Andre Dusek/AE

 

RENAN ABSOLVIDO
Duas agressões à sociedade
 

Foram duas as agressões: a primeira, escancarada, foi a absolvição do presidente do Congresso, Renan Calheiros, que segundo a Polícia Federal cometeu vários ilícitos. A segunda agressão, mais grave, aterradora, pode ser chamada de "apagão" institucional. O Senado da República foi convertido desde a terça feira num verdadeiro porão – fechado, lacrado, blindado ao escrutínio da sociedade, ilha autoritária em plena Praça dos Três Poderes.

A varredura eletrônica do plenário, a proibição do uso de computadores pelos senadores, a recomendação para que os celulares fossem desligados e finalmente o pugilato entre os leões-de-chácara e os deputados que foram autorizados pelo STF a assistir ao julgamento desvendam a razão do secretismo da sessão: impedir a presença da mídia.

Renan Calheiros e os cangaceiros de todo o país que o apóiam sabiam que a presença da imprensa seria a única força capaz de impedir a absolvição. Apostaram todas as fichas no sigilo. Não se importavam em agredir a sociedade, só não queriam testemunhas.

Os malfeitores trabalharam no escuro, eles têm prática, ganharam o primeiro round. Nos próximos, será diferente – terão que ser travados às claras.
 

Fonte: Observatório da Imprensa, Alberto Dines, 13/9/2007.

 


CNBB condena voto secreto e aponta risco de apatia popular
 

Para OAB, resultado da sessão afeta a sociedade e deve servir de exemplo

O secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), d. Dimas Lara Barbosa, considerou que a absolvição de Renan Calheiros causará um desgaste para o Senado "numa hora em que a classe política já não goza de boa reputação" e poderá ter como conseqüência uma sensação de apatia perigosa para a democracia.

"Será lamentável, se isso vier a ocorrer, porque existem bons parlamentares que colocam o mandato a serviço das boas causas", disse d. Dimas, em nome da presidência colegiada do episcopado. "Tenho a esperança de que os eleitores se manifestem de maneira criativa, nas próximas eleições, eliminando da vida pública os candidatos que não merecem voto."

O secretário-geral da CNBB acreditava que Renan seria cassado. Para ele, essa era também a expectativa da maioria dos brasileiros. "Observei, durante esse longo processo de cassação, que o povo está amadurecendo na participação política e, por isso, deve ter ficado decepcionado com a absolvição de Renan. A votação mostrou um Senado dividido, mas a gente não sabe qual foi a posição de cada senador, pelo fato de a sessão ter sido secreta."

D. Dimas admite que, em algumas circunstâncias, quando há pressões e interferências indevidas, se pode recorrer a sessões secretas para garantir a imparcialidade, mas não sabe se seria esse o caso. "Acho que o representante do povo deve dar conta do que faz", afirmou.

Segundo ele, a presença de deputados na sessão pode ainda dar aos eleitores a chance de saber o que ocorreu. "A CNBB continuará a insistir na questão ética e a divulgar documentos voltados para a consciência do cidadão, sem fazer opção partidária, para que os eleitores sejam capazes de acompanhar a ação dos políticos em todos os níveis da vida parlamentar."

ARRANHÃO

O resultado do plenário também provocou reações de várias entidades. Em nota, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) lamentou a absolvição. "O resultado desta votação afeta a sociedade e deve servir de exemplo para que as votações futuras sejam abertas, propiciando maior controle por parte do eleitor sobre seu representante."

Segundo Rodrigo Collaço, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), o Senado perdeu uma oportunidade de instalar um novo nível de ética na política brasileira. Ele também lamentou a sessão e a votação secretas, mas observou que, nos próximos dois processos a serem respondidos por Renan, a opinião pública e as condições de trabalho no Senado terão grande influência. "Se 35 senadores votaram contra ele, fica claro que a Casa está dividida." A imagem do Senado e da classe política, no entanto, são os mais prejudicados, segundo Collaço. Ele diz que o "arranhão" provocado pela decisão tira qualquer autoridade da figura do presidente da Casa.

Cláudio Weber Abramo, diretor da ONG Transparência Brasil, também destaca o desgaste da imagem do parlamento frente à população, mas não acredita que isso seja problema para os ocupantes da casa. "Eles não ligam, fazem tudo do jeito que lhes convém." Para Abramo, desde o início do processo, a manutenção da sessão secreta e a permanência de Renan no cargo de presidente já sinalizavam para a absolvição. "Eles (os senadores) se esconderam atrás do regimento interno porque têm vergonha do que fizeram."

