Corra, Lula,
Corra –
O futuro do petróleo
O destino de Lola – feliz ou trágico – dependerá, em última instância, das soluções que ela adotar, no curto prazo. Uma metáfora perfeita sobre o futuro do petróleo no Brasil: ou corremos para explorar nosso potencial brilhante (final feliz) ou morreremos na praia por incompetência ou inação (final trágico). O preço do barril se aproxima velozmente de US$ 150 o barril. O barril pode baixar de novo a US$ 60? Teoricamente pode, mas acreditar nessa hipótese é panglossiano. Mais verossímil é apostar no barril a US$ 200. Corra, Lola, corra. A disparada dos preços transfere um volume fantástico de recursos das mãos dos consumidores para os produtores, mas certamente esses petrodólares ou petroeuros voltarão rapidamente para os cofres dos países desenvolvidos, como já ocorreu no passado. Somente as economias desenvolvidas têm condições para reciclar lucrativamente essa catadupa de dinheiro. O mais interessante é que boa parte dos ganhos será destinada ao desenvolvimento de fontes alternativas de energia. A segurança energética dos ricos depende disso. Essa bandeira assumiu contornos ideológicos, o que a torna irreversível. Não nos esqueçamos: tecnologia é ideologia. Quando o jovem lorde do Almirantado britânico Winston Churchill decidiu alterar a forma de propulsão da Armada inglesa, trocando carvão por óleo combustível, pouco antes da 1ª Guerra, decretou o fim da era do carvão, inaugurando, de fato, a era do petróleo, que persiste até hoje como o maior e mais lucrativo negócio do mundo. A tecnologia nova sempre teve o condão de expulsar ou marginalizar a tecnologia obsoleta. A decisão de superar a era do petróleo já está tomada pelos países desenvolvidos. A ideologia da energia mais limpa e sustentável é uma realidade incontornável. Qualquer anúncio de carro por lá só fala de híbridos, de baixa emissão de CO2, de economia de combustível. Petróleo e desperdício viraram palavras feias. O petróleo desaparecerá da equação energética mundial neste século? Seguramente, não. Mas uma substituição de 20% ou 30% dos hidrocarbonetos por formas alternativas de energia, nas próximas duas ou três décadas, parece muito provável, o que seria desastroso para a indústria do petróleo. De resto, os preços atuais aceleram essa substituição, turbinada por máquinas cada vez mais eficientes, diminuindo ainda mais a demanda por hidrocarbonetos. Corra, Lola, corra. Os suplementos de tecnologia da prestigiosa revista The Economist têm veiculado dezenas de artigos sobre novas formas de energia. São tantas as possibilidades que é quase impossível se manter informado plenamente do que está acontecendo. Até nossa Embraer planeja testar jatos com etanol de segunda geração, a partir de óleos de babaçu e mamona. A Boeing já usou óleo de babaçu do Brasil na primeira demonstração mundial de um avião comercial movido a biocombustível. Corra, Lola, corra. As Forças Armadas norte-americanas, segundo a revista Wired, estão trabalhando full time nos cenários alternativos ao petróleo. Em recente encontro da Defense Advanced Research Projects Agency (Darpa), o secretário da Força Aérea, Michael Wynne, afirmou sem volteios: “Nós precisamos já de novas alternativas limpas aos hidrocarbonetos, (...) alternativas que nos livrem dos ditadores mesquinhos e dos cartéis.” Quando as Forças Armadas dos EUA, o maior cliente individual de petróleo do mundo, pregam o abandono dos hidrocarbonetos, é preciso prestar atenção a essa mudança de atitude. O Brasil desponta como a mais promissora província petrolífera da década. As novas descobertas no offshore, ainda em fase inicial de exploração, são alvissareiras, mas sua plena utilização tardará mais de uma década. O valor dos investimentos necessários para desenvolver os campos de Tupi, Júpiter e Carioca é estratosférico. Isso sem levar em conta prováveis novas descobertas no pré-sal da Bacia de Santos. Como podemos ser ingênuos a ponto de crer que a Petrobrás sozinha poderá levar a termo tal desafio? A Petrobrás é, sem sombra de dúvida, uma grande empresa, mas não é grande o bastante para dar conta das demandas do País. Precisamos como nunca dos capitais e tecnologias de novas empresas petrolíferas, brasileiras ou estrangeiras, para explorar a pleno vapor nosso magnífico potencial. Corra, Lola, Corra. A realização de novos leilões da Agência Nacional do Petróleo (ANP) se tornou uma prioridade imperiosa. O governo, contudo, não se pronuncia sobre a 8ª rodada (suspensa por decisão judicial, que já caiu). Tampouco sobre a 10ª rodada, que até agora não tem data para se realizar. A propalada auto-suficiência não passa de 2012, mantido o atual patamar de crescimento econômico. A retirada recente dos blocos do pré-sal dos leilões da ANP foi um erro que pode trazer conseqüências graves para a economia nacional. Por que mudar um modelo que tem sido coroado de êxito? Qual o sentido de defender a reestatização do setor, com a criação de uma espécie de “Petrobrás do B”, o que seria uma loucura sem tamanho? A julgar pela velocidade da mudança dos padrões tecnológicos e pela lenta maturação dos projetos petrolíferos, os brasileiros podem ser vítimas de um terrível paradoxo: descobrir reservas bilionárias, mas acabar sentados em cima delas, por falta de demanda. Precisamos estar conscientes do que está acontecendo e cobrar providências urgentes dos governantes e do Congresso. Não nos podemos dar o luxo de esperar. O petróleo é nosso, sem dúvida, mas ele só se torna bem econômico quando vem à tona.
* Luís Fernando Panelli César diplomata, foi secretário-executivo da ANP.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 17/5/2008.
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