100 anos
da Teoria da Relatividade e da Teoria Quântica da Luz

O ano de 2005 marca o centenário de dois dos monumentos mais impressionantes já erigidos pelo esforço humano. Monumentos que não são prédios, pontes, sinfonias ou estátuas, e sim idéias. Idéias que, como a música de Mozart e as esculturas de Michelângelo, fizeram de seu autor um nome conhecido em todo o mundo: Albert Einstein.


Ano Miraculoso
A calma antes da tempestade
“Muito revolucionário”: o efeito fotoelétrico
Relatividade: uma questão de princípio
Que horas são?
A barreira da luz e E=mc2
Átomos e moléculas
Depois da tempestade

Fotos: O Estadão

 

 


Ano Miraculoso

O ano de 1905 entrou para a história da ciência como o Ano Miraculoso de Albert Einstein, no qual o então jovem cientista apresentou seus monumentos ao mundo – a Teoria da Relatividade Especial e a Teoria Quântica da Luz – e, no que foi pouco mais que um “P.S.” ao artigo inicial sobre a relatividade, demonstrou que matéria e energia são uma coisa só, quantidades-irmãs relacionadas pela equação E=mc2.

A ciência só reconhece um outro Ano Miraculoso, o de 1666, no qual Isaac Newton desenvolveu o cálculo diferencial e integral, estudou a natureza da luz e lançou as bases do que viria a ser a Lei da Gravitação Universal.

É justo dizer que, entre o século XVII e o início do século XX, a humanidade viveu numa Era de Newton. E, embora o trabalho de Newton continue sendo fundamental, também é correto dizer que, desde 1905, esta é a Era de Einstein.

Diferente de uma grande sinfonia de Mozart ou de uma bela pintura de Michelângelo, porém, a grandiosidade do trabalho de Einstein não se torna evidente assim que temos a oportunidade de vê-lo ou ouvi-lo; muitas pessoas se dizem incapazes de compreendê-lo; e muitas mais talvez nem acreditem que o esforço valha a pena.

Essa crença, no entanto, é uma ilusão, pois o legado de Einstein está em toda parte. O sistema de posicionamento global que guia aviões, navios e carros é obrigado a levá-lo em conta. A tela de computador em que você lê este texto, a televisão, as usinas nucleares, o CD player, a tomografia computadorizada e as armas atômicas também fazem parte dele.
 

A calma antes da tempestade

Se você vivesse na Europa ocidental em 1905, o mundo poderia lhe parecer um lugar bastante calmo e estável. Tedioso, até. A guerra entre Japão e Rússia, travada do outro lado do globo, caminhava para o fim. Um ano antes, Inglaterra e França haviam firmado um acordo de paz que encerrava quase um milênio de hostilidade mútua. Entre os nórdicos, a Noruega, então governada pela Suécia, decidiu pedir independência e conseguiu – sem guerras ou revoluções: bastou um plebiscito.

No mundo da ciência, a situação era parecida. A mecânica de Isaac Newton dava conta dos movimentos dos corpos na Terra e dos astros no céu. Uma teoria mais recente, a eletrodinâmica, elaborada pelo escocês James Clerk Maxwell em meados do século XIX, explicava satisfatoriamente os fenômenos elétricos, magnéticos e a luz.

Tanta estabilidade, porém, não passava de ilusão. A guerra e a penúria do povo russo já haviam provocado um revolta em janeiro de 1905, o Domingo Sangrento, que deixou mais de 1.000 manifestantes mortos em São Petersburgo. O acordo entre França e Inglaterra desagradou ao kaiser da Alemanha, Guilherme II, e deu início à política de alianças que desaguaria na I Guerra Mundial.

A armadura da ciência também tinha suas fissuras. Newton e Maxwell pareciam perfeitos se deixados cada um em seu campo, mas incompatibilidades surgiam quando mecânica e eletrodinâmica tentavam andar juntas.

A teoria de Maxwell descrevia a luz como uma onda. Supunha-se que ondas só poderiam existir se houvesse um algo para carregá-las, como o ar transporta o som. Supunha-se que ondas só pudessem se propagar por um meio. Daí a pergunta: qual o meio em que a luz se propaga?

