Comunidade científica Falta de definição mais clara das políticas é a principal crítica à gestão do ministro Amaral O ministro da Ciência e Tecnologia, Roberto Amaral, começou sua gestão fazendo barulho. Logo que assumiu deu declarações sobre pesquisas nucleares, interpretadas por muitos como defesa da bomba atômica, o que chegou a colocar em dúvida seu preparo para exercer o cargo. Passados três meses, a maior parte da comunidade científica do País continua com um pé atrás em relação ao ministro. Há sinais de impaciência, embora muitos pesquisadores saibam que ainda é cedo para ter uma posição mais conclusiva. A falta de uma definição mais clara das políticas e rumos que a pasta pretende seguir é a crítica mais comum. Um exemplo dessa postura foi dado pela presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Glaci Zancan. "Eu não sei qual a política do ministério (da Ciência e Tecnologia)", diz. "Ainda não foi apresentada nenhuma proposta concreta." Ela suaviza a crítica, no entanto, dizendo que isso é natural em início de governo. "O pessoal ainda está tomando pé da situação. O governo Fernando Henrique ficou seis anos sem nenhuma política científica. Apenas, nos dois últimos anos de seu mandato é que o ex-ministro Ronaldo Sardenberg estabeleceu um pacote de diretrizes." O pesquisador Adalberto Luiz Val, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) também já tem críticas a pelo menos uma ação concreta do ministro. Justamente ao principal programa do ministério: a desconcentração da ciência e tecnologia no País. "O problema não está sendo discutido com as pessoas diretamente envolvidas com a questão, que são os pesquisadores de fora da região Sudeste", reclama. "Tudo está sendo feito com os mesmos atores de sempre." Apesar das críticas, o pesquisador do Inpa acha que ainda é cedo para uma avaliação do trabalho do ministro. Para ele, alguns discursos de Amaral até apontam para o rumo certo. Resta saber se o que o ministro fala será colocado em prática. "A preocupação é o que virá daqui por diante." O reitor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Carlos Henrique de Brito Cruz, também tem algumas preocupações quanto aos rumos de certas políticas do MCT. "Por enquanto não há uma estratégia para levar as pesquisas das universidade para as empresas, por exemplo", diz. "Isso é fundamental para o desenvolvimento do País." O destino dos fundos setoriais, criados no governo passado para financiar o setor, também o preocupa. Atualmente, uma comissão do MCT e outras instituições de fora do governo estão discutindo a nova política desses fundos. "Sua criação foi uma excelente iniciativa do governo anterior, que trouxe recursos expressivos para as pesquisas", diz. "Até agora não sabemos qual o seguimento que o atual ministro dará a eles." Unanimidade - Assim como Val, Brito Cruz vê alguns pontos positivos na gestão de Amaral. Um deles é quase unanimidade na comunidade científica. Trata-se dos nomes escolhidos para os principais órgãos do MCT, como, por exemplo, Erney de Camargo, para o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico Tecnológico (CNPq), Sérgio Rezende, para a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), e Luiz Bevilacqua, da Agência Espacial Brasileira (AEB). "O ministro está fazendo um esforço para ouvir a comunidade científica", elogia. Entre os que têm críticas contundentes à atual gestão estão o ex-presidente da SBPC e atual candidato ao cargo, Ennio Candotti, e o diretor do Laboratório de Inteligência Artificial, da Universidade Federal do Ceará (UFC), Tarcísio Pequeno. Candotti diz que está vendo com preocupação o que está acontecendo no MCT. "Ainda não há um rumo", diz. "A equipe de transição havia deixado um mapa e sugestões de rota, mas parece que não foram levadas em consideração. As equipes técnicas do próprio ministério, ao que parece, também não foram ouvidas. A manutenção do funcionamento da máquina para que os programas em curso não sofram descontinuidade deveria ser a primeira preocupação da nova direção." Pequeno concorda: "A expectativa era que este governo partisse do melhor que o governo anterior fez", diz. "Mas isso parece quimera." De acordo com ele, ainda não dá para divisar algo no campo da ciência e tecnologia que se possa chamar de uma política para o setor. "Aliás, elaborar uma política abrangente e integradora tem sido uma omissão de todos os governos", diz. "Mas pode-se dizer que se estava aproximando de algo com cara disso no final do governo passado. Isso não deveria ser perdido."
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/04/2003 - São Paulo SP - Evanildo da Silveira |
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