COP8 começa em Curitiba sem Brasil
País
não tem lei que regulamente acesso aos recursos
da biodiversidade A 8.ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP 8), o mais importante evento da Organização das Nações Unidas sobre conservação e uso da biodiversidade, que começa hoje em Curitiba coloca o Brasil numa situação delicada. Dentre os 188 países signatários, o País é o que carrega a maior responsabilidade - não apenas por ser o anfitrião, mas por deter a maior riqueza biológica do planeta. Em contraponto às recentes vitórias sobre o desmatamento e à criação de unidades de conservação na Amazônia, o País chega à reunião ainda sem uma lei que regulamente, de maneira positiva, o acesso de seus pesquisadores à biodiversidade - a maior parte ainda desconhecida da ciência. Serão 11 dias de longos debates e negociações, com a participação esperada de cinco mil pessoas e pelo menos 100 ministros de Estado. O tema mais importante na pauta brasileira é a negociação de um regime internacional de acesso aos recursos genéticos e repartição de benefícios por seu uso. A idéia é criar um arcabouço legal que regulamente a exploração comercial entre países e o patenteamento de produtos desenvolvidos a partir da biodiversidade, como forma de combater a biopirataria. Por exemplo, o uso de plantas e animais na confecção de medicamentos e cosméticos. A negociação das regras opõe os países em desenvolvimento (detentores da riqueza biológica) e os países mais desenvolvidos (detentores das indústrias e da tecnologia). "É um debate com dois pontos de vista, o daqueles que têm e o daqueles que usam a biodiversidade", disse o secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco. "Para o Brasil, trata-se de uma questão estratégica, pois precisamos de um regime nos dois sentidos." O Brasil quer garantir que sua biodiversidade não será explorada por outros países sem as garantias de reconhecimento e repartição de benefícios - inclusive com as comunidades detentoras do conhecimento. "Antes, a biodiversidade era considerada patrimônio comum da humanidade. A convenção estabeleceu que os recursos são de soberania dos países, e não do mundo", explica a coordenadora geral de Políticas e Programas em Biodiversidade do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), Ione Egler. Cabe a cada país estabelecer regras internas de acesso e repartição de benefícios da biodiversidade. Nesse aspecto, o Brasil, mais uma vez, chega à reunião com a lição de casa incompleta. O projeto de lei que deveria regulamentar o tema ainda nem foi encaminhado ao Congresso, por divergências entre ministérios. A COP 8 vai até o dia 31. Estadão, Herton Escobar, 20/3/06. ---------------------------
COP8: Mesmos dados, análises contrárias
Em encontro internacional da ONU, governo dirá que seu plano antidesmatamento é bom; ONGs o desmentirão Os representantes do governo brasileiro participarão da 8.ª Conferência das Partes Convenção Sobre Diversidade Biológica (COP8), que começa hoje em Curitiba, com o discurso do copo cheio na questão ambiental. Apresentarão números e ações para convencer a comunidade mundial de que o Brasil está fazendo sua parte na redução do desmatamento da Amazônia. Os ambientalistas usarão as mesmas informações para dizer que não, que sob o governo petista as motosserras seguem à toda. O fato é que apesar dos esforços, a gestão de Lula está prestes a amargar os maiores índices de destruição da floresta das últimas décadas. O governo começou a inverter o sentimento de descrença sobre sua capacidade de agir com o lançamento do Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia Legal, em março de 2004. Os ambientalistas, porém, acham que o plano, que prevê medidas que vão da pura fiscalização policialesca até a criação de uma nova economia na região, naufragou. Num levantamento com cinco das mais atuantes entidades não-governamentais na Amazônia, o Estado constatou que de oito impactos esperados pelo governo, metade não foi cumprida e a outra metade, só parcialmente (veja quadro ao lado). "O plano não tem como, nem se propôs, reverter o problema definitivamente em três anos", diz o secretário de Biodiversidades e Florestas, João Paulo Capobianco. "A meta é reduzir a zero o desmatamento ilegal e convencer os proprietários de que dá para ganhar dinheiro com a floresta em pé." Pela lei, só 20% de uma propriedade pode ser desmatada. O governo Lula já soma 70.530 km2 de área desmatada. Se no período 2005/2006, a área derrubada for maior que 7.300 km2, será batido o recorde anterior, do primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso. Se há um plano, então por que ainda se derruba tanta floresta? "Não adianta gastar R$ 40 milhões com fiscalização do Ibama e R$ 40 bilhões para promover a agricultura", diz André Lima, do Instituto Socioambiental. O diretor da Amigos da Terra, Roberto Smeraldi, adiciona um ponto na discussão: "Na prática, a aplicação do plano é decisão da Presidência da República". Por esse raciocínio, só a ministra Marina Silva merece os créditos por ter criado o plano. Para Smeraldi, o da Agricultura favorece o avanço da fronteira agrícola, o de Transportes defende a pavimentação de estradas, o de Energia quer mais hidrelétricas e o da Fazenda financia projetos de infra-estrutura e produção agrícola na Amazônia com poucas restrições. Queda Justiça seja feita. Houve uma redução expressiva do desmatamento no último período, de 2004/2005, de 27.200 para 18.900 km2. Desde 1996 a taxa só crescia. E planos de ação eram esparsos. Para Marcelo Marquesini, do Greenpeace, é preciso considerar que os preços das commodities, sobretudo soja e pecuária, estão em queda e operações da Polícia Federal, como a Faroeste e a Curupira, frearam o ímpeto das motosserras. "A desmontagem de máfias da grilagem no Mato Grosso e sul do Pará reduziu a margem de operação delas", diz José Arnaldo de Oliveira, do GTA. Mas neste ano elas se deslocaram para o sul do Amazonas e Monte Alegre, no Pará. "Este governo vai ganhar medalha de ouro no item de criação de unidades de conservação", diz o pesquisador do Imazon Adalberto Veríssimo, que reconhece o esforço federal, sobretudo depois da morte da missionária Dorothy Stang, de atuar em áreas críticas contra a extração ilegal da madeira e a grilagem. Na BR-163, interditou 8 milhões de hectares na margem esquerda e na Terra do Meio, no Pará, criou uma estação ecológica de 3,4 milhões de hectares. "Não há uma bala de prata que resolverá esses problemas seculares." As partes que mais ficaram devendo, afirmam as ONGs, são relacionadas a obras de infra-estrutura que respeitem o ambiente, e à viabilização de uma economia florestal. Há recursos não utilizados. O programa Amazônia Sustentável, por exemplo, gastou menos de 42% dos R$ 85 milhões previstos. O apoio a comunidades tradicionais executou 8,92% do seu orçamento. No mês passado, as ONGs reuniram-se com o presidente Lula e a ministra Dilma Roussef, da Casa Civil, para propor medidas. Sugeriram que obras de pavimentação de estradas federais localizadas na região e o gasoduto Urucu-Porto Velho respeitem recomendações do plano.
Outra proposta foi que
o Conselho Monetário Nacional só libere crédito acima de R$ 50 mil para
proprietários com licenciamento ambiental. Fonte: O Estado de S. Paulo, Eduardo Nunomura, 20/3/06 |