A melhor resposta que a ciência do final do século XIX conseguiu encontrar foi o éter, uma substância misteriosa que preencheria o espaço entre as estrelas e planetas e permearia o próprio ar. No entanto, uma análise mecânica das propriedades que esse éter precisaria ter dava origem a resultados fantásticos: ele teria de ser fluido, infinitamente rígido e incapaz de produzir atrito. Além disso, as equações de Maxwell definiam uma velocidade fixa para a luz no éter, da ordem de 300.000 km/s.

Essa propriedade levou alguns cientistas a tentar usar a velocidade da luz para detectar o movimento do éter. O princípio é simples: se a Terra se move pelo éter que preenche o espaço, deve haver um “vento” de éter atingindo o planeta, como ciclista sente o vento no rosto ao pedalar, mesmo num dia de ar parado. E se a velocidade da luz no éter é sempre a mesma, um raio de luz emitido “a favor do vento” deve ter velocidade diferente, para um observador na Terra, do que um raio “contra o vento”.

No entanto, uma experiência realizada em 1887 por Albert Abraham Michelson e Edward Morley não detectou nenhuma variação. Para explicar esse resultado, novas propriedades, ainda mais esotéricas, foram propostas para o misterioso meio de propagação da luz, o éter.

Outra questão que preocupava os cientistas era a chamada “radiação do corpo negro”. Um “corpo negro” é um objeto que não reflete nenhuma luz – toda a radiação que parte dele é, portanto, resultado de sua temperatura, como um forno. Cálculos feitos com base na idéia de que a radiação é um fluxo contínuo de ondas previam que um corpo corpo negro deveria liberar quantidades infinitas de energia – obviamente, um absurdo.

O dilema foi resolvido, na virada do século XIX para o XX, por Max Planck, que propôs que a energia não é liberada como um fluxo contínuo, mas por meio de “pacotes” individuais. Esses pacotes foram chamados de quanta (plural), ou quantum (singular). Embora a hipótese quântica resolvesse o paradoxo do corpo negro, muitos cientistas duvidavam dela, considerando-a mais um artifício matemático do que uma descrição acurada do funcionamento da natureza.
 

“Muito revolucionário”: o efeito fotoelétrico

Em 1905 Albert Einstein tinha 26 anos, estava casado há dois com sua primeira mulher, Mileva, e tinha um filho pequeno, Hans Albert, para sustentar. Vivia na Suíça, onde trabalhava no escritório de registro de patentes de Berna. Em 1901, a Universidade de Zurique havia rejeitado sua tese de doutorado. Em 1902, antes do casamento, Mileva dera à luz uma filha de Einstein, Liesrl. O destino de Liesrl Einstein é desconhecido até hoje: aparentemente, a menina foi entregue para adoção na Hungria.

O primeiro dos cinco artigos publicados por Einstein nesse ano é o único a que ele próprio se refere, em correspondência com amigos, como “muito revolucionário”. O comitê do Prêmio Nobel provavelmente concordava com Albert, já que foi pela lei do efeito fotoelétrico, descrita nesse trabalho, Sobre um ponto de vista heurístico a respeito da produção e transformação da luz, que Einstein receberia o Nobel de Física, em 1921.

O efeito fotoelétrico é bem simples de descrever: alguns metais, quando iluminados, absorvem luz e emitem elétrons. Esse fenômeno está na base da tecnologia da televisão e dos painés de energia solar – a câmera de TV e os painéis, afinal, fazem exatamente isso, transformam luz em eletricidade.

Fácil de descrever, porém, o efeito fotoelétrico era bem difícil de explicar. A solução de Einstein foi tão elegante quanto surpreendente: apropriando-se do conceito de quantum de energia de Planck, ele demonstrou que seria muito mais simples analisar o efeito se a luz fosse tratada não como uma onda contínua, mas como um feixe de partículas. Esses quanta, ou átomos de luz, depois viriam a ser chamados de fótons.

O que há de revolucionário nessa abordagem é sua ruptura com a idéia da luz como uma onda contínua, central nas equações da teoria eletrodinâmica de Maxwell. Não se tratava apenas de uma ruptura com a tradição, mas com fatos observados, já que o comportamento da luz como onda estava bem documentado em uma série de experiências.

Ciente disso, Einstein suaviza o golpe: em momento algum de seu artigo ele afirma que a luz é composta de partículas; apenas afirma que é mais fácil lidar com o problema se, no caso específico, a luz for tratada “como se fosse” feita de corpúsculos.

