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Privatização
interna: soa o alarme
O que vai acontecer com
a Rural, a julgar pela crescente onda de cursos pagos que começam
a proliferar em seu interior? Essa é uma pergunta que deve ser
respondida “a partir do estabelecimento de um processo amplo e
democrático de discussão que nos permita vislumbrar o futuro de
nossa instituição”, avalia a professora Nídia Majerovicz,
diretora da Adur. Sem que isso aconteça, vai se formando uma
colcha de retalhos infindável. Aprova-se um curso aqui e outro
acolá, “analisando-os no varejo, sem que a discussão de fundo
seja feita, já que tanto o CEPE quanto o Consu, não a fazem da
forma que deveria ser feita, no atacado e profundamente. Além, é
claro, de não avaliarem o impacto desses cursos na estrutura
universitária”, diagnostica Nídia, sentenciando que “quando
nos dermos conta, vai ser tarde”.
Outras perguntas se
seguem, no sentido da avaliação do impacto na estrutura acadêmica,
financeira e administrativa da Rural, assim como a análise da
interferência ou não em seu caráter público, mas que ficam sem
respostas se um processo de discussão e convencimento democrático
não for colocado em prática.
Para Pablo Gentili, a
privatização na educação superior tem se apresentado sob
diversas formas além dos cursos pagos, com a transferência de
recursos para instituições privadas. O Andes-SN sustenta que é
as fundações que facilitam as prestações de serviços
pavimentam o caminho da privatização.
Estudantes e docentes
apresentam aqui suas impressões sobre um processo que vem
crescendo nas universidades federais, em especial na Rural.
Infelizmente já se ouviu dizer, publicamente, por exemplo, que
quem interessa são os que podem pagar. (Páginas 4 e 5)
Opinião
“Sei da existência desses
cursos e acho que este é o início da privatização da
universidade pública. Universidade pública essa, que o governo
deveria manter com qualidade elevada. Se até o Provão mostrou
que a universidade pública é melhor do que a particular –
quando ele era pra mostrar o inverso -, não há porque começar a
instituir, agora, cursos pagos para transformar a universidade pública
em particular. Eu acho que o governo está querendo tirar de sua
responsabilidade o financiamento da universidade. Primeiro ele
contingência os recursos e depois estabelece essa política que
é bem aceita pelas administrações das universidades. Eu não
poderia pagar um desses cursos e não tenho a menor idéia de para
onde vão esses recursos, mas acho que é para pagar aos
professores, que, aliás, já são pagos para isso”, diz Jean
Martins Almeida, 26, estudante de Química Industrial. (Leia
mais na Página 5)
Mobilização
O
Governo Federal está longe de reunir as melhores condições para
enfrentar o movimento popular e seguir aplicando o receituário do
FMI. Os velhos espectros da corrupção cruzam corredores e salas
dos três poderes, revelando a resistente aliança entre política
e acumulação capitalista no Brasil. No entanto, FHC insiste. Em
sua teimosia acaba de vitimar mais uma vez a universidade,
negando-lhe reforçar, ainda que minimamente, seu quadro docente e
aplicar alguma política de remuneração aos seus trabalhadores.
(Página 3)
Página
2
Investimento
do Estudante?
No último dia 15 de
abril, o ministro da Educação em entrevista publicada no JB,
respondendo à pergunta do repórter Plínio Fraga sobre as denúncias
de mercantilização do ensino e o sucateamento da Universidade pública,
durante a sua gestão, mostra os números do MEC. No período 94
– 99, o ministro afirma que houve um crescimento de 28% das matrículas
na graduação e pós-graduação, um crescimento de 12%, na média,
do percentual de doutores nas universidades federais e ainda que a
proporção de 1 computador para cada 200 estudantes passou para
1/19 , nessas instituições de ensino.
