Alunos do 3º ano têm nota de 8ª série 

  

Em SP, no final do 2º grau, 43% dos estudantes mostram conhecimentos de leitura e
escrita esperados da 8ª série. Na escola pública, a situação é ainda pior, segundo
dados inéditos de um exame federal de avaliação de aprendizagem
 

Quase a metade dos estudantes do Estado de São Paulo termina o ensino médio (antigo colegial) com conhecimentos em escrita e leitura esperados para um aluno de oitava série. 

Dados inéditos extraídos do último Saeb – exame federal de avaliação de aprendizagem –, realizado em 2005, revelam que 43,1% dos alunos do terceiro ano tiveram notas inferiores a 250, patamar fixado como o mínimo para a oitava série pela secretária de Estado da Educação de São Paulo, Maria Helena Guimarães de Castro. 

Ou seja, eles não conseguem, por exemplo, compreender o efeito de humor provocado por ambigüidade de palavras ou reconhecer diferentes opiniões em um mesmo texto. 

Outros 15,2% dos alunos tiveram desempenho ainda pior, similar ao desejado para crianças da quarta série do ensino fundamental (antigo primário). 

O quadro seria ainda mais dramático se os alunos da rede privada fossem retirados da conta, uma vez que a média dos estudantes das escolas públicas estaduais é 21,2% inferior à dos alunos das particulares. 

Talita Lima de Araújo, 18, que estudou em uma escola estadual na Pompéia (zona oeste de SP), reclama da precariedade do ensino público. "Quando você termina o ensino médio, só percebe um vazio. Não temos chance no vestibular." 

Os dados no Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica) comprovam a impressão de Talita. A média da oitava série da rede privada (285,8) é maior que a do terceiro ano do ensino médio da rede estadual (253,6). 

Causas 

Dagmar Zibas, pesquisadora da Fundação Carlos Chagas e uma das maiores especialistas em ensino médio no país, diz que o péssimo desempenho é conseqüência das condições de trabalho dos educadores. 

"Não é possível que um professor, que já tem formação deficiente, dê aulas em duas ou três escolas. Ele não sabe nem o nome dos alunos. Chega, faz a chamada, dá algumas instruções e já tem de correr para a próxima aula", afirma. 

Segundo a Secretaria Estadual da Educação, 70% dos professores têm emprego em outra rede -ou seja, no mínimo dobram a jornada. 

O educador e filósofo Mario Sergio Cortella, secretário municipal de Educação de São Paulo entre 1991 e 1992 na gestão Luiza Erundina (então no PT), diz que o ensino médio cresce como nunca na história do país. 

"Nos últimos dez anos, quase triplicamos o número de alunos, muitos com atraso escolar. Se aumentamos imensamente o universo de alunos, houve inversamente uma degradação das condições de trabalho. Faltam professores". 

Cortella diz que essa "colisão" (mais alunos e menos professores) se agravou pela promoção automática nas escolas. "Estamos colhendo o que foi organizado há dez, 15 anos." 

O educador diz não ser contra a progressão continuada, mas afirma que ela foi mal implementada. Segundo ele, é necessário haver um sistema de recuperação eficiente, para que o aluno com dificuldade avance com as condições adequadas. 

Já o professor da Faculdade de Educação da USP Romualdo Portela reclama da descontinuidade administrativa. "Apesar de o mesmo partido comandar o Estado, cada secretário teve uma agenda, o que causou uma descontinuidade", diz. 

Para Maria Helena, que assumiu a secretaria do governo José Serra (PSDB) há cerca de dois meses, presidiu o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais e ajudou a implantar o Saeb, o problema está na alfabetização deficiente, ocasionada pela má formação dos professores e por materiais didáticos de má qualidade. Ela afirma que um pacote lançado pelo governo irá melhorar a situação. 

Secretário de Educação à época da prova, durante o governo Geraldo Alckmin (PSDB), Gabriel Chalita foi procurado pela Folha, mas preferiu não se manifestar. 

A prova do Saeb é aplicada em todo o país, de forma amostral, a cada dois anos, nas quartas e oitavas séries do ensino fundamental e no terceiro ano do ensino médio. O exame deste ano será realizado no mês que vem.

 

Fonte: Folha de S. Paulo, Fábio Takahashi, 1/10/2007.

 


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