Abramo também não acredita que a pressão popular possa reverter o resultado nos próximos dois processos, pois a mobilização da sociedade foi muito pequena. "Os senadores vivem em um mundo que não é nosso, muito distantes do eleitor, e a sessão secreta deixou isso claro."

ABSTENÇÕES

A coordenadora-geral do Movimento Voto Consciente, Sônia Barboza, considerou as seis abstenções a pior faceta da votação de ontem. "Não era para botar a cara para bater, era só para dar opinião. Esses seis são os que menos merecem estar lá e não sabemos quem são." Como ponto positivo, ela também considera que se pode resgatar a discussão sobre as votações secretas no Senado. "A sociedade civil está vendo esse absurdo."

 

Fonte: O Estadão, José Maria Mayrink e Paulo Darcie, 13/9/2007.


Para Transparência Internacional, caso Renan prejudica imagem do Brasil
 

A absolvição do senador Renan Calheiros pelo Senado terá um impacto negativo na forma
como os outros países vêem o combate à corrupção no Brasil, avalia o representante
da Transparência Internacional (TI) na América Latina, Bruno Speck

"A decisão foi tomada e deve ser acatada, como disse o presidente Lula (em viagem ao exterior), mas não significa que não tenha impacto sobre a percepção da corrupção no Brasil", disse Speck, baseado no Brasil há dez anos. 

Segundo ele, o caso vai no sentido contrário de fatos como a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de aceitar as denúncias contra os suspeitos de envolvimento no mensalão, que tiveram uma repercussão positiva na imprensa estrangeira. 

"O Brasil tem sinais de transição: as investigações da Polícia Federal, a Controladoria-Geral da União produz resultados no combate à corrupção, o STF deu um sinal importante, mas há infelizmente sinais no outro sentido", disse Speck, para quem o caso Renan "certamente" terá uma repercussão internacional negativa. 

Speck ressalva, porém, que o efeito do caso não deverá se refletir no próximo índice de percepção da corrupção que a TI divulgará no dia 26, já que ele já foi concluído.

"Não vai ter impacto no próximo ranking porque a avaliação se refere aos três anos passados, mas esse caso vai influir nos outros índices." 

"Clube de maçonaria" 

De acordo com Bruno Speck, embora o processo tenha sido estritamente legal, o regimento interno do Senado permitiu interpretações que precisam ser revistas. 

"Nem especialistas nem a opinião pública aceitam essas regras como razoáveis para a democracia, começando pelo fato de o presidente do Senado, quando se trata do caso em que ele é envolvido, não se licenciou e não só interferiu no processo como votou no próprio caso, o que fere o princípio amplamente aceito do conflito de interesse." 

Bruno Speck também critica a interpretação dada ao regimento de forma a permitir que a sessão sobre a cassação de mandato, e não apenas o voto, fosse fechada. 

"Mesmo aceitando que a votação seja secreta - o que também tem sido debatido, mas é a regra constitucional -, o que não é aceitável é a interpretação de que isso se estende também ao debate, à argüição", disse o observador da TI. 

"Pareceu mais um clube de maçonaria do que uma instituição democrática que debate abertamente." 

Credibilidade 

Para Speck, o primeiro passo para resgatar a credibilidade do Congresso seria esclarecer esses pontos no regimento interno, para evitar que a situação que favoreceu Renan se repita. 

"Primeiro, esclarecer que um presidente ou um outro membro do Senado que esteja envolvido em uma denúncia deve licenciar-se ou pelo menos não participar da votação sobre o seu caso; e, segundo, estabelecer que o debate seja aberto." 

O terceiro passo, na opinião do especialista, seria a abolição da votação secreta em caso de cassação de mandato, proposta em emenda constitucional já aprovada na Câmara, mas parada há um ano no Senado. 

"Seria salutar que a regra do voto secreto, em caso de cassação de mandato, fosse abolida. Há muitos casos em que nas votações abertas, os debates indicam a cassação, e depois no sigilo vem a absolvição." 

Para Speck, a não aprovação do fim do voto secreto para casos de cassação faz parte da "política de engavetar a possibilidade de avançar em termos de mais transparência no Legislativo e o preço está sendo pago agora". 

"Pode ser uma vitória política a curto prazo do governo, de Renan Calheiros e do grupo que o apóia, mas a longo prazo é um dano para a democracia, e vai ter um impacto na credibilidade das instituições e sobre a percepção da corrupção do Brasil."
 

Fonte: BBCBrasil, 13/9/2007.


 
 

Foto: Lula Marques-Folha Imagem, Rev. Veja, ed. 2026
Manchete de alguns jornais do dia seguinte.

 
 

 

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AROEIRA/O Dia, 15/9/07.

 

 

 


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