STF decide que "cola eletrônica" não é crime
Em dois julgamentos, o STF (Supremo Tribunal Federal) entendeu que não configura crime a prática conhecida como "cola eletrônica", geralmente usada por quadrilhas que vendem o ingresso em vestibulares e concursos públicos. A primeira decisão relacionada ao tema foi em dezembro de 2006. Ao julgar, durante três anos, um pedido relacionado ao inquérito nº 1.145, os ministros do STF concluíram que não há dispositivo legal pelo qual seja possível punir a "cola eletrônica". Descartaram a possibilidade de entender a prática como crime de falsidade ideológica. Em seu voto, o relator, o então ministro Maurício Corrêa, afirmou: "A fraude não está na veracidade do conteúdo do documento [no caso, a prova], e sim no veículo utilizado na formação das respostas, o que a desnatura do tipo penal previsto no referido preceito penal". "Essa mora legislativa, todavia, não pode ser suprida pelo Judiciário", escreveu Corrêa. O procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, foi contra. "É crime", disse à Folha, por meio de sua assessoria. Em 6 de fevereiro, em novo julgamento, amarrada à decisão tomada pelo plenário da corte dois meses antes, a 1ª Turma do STF encerrou parcialmente uma ação penal na qual o réu Jorge Nascimento Dutra, acusado de fraudar vestibulares contra ao menos 32 instituições, fora condenado a 21 anos e oito meses de prisão pelos crimes de extorsão, estelionato qualificado, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e porte ilegal de armas. Ele não irá responder mais pela condenação referente ao crime de estelionato, porque, para o STF, a "cola eletrônica" não configura tal prática, pois não está prevista no Código Penal em meio ao rol de condutas que são criminalizadas devido a danos que causam em algum patrimônio. Para os ministros da corte, não há um patrimônio lesado. Daí não ser a cola eletrônica considerada crime enquadrado como estelionato. Dutra continuará a responder pelos crimes de extorsão, quadrilha (para outras práticas não relacionadas à cola eletrônica) e porte ilegal de arma. Entre os vestibulares que Dutra teria fraudado está a prova para ingressar no curso de Medicina da Universidade Federal do Acre, em 2002. Na ocasião, o delegado da PF Tarcísio Alves de Abreu Júnior chegou a prender os pais de dois estudantes que haviam negociado por R$ 15 mil cada vaga para o curso de medicina. Conforme o voto do ministro relator, Carlos Ayres Britto, que se declarou obrigado a seguir o entendimento do plenário do STF firmado em dezembro de 2006, a "fraude se materializava mediante a venda de gabaritos, transmitidos aos alunos por um "aparelho microrreceptor eletrônico'". A chamada cola eletrônica é discutida no Congresso Nacional desde 1999. Até hoje, entretanto, nenhum dos 11 projetos relacionados ao tema chegou a ser colocado em votação.
Fonte: Folha Online, Andréa Michael, 26/6/2007.
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