Paralelamente, pergunta
o próprio ministro: “Uma Universidade que está sendo sucateada
consegue responder por 70% da Educação do país? ”
Os dados apresentados
(ou a estatística do MEC) têm
a contribuição da UFRuralRJ, com seus novos cursos, seus
novos doutores e seus novos computadores. Entretanto, o grande número
de professores substitutos contratados com salários aviltantes a
falta de material nos laboratórios, o número excessivo de alunos
por turma nos cursos básicos e mesmo, a falta de professores em várias
delas, apontam na direção de uma necessária análise, mais
rigorosa, daqueles dados. Na verdade, a expansão do número de
matrículas não está acompanhada de um sério planejamento cuja
meta deve ser uma formação de alta qualidade, do primeiro ao último
dia de aula, do estudante regularmente matriculado em seu curso.
Grande parte das matrículas
expandidas nesse período em nossa pós-graduação, ocorre em
cursos de especialização latu-sensu, pagos (ou com
“investimento do estudante” , como gostam de dizer seus
organizadores) e, mesmo a pós-graduação strictu-sensu não
consegue, contrariamente a maior parte dos programas de nossas
congêneres públicas do Estado: UFRJ, UFF, UERJ, matricular
gratuitamente seus estudantes regulares. Portanto, a expansão das
matrículas na UFRuralRJ, está gerando dois novos tipos de
estudantes: na graduação, um estudante desmotivado desde o início
de seu curso, pelas condições vivenciadas nos primeiros contatos
acadêmicos (salas de aula, laboratórios, horários), enquanto na
pós-graduação, um estudante que paga para cursar a Universidade pública e
gratuita.
Como o mesmo corpo
docente, é responsável pela formação desses estudantes, é
preciso que, em torno de nossa Associação (ADUR-RJ), busquemos
entender o quê o ministro da Educação quer falar, ao dizer na
mesma entrevista: “A questão do financiamento do ensino
superior não foi colocada ainda. Não está havendo muita pressão
dos mais pobres sobre essa questão, porque eles infelizmente
ainda não chegaram ao ensino superior. Mas vão chegar ”.
Assim, “os captadores de
re-cursos (ou recursos)” voltarão, após séria reflexão sobre
suas atividades, à verdadeira profissão que escolheram, como diz
Michelangelo Trigueiro no livro “Universidades públicas:
desafios e possibilidades no Brasil contemporâneo”, de
Professores Universitários, criativos e otimistas no trabalho
desafiador e instigante de preparar cidadãos de uma nação com
nome de Brasil.
Como vive o trabalhador no
Brasil
Segundo
o IBGE, a taxa média de desemprego em 2000 ficou em 7,1%.
Segundo
pesquisa conjunta da Fundação Seade e Dieese, o número de
desempregados no ABC Paulista foi de 220 mil trabalhadores: a taxa
de desemprego passou de 17,1% da População economicamente ativa
(PEA) em fevereiro para 18% em março.
O
custo da cesta básica subiu até 3,2% no Rio em abril. Foi o
maior índice registrado pelo Instituto Fecomércio desde o início
da pesquisa nos supermercados em 98.
O
Dieese registrou aumento de preços nas 16 capitais pesquisadas.
Em dez das 16 capitais já ultrapassou R$ 100.
Segundo
o Dieese, o salário mínimo ideal para o sustento de uma família
com quatro pessoal (dois adualtos e duas crianças) deveria ser de
R$ 1.092,97. Ou seja, 6,1 vezes o valor vigente, de R$ 180,00.
O
mínimo tem apenas 27,41% do poder de compra de quando foi criado,
em julho de 1940.
50,1%
dos ocupados no Brasil vivem com renda até dois salários mínimos.
Isso equivale a aproximadamente 30,4 milhões de trabalhadores em
1999, de acordo com a Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios
do IBGE.
Em
São Paulo são 26% e em recife a taxa chega a 59,9%.
Mulheres
e negros têm maior representação neste contingente.
No
Brasil, segundo o Banco Mundial, os 20% mais pobres ficam com 2,6%
da renda do país, enquanto os 20% mais ricos ficam com 63%.
No
Brasil, 15 milhões vivem com menos de um dólar por dia.
43 milhões vivem com menos
de dois dólares no país.