Nessa interpretação, o efeito fotoelétrico se explica assim: os elétrons dos átomos do metal absorvem fótons e, ao fazê-lo, ganham energia – como um carro parado, atingido por outro em alta velocidade, acaba sendo empurrado. Se a energia for grande o suficiente, o elétron salta de vez para fora do átomo.

Inversamente, um elétron que perde energia libera uma partícula de luz (seria como se um carro em movimento, ao reduzir a marcha, cuspisse outro carro. De onde se vê que esse tipo de analogia só é válido até certo ponto). Essa propriedade de emissão de luz por elétrons excitados, mais tarde, daria origem ao raio laser.

A análise de Einstein para o efeito fotoelétrico obrigou a comunidade científica a olhar com mais atenção para os quanta de energia e Planck e reforçou a hipótese da chamada natureza dual da luz, que não é nem uma onda pura nem exatamente uma partícula rígida, mas tem características de ambas. O conceito de quanta e a dualidade onda-partícula estão na base da Teoria Quântica, uma das mais bem sucedidas – e, até hoje, mais debatidas – teorias da física.
 

Relatividade: uma questão de princípio

Formulado por Galileu Galilei e depois incorporado por Isaac Newton, o Princípio da Relatividade diz que todos os referenciais inerciais – que estão parados ou se movem a velocidade constante – são equivalentes entre si. Um homem trancado numa caixa sem janelas é incapaz de dizer se a caixa está parada ou se está sendo empurrada em linha reta, numa velocidade que não muda. Um pensamento desagradável, principalmente quando não dá para ver o que vem pela frente.

Ou então, imagine-se correndo por uma escada rolante. De cara, é possível avaliar sua velocidade de duas maneiras diferentes: uma, em relação aos degraus que se movem; e outra, em relação ao solo. Nenhum dos referenciais é absolutamente melhor que o outro.
Referenciais que mudam de velocidade (no jargão dos físicos, que sofrem aceleração) não são equivalentes. Isso acontece porque, quando há uma mudança de velocidade, é possível perceber a ação de forças – a que joga você contra o vidro do carro numa curva fechada, por exemplo – que não existem em situações inerciais.

No início do século XX, porém, a constatação de que a luz tem uma velocidade constante no éter punha o princípio da relatividade em xeque. Afinal, o éter, sendo infinitamente rígido, perfeitamente imóvel e presente em todo o Universo representava um referencial privilegiado. Não faria mais sentido falar em velocidades ou movimentos relativos, já que tudo poderia ser medido, em termos absolutos, com referência ao éter.

Nesse sentido, a Teoria da Relatividade Especial, apresentada por Einstein no artigo Uma eletrodinâmica dos corpos em movimento e no comentário posterior A inércia de um corpo depende de seu conteúdo de energia? é mais reacionária do que revolucionária: ela reinstitui a validade do princípio da relatividade, abolindo a heresia do referencial absoluto. Como? Simples: abolindo o éter.

A teoria de Maxwell descrevia a luz como uma onda. Supunha-se que ondas só poderiam existir se houvesse um algo para carregá-las, como o ar transporta o som. Supunha-se que ondas só pudessem se propagar por um meio. Daí a pergunta: qual o meio em que a luz se propaga?

As bases para essa operação eram os dados experimentais da época: primeiro, todas as experiências realizadas para determinar a velocidade da luz mostravam um resultado constante, 300.000 km/s; segundo, a teoria eletrodinâmica de Maxwell, largamente comprovada pela experiência, também previa um valor constante; terceiro, todas as experiências realizadas para detectar o éter, especialmente o experimento Michelson-Morley, não haviam encontrado nada. Logo, o éter não existe e a velocidade da luz – não mais no éter, mas no espaço vazio, no vácuo – é constante em relação a... tudo.

A lógica é simples, mas as conseqüências são avassaladoras. Imagine um carro correndo com o farol aceso. Qual a velocidade dos fótons que partem dos faróis? Seria 300.000 km/s mais os 120 km/h do motorista imprudente? Ou, imagine que um outro carro, guiado por um maníaco, se aproxima do primeiro, em rota de colisão frontal, a 200 km/h: com que velocidade os fótons do primeiro carro se aproximam dos olhos do maníaco? Seria 300.000 km/s mais a velocidade de aproximação dos carros... digamos, 320 km/h?

