O apagão 'comunicacional'
O apagão não é apenas aéreo, é "comunicacional", é político, operacional e mental. O governo evaporou-se quando deveria fazer-se presente, disse as coisas erradas quando afinal decidiu falar, e pela janela indiscreta do Palácio do Planalto mostrou que os altos escalões da República, além do repertório de gestos chulos, pensam de forma tosca e grosseira. Não houve invasão de privacidade como alega o assessor presidencial Marco Aurélio Garcia: homens públicos devem comportar-se com decência quando usam os espaços públicos. Com ou sem cortinas levantadas. Este foi o pecado de Bill Clinton quando fez do Salão Oval da Casa Branca uma alcova – ninguém viu, mas todos souberam o que lá fez com Monica Lewinsky. No arrevesado pedido de desculpas (de certa forma até mais grosseiro do que o gesto que o motivou), o professor Marco Aurélio Garcia investiu novamente contra a mídia. Ora, se ele foi flagrado quando se entusiasmava com uma reportagem da TV Globo, sua acusação contra a imprensa é totalmente infundada, sem consistência. Esta insistência do governo em fazer da mídia o bode expiatório, só serve para ampliar o tamanho dos seus erros. Somatório de erros Quando as autoridades não conseguem oferecer explicações, cabe à imprensa buscá-las. Compreende-se que os veículos de comunicação procurem desenvolver suas hipóteses sobre o que aconteceu em Congonhas, na terça-feira (17/7). Mas é preciso compreender que na engenharia das tragédias as causas, jamais são isoladas. Tudo se entrosa, se reforça e, por isso, são funestas. A pista efetivamente não atendia às exigências, a falha na reversão da turbina aumentou o deslizamento, o piloto ou co-piloto talvez tenha tomado decisões erradas. Todas as suposições são válidas, sobretudo se forem somadas. A competição neste caso, não esclarece, só serve para tumultuar. Esqueceram dos vivos A mídia e as autoridades estão preocupadas com os mortos, mas esqueceram dos vivos. Quando as autoridades e a mídia dizem que não há apagão aéreo, não estão contando a verdade. Os controladores continuam fazendo a sua "operação tartaruga" e os vôos não estão seguindo. No domingo (22/7) à noite houve em Congonhas uma série de interrupções em vôos por determinação dos controladores. Eu próprio fui testemunha e vítima de um apagão determinado pelos controladores – que, às 11 horas da noite, com passageiros na pista, embarcados já há algum tempo, não puderam prosseguir viagem para o Rio de Janeiro. Congonhas fechava com tempo perfeito, ainda aberto; Santos Dumont fechava; e, seguida, Tom Jobim/Galeão também fechou; com passageiros na pista e autorizados para embarcar. Portanto, está acontecendo alguma coisa. A mídia está muito preocupada em reproduzir as estatísticas da Infraero e as estatísticas da Infraero não são verazes. Os aviões não estão seguindo. No meu avião, que deveria levantar às 21h30 para o Rio, havia passageiros que estavam o dia inteiro à espera daquele vôo. Portanto, alguma coisa está acontecendo e a verdade não está aparecendo – ou por causa dessas fontes, das autoridades, ou porque a mídia só vai atrás das estatísticas da Infraero.
Fonte: Observatório da imprensa, Alberto
Dines, 23/7/2007 |
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