Nacional dos Estudantes (UNE), cuja direção majoritária apóia o projeto do governo. “Não é preciso fazer nenhum exercício de futurologia. É só examinar tudo o que aconteceu nos outros projetos de lei. Os que têm algum traço de defesa do público e da cidadania sempre são liquidados no Parlamento, onde sabermos que a correlação de forças é péssima”, afirmou o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Roberto Leher, dirigente do Andes (Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior) e coordenador do grupo de trabalho Universidade e Sociedade do Conselho Latino-americano de Ciências Sociais (Clacso). Isso foi antes da atual crise política. Quem paga pra ver o que acontecerá agora?
Fonte: Ag. Carta Maior, Educação, Bia Barbosa, SP, 01/07/2005. |