Einstein demonstrou que não: a velocidade da luz – independentemente da velocidade da fonte ou do observador – é sempre a mesma. O motorista imprudente, uma formiga parada na beira da estrada observando o desastre iminente ou até um ET se afastando em alta velocidade da cena em seu disco voador verão os fótons dos faróis se movendo a 300.000 km/s.
 

Que horas são?

O que chamamos de velocidade é o resultado de uma conta de dividir – a distância percorrida dividida pelo tempo gasto. Por isso falamos em quilômetros por hora, quilômetros por segundo ou metros por segundo. Em termos matemáticos, velocidade = distância/tempo, ou v = d/t. Se a velocidade da luz no espaço vazio é fixa e não depende nem da velocidade da fonte, nem da velocidade do observador, o “v” da equação nunca muda. Resta-nos apenas a opção de manipular os termos “d” e “t”. Tempo e espaço, portanto, são relativos.

Em linhas gerais, quanto mais rápido você se move, mais devagar o tempo passa para você e mais curto você fica na direção do movimento: o tempo se dilata e o espaço se contrai, em relação às pessoas que estão paradas. Nas velocidades a que estamos acostumados no dia-a-dia o efeito é desprezível, mas em velocidades próximas à da luz ele se torna importantíssimo. Na velocidade da luz, o tempo simplesmente pára: para um fóton, o tempo não passa.

Se você se lembrar do princípio da relatividade, parece haver um paradoxo aqui. Afinal, se o movimento a velocidade constante é relativo, como saber quem está parado e quem se move? Como saber para quem o tempo passa mais devagar?

Para entender isso, vamos usar um artifício sugerido pelo próprio Einstein: um relógio de luz. Esse relógio é feito de dois espelhos, horizontais, com um fóton, uma bolinha de luz, quicando entre eles. Cada vez que o fóton atinge uma das superfícies espelhadas, registra-se uma fração mínima de segundo. Assim o relógio de luz marca o tempo.

Imagine que você está parado na beira de uma estrada, com um relógio de luz no pulso, e um carro, com um relógio de luz sobre a capota, passa correndo por você, a, digamos, 70% da velocidade da luz.

Você olha para o relógio do carro e se surpreende ao notar que, em vez de saltar numa linha vertical perfeita entre um espelho e outro, o fóton sobre a capota descreve um ziguezague, combinando o sobe-e-desce entre os espelhos com o deslocamento horizontal do carro na pista. Para visualizar melhor a situação, imagine um jogador de basquete que passa correndo, batendo a bola: para ele a bola se move na vertical, entre a mão e quadra, mas em relação ao piso ela não apenas sobre e desce, como também avança – faz um ziguezague.

Voltando ao carro: como a velocidade da luz é constante e a trajetória inclinada do ziguezague é mais longa que a vertical, a única conclusão a que se pode chegar é que os instantes registrados no relógio do carro são maiores que os instantes do seu relógio de pulso: para você, o tempo “do carro” é mais lento que o tempo “do pulso”.

Note que, se o motorista conseguir ver o mostrador do relógio que você tem no pulso, ele terá a impressão inversa: para ele, você está se afastando a uma velocidade constante, e é o “fóton de pulso” que faz o ziguezague.

O único jeito de vocês chegarem a um acordo sobre que horas são é o carro parar, fazer meia-volta, correr até onde você está e parar ao seu lado. Perceba que ao parar, virar, acelerar e parar de novo, o carro quebrou o caráter inercial e simétrico da situação – ele se submeteu a acelerações. No final, o relógio dele é que estará atrasado em relação ao seu: para ele, o tempo realmente passou mais devagar.
 

A barreira da luz e E=mc2

A relativização do tempo e do espaço afeta outras grandezas que parecem absolutas e imutáveis no dia-a-dia. Para manter a coerência entre a relatividade e as leis conhecidas da Física, Einstein percebeu que seria necessário que a massa inercial de um corpo – a resistência que o corpo oferece a tentativas de fazê-lo se mover (ou de pará-lo, quando ele já está em movimento) - aumentasse com a velocidade.

Esse é um fato que também já foi observado experimentalmente, inclusive em tubos de televisão: os elétrons acelerados emitidos em direção à tela – e que fazem a tela cintilar, produzindo a imagem – ganham massa por causa da alta velocidade com que são disparados. Uma conseqüência desse fato é que é impossível atingir a velocidade da luz. Conforme um corpo acelera, sua resistência a novas acelerações aumenta. À beira da velocidade da luz, a resistência torna-se infinita.