Protesto
no Primeiro de Maio
Com índices como esses
o trabalhador brasileiro chegou ao 1º de maio em 2001. Há 110
anos da instituição da data em nível mundial – que marcou os
protestos em que trabalhadores dos EUA e do Canadá exigiam redução
de jornada para oito horas, que culminaram com a morte de cinco líderes
operários em Chicago – os trabalhadores seguem exigindo
respeito e condições dignas de trabalho. “Hoje, comemorar o
1º de Maio é afirmar que nenhuma nova conquista será possível
se não formos capazes de preservar nossas velhas conquistas e
direitos contra a ofensiva destruidora e desregulamentadora dos
tratados de livre comércio – como a Alça – das políticas de
ajuste ditadas pelo FMI, que FHC aplica, dos ataques contra os
direitos trabalhistas e a própria existência dos sindicatos”,
sustenta Júlio Turra, da Executiva Nacional da Central Única dos
Trabalhadores.
Neste 1º de maio, a CUT
chamou manifestações em todo país contra o governo neoliberal
de FHC, pela instauração da CPI da corrupção, pelo pagamento
do FGTS integral e pela reposição dos salários das categorias
em campanha salarial. No Rio, o protesto foi na Praça Mauá, com
recreação, almoço e ato público com show. Nas cidades do país,
trabalhadores foram às ruas protestar contra este governo que,
submetido ao FMI, vem impondo ao povo miséria, arrocho de salário,
aumento do desemprego e entrega do patrimônio público. Um
governo envolvido em escândalos e desvio de recursos público. A
Coordenação Estadual dos Servidores público propôs que todos
os sindicatos do setor integrassem o ato público, mais uma etapa
na campanha unificada deflagrada no início do ano pela reposição
das perdas acumuladas ao longo de sete anos, mais uma obra do
governo FHC.
Agenda 2001
19 e 20/5 - Plenárias
do Andes-SN e dos SPF
31/5 - Dia nacional
de defesa das políticas públicas
Junho - Indicativo
de greve dos SPF
13 a 18/6 - Reuniaõ
anual da SBPC e SBPC paralela em Salvador, Bahia.
Página
3
Crise
na política e na economia
Escândalos no Senado e
a ameaça de uma CPI da corrupção assombram o governo.
Talvez não tanto quanto à eminência de um sério abalo
financeiro, a exemplo do que ocorrer no México, na Rússia e no
próprio Brasil, desta vez na Argentina. É neste contexto que se
desenvolve a Campanha Salarial do funcionalismo, há sete anos sem
reajuste, e que ganharam a adesão do Supremo Tribunal Federal,
que julgou inconstitucional o fato de o governo não propor
aumento ao funcionalismo. Em meio a tudo isso, porém, o governo
Fernando Henrique não parece convencer-se da insatisfação
popular. Não há a menor menção de mudança nas diretrizes
governamentais. Maior prova disso é o cancelamento da chamada
“agenda positiva” do MEC. Com ela o ministro Paulo Renato
autorizaria a contratação imediata de 2.000 professores e
criaria a gratificação salarial aos servidores técnico-administrativos.
Neste contexto, a
Coordenação Nacional dos Servidores Públicos Federais prepara
os dias 9 e 10 de maio como dias de mobilização e luta, rumo a
junho onde se esperam maiores jornadas na luta contra o governo.
Agenda
positiva foi negada
O Ministério da Educação
anunciara em março, através do Secretário de Ensino Superior,
Antônio Macdowell Figueiredo, a tal agenda positiva onde se
previam a contratação de 2000 professores para as IFES, a criação
de uma gratificação para os técnico-administrativos e a aplicação
de R$ 138milhões nas IFES. Era o chamado “pacote de abril”.
Mais o negócio gorou.
O ministro Paulo Renato, sempre ele, anunciou no dia 25 de abril,
que as medidas iam ter que esperar um pouco mais.
Por esse motivo, os
reitores organizados na Associação Nacional dos Dirigentes das
Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES) decidiram
boicotar solenidade no Palácio do Planalto onde o governo federal
anunciaria a criação do Fundo de financiamento da pesquisa nas
IFES, no dia 26/4. Segundo o jornal O Globo, edição de 27 de
abril, as cadeiras destinadas aos reitores ficaram desertas e a
cerimônia foi esvaziada. Somente o reitor da UFRJ, José Henrique
Vilhena de Paiva, compareceu. Ele foi conduzido ao cargo pelo
ministro apesar de ter sido o terceiro colocado em uma prévia que
contou com a participação de toda a comunidade.
