Uma ameaça no
horizonte
Disputa no CNJ coloca em risco sua força e o futuro da Justiça brasileira
Criado
em 2005, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) está diante de sua prova de
fogo. O mandato dos atuais conselheiros se encerra em junho e está em curso
uma disputa ferrenha para ocupar as quinze vagas de conselheiro. Já se
iniciou a corrida para saber quem comandará o organismo que controla o
Judiciário brasileiro. A campanha tem adesões inesperadas. Até mesmo quem
era contra o CNJ agora quer integrá-lo. Avessos à idéia de um controle
externo, os juízes brasileiros resistiram quanto puderam à sua criação.
Tentou-se de tudo. Desde gestões para impedir sua aprovação pelo Congresso
Nacional até ações questionando sua constitucionalidade. De norte a sul do
país, as reações variaram entre a indignação e a cólera. Perdida a batalha,
com a decisão do Supremo Tribunal Federal de que o Congresso tinha, sim,
competência para criar o conselho, os tribunais não se mobilizaram pela
indicação dos primeiros conselheiros. A disputa transcorreu como a vida no
pátio do convento: sem competição e até com certo enfado. Era como se
estivesse destinado ao fracasso. Depois de dois anos e algumas guerras
vencidas, a situação mudou. "Eles começaram a ver a importância disso. Agora
estão tentando, através da nova composição, cooptar o conselho para os
interesses da corporação", alerta o ex-presidente do STF Nelson Jobim, um
dos criadores e o primeiro presidente do CNJ.
Em seus dois
primeiros anos de atuação, o conselho conseguiu feitos memoráveis no
combate às mazelas do Judiciário. Instituiu o teto salarial dos juízes e
funcionários da magistratura. Começou, com isso, a colocar um limite na
farra dos salários absurdos. Proibiu também a contratação de parentes
nos tribunais. Implantou estatísticas de desempenho, que nunca haviam
sido feitas, e instituiu o voto aberto para a promoção dos juízes, um
remédio eficaz contra as ações entre amigos dos desembargadores. Em um
lance ainda mais significativo, conseguiu o afastamento e, mais tarde, a
expulsão do presidente do Tribunal de Justiça de Rondônia, |
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Ellen e Jobim: ela quer mudar todos os
conselheiros e ele vê aí um ataque do corporativismo ao CNJ. |
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Sebastião
Teixeira, preso pela Polícia Federal por participação em um esquema de
venda de sentenças. Essa foi uma vitória particularmente estratégica. Na
semana passada, um levantamento do jornal Folha de S.Paulo mostrou que,
dos 27 tribunais de Justiça do país, catorze nunca investigaram seus
desembargadores por desvio de conduta. Em outros nove tribunais
consultados, somente três punições foram aplicadas. Por causa de
problemas desse tipo era tão importante o CNJ firmar-se como a instância
capaz de afastar um presidente de tribunal envolvido em atos ilícitos.
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Com vitórias assim, o
CNJ provou sua força explosiva. O problema é que ficou também patente sua
capacidade de demolir interesses corporativos. Por isso é tão importante
agora que se consiga preservá-lo, evitando que os grupos que lutam contra o
aprimoramento e a transparência do Judiciário consigam nomear
representantes. A situação do conselho é particularmente delicada por um
detalhe adicional. Quem ocupa a presidência do CNJ é a presidente do STF, a
ministra Ellen Gracie. Logo ela, que votou contra a entrada de pessoas
estranhas à magistratura no conselho, na época de sua criação. Na prática,
significou um voto contra o controle externo. O que se teme agora é a
capacidade que a presidente do STF tem de influenciar a disputa. Todos
prestam atenção em seus mínimos movimentos.
Com a campanha
pela sucessão já quente, instalou-se, por exemplo, uma discussão sobre o
número de conselheiros que deverão ser substituídos. A ministra afirmou
a VEJA, através de sua assessoria, que é a favor da mudança integral do
conselho. Sua tese, compartilhada por muitos dos ministros do Supremo
Tribunal Federal, é que os mandatos na Justiça brasileira são de dois
anos, sem a possibilidade de recondução. É o caso de presidentes de
tribunais e corregedores, por exemplo. A prevalecer a tese, os
conselheiros que obtiveram conquistas tão importantes – e souberam
resistir a tantas pressões – vão todos embora de uma só tacada. A
ministra tem apoios políticos importantes. Ao longo dos últimos dois
anos, foram muitas as rusgas entre o STF e o CNJ, principalmente quando
o conselho tentou se impor como a última instância para as decisões de
caráter administrativo da Justiça. |
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A prisão de Teixeira: uma chave para o
sucesso na moralização do Judiciário. |
"Há neste momento
uma certa má vontade dos ministros do STF com os atuais integrantes do
CNJ", disse a VEJA um dos ministros, que quer distância da polêmica. A
Justiça brasileira está ainda a anos-luz da transparência e da
eficiência que se pretendem. Os descalabros continuam sendo a regra.
Caso o CNJ saia enfraquecido, qualquer que seja o caminho adotado, o
país é que ficará debilitado. |
Fonte: Rev. Veja, Ronaldo França, ed. 2004,
18/4/2007.
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