A equivalência entre massa e energia, expressa na equação E=mc2 (energia igual a massa vezes o quadrado da velocidade da luz), é talvez um dos resultados mais dramáticos do trabalho de Einstein, uma vez que abriu o caminho para a exploração da energia nuclear e para a criação das armas atômicas.

No entanto, ele aparece apenas como uma espécie de comentário posterior do próprio Einstein ao artigo original sobre a relatividade especial. Nele, Einstein nem chega à formulação mais famosa, E=mc2, mas apenas conclui que um corpo que perca energia perde massa na proporção m=E/c2.
 

Átomos e moléculas

Embora a relatividade geral e o efeito fotoelétrico sejam as obras-primas do Ano Miraculoso de Einstein, o jovem cientista produziu mais dois trabalhos importantes em 1905, ambos reforçando a hipótese atômica – a  idéia de que  toda  matéria  é  feita  de

 

partículas. Embora a noção do átomo possa parecer óbvia hoje em dia, ela não era consensual nos primeiros anos do século XX.

Um desses trabalhos foi a tese de doutorado de Einstein que acabou aceita por Zurique, Umas nova determinação das dimensões moleculares, e que trata exatamente disso: um método para calcular o tamanho das moléculas. A banca julgadora aprovou a tese, criticando-a apenas por ser curta demais. Ninguém notou um erro matemático importante nos cálculos de Einstein.

O segundo foi a explicação do movimento browniano, que é o movimento caótico de partículas em suspensão num líquido em repouso. A questão era: se o líquido está parado, por que as partículas – pólen, migalhas, o que for – não ficam quietas? O movimento é “browniano” porque foi notado pela primeira vez pelo botânico Robert Brown, ao observar partículas de pólen na água.

Einstein explicou esse fenômeno como provocado pela colisão das moléculas do líquido contra a partícula suspensa. Mesmo se o líquido estiver parado, as moléculas que o compõem nunca cessam de se mover – essa movimentação constante, em escala microscópica, é o que chamamos de temperatura: quando mais as moléculas se movem, mais quente o corpo estará.
 

Depois da tempestade

É tentador imaginar que as idéias de Einstein sobre a relatividade e o quantum de luz, uma vez publicadas, tenham varrido o mundo científico como um vendaval, mas não foi bem assim. A princípio, foi como se ninguém   tivesse   se   dado   ao

 

trabalho de ler seus artigos. Não foi sequer um caso de má repercussão, mas de nenhuma repercussão, o que incomodou bastante o jovem físico.

Aos poucos, porém, a originalidade e o brilhantismo do até então desconhecido funcionário do serviço de patentes de Berna começaram a causar impressão. Max Planck, o pai do conceito do quantum de energia, foi um dos primeiros “monstros sagrados” da Física a procurar Einstein.

Conforme eram realizadas experiências que confirmavam suas conjecturas e previsões, Einstein ganhava reconhecimento. Em 1909, ele foi indicado para a cátedra de Física Teórica da Universidade de Zurique.

Os artigos de 1905 não representam toda a soma das obras-primas de Albert Einstein. Aquela que talvez seja sua maior realização, a Teoria da Relatividade Geral, foi publicada em 1916, a partir de uma idéia em que ele vinha trabalhando desde 1907. Ampliando a teoria exposta em 1905 e chamada de Teoria da Relatividade Especial, a Relatividade Geral trata dos corpos em aceleração e dos efeitos da gravidade. Nela surge o conceito de que a gravidade provoca uma curvatura do espaço, e é nela que se apóia o modelo do Big Bang para a origem no Universo.

Quando os cientistas que deram continuidade à Teoria Quântica que Einstein ajudara a fundar concluíram que era impossível saber tudo sobre uma partícula subatômica e que o conhecimento sobre o que se passa dentro dos átomos teria de ser baseado em probabilidades, não em certezas, Einstein considerou a idéia repugnante e passou a combatê-la.

Seus duelos intelectuais com os responsáveis por essa visão tornaram-se verdadeiros épicos e ajudaram bastante no desenvolvimento da ciência. Foi num desses embates que Einstein disse a famosa frase “Deus não joga dados”, negando a interpretação probabilística da mecânica quântica. Ao que Niels Bohr, físico dinamarquês, respondeu: “Albert, pare de dizer a Deus o que fazer”.