O presidente da ANDIFES,
Emídio Cantídio, compareceu apenas para repassar ao ministro
carta aprovada pelos reitores, na qual transparece o estado de
perplexidade e desânimo com o governo. Nesta mesma oportunidade,
Cantídio acabou sendo recebido por Fernando Henrique e se
comprometendo a redisacutir o assunto com a equipe econômica,
como se tivesse ainda algum crédito com a comunidade cioentífica.
A negativa do governo,, segundo acreidta o presidente da ANDIFES,
pode detonar uma nova greve nas universidades.
Esta é também a opinião
de José Domingues Godói Filho, diretor de Imprensa e Divulgação
do ANDES-SN, para quem o governo apenas põe mais lenha na
fogueira dos movimento. Ele também critica os valores anunciados
bombasticamente pelo governo para a infraestrutrura das IFES “o
valor total deste fundo de infraestrutura é de R$140 milhões em
dois anos, R$ 70 milhões por ano. Para 52 universidades? Com R$
1milhão por ano, a Rural recompõe as coisas? Não tem jeito”.
Isso, além do agravante de que a prioridade de aplicação dos
recursos, segundo FHC, seriam para as regiões Norte, Nordeste e
Centro-Oeste. Domingues lembra que a negativa do governo ocorre um
dia após o STF ter se posicionado em relação à obrigatoriedade
do governo em dar aumento ao funcionalismo. Para ele, a não
abertura de concursos é mais um elemento que vai de encontro ao
eixo central da mobilização docente, a reposição de vagas e
contratos pelo RJU. “O governo está fazendo com que o movimento
dos SPF não tenha outra saída”.
Domingues conclui
falando da importância dos dias 9 e 10 diante de uma conjuntura
de indefinições por parte do governo; “O ministro não está
resolvendo. O MPOG não funciona. Nos ministérios específicos as
negociações não caminham”. Nos dias 9 e 10, portanto, a
mobilização em cada local se organiza, cada qual em suas
especificidades, para pressionar o governo e criar condições
favoráveis de um movimento mais amplo que obrigue o governo ao
atendimento das reivindicações unificadas dos servidores.
Perdas
já alcançam 78%
Em
25 de abril mais um fato veio se somar à onda de inquietação
com o arrocho sobre o funcionalismo: o
Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, julgou
procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão,
proposta em 1999 pelo PT e PDT. Isto por quê desde junho de 1999,
quando foi aprovada a emenda 19 (Reforma Administrativa) , o
governo federal, assim como os estados e municípios, estão
obrigados a prever, pelo menos uma vez ao ano, a revisão dos salários.
O relator, ministro Ilmar Galvão, reconheceu em seu relatório
que o presidente não cumpre o inciso X do artigo 37 da Constituição
Federal.
O
Supremo, porém, se limita a falar de ilegalidade, não de injustiça.
Por isso se refere aos últimos dois anos quando na verdade são
sete anos sem reajuste. Neste período, segundo o IGP-DI, da Fundação
Getúlio Vargas, a inflação acumulada é de 89%. Se fôssemos
levar em consideração os últimos dois anos, 34%. A CUT, por sua
vez, através do Departamento de Estudos Sócio-Econômicos e Políticos
(Desep) calculou os reajustes necessários para repor as perdas
salariais dos servidores públicos federais entre janeiro de 1995
e março de 2001. Baseado no Índice de Custo de Vida (ICV), do
DIEESE, o índice alcançado é de 78,19%.
A
histórica decisão, é bom que se diga, não produz efeitos
imediatos por si só. Na verdade, no que cabe o STF, este endereçará
um ofício ao presidente sobre a questão, sem mesmo estipular
prazo para a confecção de um projeto de lei que dê aumento ao
funcionalismo. No entanto, tal decisão expressa o reconhecimento
por parte da corte máxima do país acerca da situação do
funcionalismo. Fortalece o movimento reivindicatório em curso, além
de possibilitar diversas ações no âmbito do judiciário.