Com a ascensão do nazismo, Einstein emigra para os Estados Unidos. Em 1939, assina uma carta endereçada ao presidente Franklin Roosevelt alertando para o perigo de uma bomba atômica alemã. A carta levará ao estabelecimento do Projeto Manhattan e à criação das primeiras armas nucleares do mundo*.

Einstein não participa do projeto.

No início da década de 50, o físico rejeita um convite para se tornar presidente do jovem Estado de Israel. Albert Einstein morre em 1955, é cremado e tem as cinzas espalhadas em local desconhecido.

Fonte: O Estado de S. Paulo, Carlos Orsi, 03/2005

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*Nota do Webmaster: Para maior esclarecimento dos últimos parágrafos complementação retirada do livro "Einstein: o viajante da relatividade na América do Sul", de Alfredo Tiomno Tolmasquim (2003, p.46, 47).

       "A possibilidade de transformação de massa em energia já havia sido apontada na Teoria da Relatividade, em 1905, mas durante muitos anos permaneceu apenas como uma formulação teórica, sem qualquer significado prático. Somente 34 anos depois, em março de 1939, descobriu-se enfim um método que permitia liberar energia do núcleo de um átomo, mediante o bombardeamento de nêutrons. A descoberta apontava um método de produzir uma reação em cadeia — pelo bombardeamento de um núcleo de urânio — que liberaria uma certa quantidade de energia, e dois outros nêutrons, que por sua vez bombardearia dois outros núcleos, e assim por diante.

         Informado sobre essa descoberta — e também sabedor de que a Alemanha estava processando urânio —, em agosto de 1939 Einstein enviou uma carta ao presidente dos Estados Unidos, Franklin Roosevelt, alertando sobre a existência de uma tecnologia para construir uma bomba atômica. Mencionava o interesse alemão pelas reservas de urânio e sugeria a colaboração de físicos, do governo e de laboratórios industriais para desenvolverem a tecnologia. O governo americano montou então uma equipe para estudar o assunto — mas parecia acima de tudo uma mera forma de dar uma satisfação, já que era uma equipe muito reduzida, e com escassos recursos. De fato, muito pouco se fez até o segundo semestre de 1941, quando chegou ao governo americano — dessa vez através dos canais militares — a informação de que na Inglaterra as pesquisas sobre a bomba atômica estavam sendo bem sucedidas.

        Finalmente, em dezembro de 1941, quando os japoneses atacaram Pearl Harbor e a Alemanha declarou guerra aos Estados Unidos, implantou-se o Projeto Manhattan para desenvolver a bomba atômica norte americana. Einstein, contudo, não foi convidado para participar do projeto: o FBI e a agência de inteligência do exército achavam que ele não era suficientemente confiável, pois desde a chegada aos Estados Unidos vinha mantendo seu discurso em favor do pacifismo e da união entre os povos.

         Quando os Estados Unidos lançaram bombas sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki em 1945 — encerrando a Segunda Guerra Mundial e iniciando uma nova era de medo para a humanidade —, abriu-se também uma discussão sobre a responsabilidade social dos cientistas. Muitos deles se empenharam num esforço pela paz e contra as armas nucleares — entre eles o próprio Einstein, que assumiu a direção do Comitê de Emergência para Cientistas Atômicos. Mas o fato é que, devido à Teoria da Relatividade, à carta para Roosevelt, e à sua imagem pública como estereótipo do cientista, ele foi diretamente associado à bomba atômica.

         Em 1952, com a morte de Chaim Weizmann — que era então presidente de Israel — Einstein foi convidado para substituí-lo no cargo. Afinal, ele era o mais ilustre judeu vivo e uma expressão da relação de Israel com o humanismo científico. Mas, para alívio do governo israelense, Einstein declinou do convite, afirmando que se veria na difícil situação de ter de optar entre suas próprias idéias e aquelas que deveriam ser defendidas por um presidente de Estado.

         Vítima do esperado rompimento de um aneurisma na aorta, Einstein morreu em 18 de abril de 1955, aos 76 anos, em sua casa na Rua Mercier, em Princeton — absorvido, como sempre, em cálculos matemáticos. Poucos dias antes, tinha assinado com Bertrand Russell um manifesto alertando a todos os governantes do mundo que uma guerra nuclear não teria vencedores — seria uma catástrofe total.

          Exatas três décadas haviam se passado desde sua visita a três países da América do Sul, entre eles, o Brasil."


 


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