Páginas
4 e 5
Cursos pagos: tendência é de aumento
Já
são cerca de 30 cursos de especialização latu-senso que
utilizam o mecanismo da cobrança de taxas ou mensalidades
destinadas, maciçamente, para o pagamento de pró-labores a
professores (cerca de 60%), via Fapur, e a tendência é de
aumentarem. Não está muito claro, ainda, para onde vão os
outros 40% dos recursos.
Para
os dirigentes, que seguem a orientação do movimento nacional dos
docentes - e essa questão é fartamente discutida nos fóruns do
Andes-SN - o que acontece, hoje, na Rural, é “apenas a ponta de
um iceberg que emerge nas IFES, no sentido da busca de saídas
paliativas e isoladas para superar a grave crise de financiamento
das universidades, devido ao contingenciamento de recursos imposto
pelo Governo federal”, avalia a professora Áurea Echevarria,
também diretora da Adur, dizendo ainda que, “na verdade, os
dirigentes universitários deveriam fazer o enfrentamento e a denúncia
constante da política de FHC para o ensino superior público
brasileiro. Porém, ao contrário disso, preferem capitular diante
das promessas de recursos que nunca chegam”.
As
diversas faces da privatização
Pablo
Gentili, doutor em
Educação e professor do Programa de Pós-graduação em Educação
da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, tem publicado
numerosos livros e artigos sobre as reformas neoliberais no campo
das políticas sociais. Como Pedagogia da Exclusão ou
Neoliberalismo, qualidade total e educação, ambos da Editora
Vozes.
Mas
é o livro Falsificação do Consenso – Simulacro e imposição
na reforma educacional do neoliberalismo - que o especialista,
nascido em Buenos Aires em 1963, e que tem proferido numerosas
palestras em universidades brasileiras, da América Latina,
Central e da Europa, cita ao Jornal da ADUR como referência sobre
o tema. Menciona, em especial, o capítulo “A complexidade do óbvio.
Os significados da privatização no campo educacional”, em que
explana sobre a universidade a caminho da privatização no caso
argentino:
“Um
fato curioso marcou esse processo. Apesar do forte apego que os
setores universitários argentinos têm pela gratuidade do ensino
superior, e inclusive no contexto de acirrados enfrentamentos
entre o governo favorável à privatização e a comunidade acadêmica
contrária a ela, os programas de pós-graduação acabaram sendo
deixados praticamente fora da disputa, à medida que se
configuravam como verdadeiras ilhas privatizadas dentro da própria
universidade pública (...) Finalmente, os dirigentes universitários
e os professores tampouco acabaram se constituindo numa força de
oposição a esta forma de privatização. Os primeiros porque
começaram a perceber que a possibilidade de uma oferta de cursos
pagos e com um alto nível de demanda iria garantia o fluxo de
caixa que o governo negava (...). Os segundos, porque começaram a
ter nos cursos de pós-graduação uma fonte de renda complementar
(e institucionalmente “oficial”) aos magros salários pagos
pelo Ministério da Educação”.
A
privatização é mito? Os cursos pagos são manifestação desta
política? São bem aceitos? Como resistir diante de condições
precárias e baixos salários? “A questão da privatização
interna está acontecendo de várias formas. Não só o pagamento
dos cursos revela isso”, pondera o pesquisador ao
ADUR Informa, comentando que várias universidades estão
terceirizando e delegando responsabilidade a empresas privadas,
como no caso de áreas administrativas e no campo da avaliação
interna.
“Não
tem a ver só com cobrar mensalidade ou taxas. Também significa
transferência de recursos públicos para instituições privadas
que passam a realizar certos tipos de atividades educacionais”,
diz citando como exemplo o “Provão”, cuja realização o MEC
delegou a duas grandes instituições privadas, as fundações
Carlos Chagas e Cesgranrio.
Aumentar
a participação de alunos – “os usuários” – no
financiamento com o pagamentos de cursos de especialização é
apenas uma parte. “Tem a ver com um mecanismo mais amplo de
reestruturação do sistema universitário e educacional. Mas esta
reestruturação inclui um processo de redefinição do papel do
estado no campo educacional que se afasta da prestação de serviços
educacionais mas ao mesmo tempo mantém ativa monitoração. O
mesmo estado brasileiro que enfatiza que alunos devem pagar para
que universidades melhorem é o mesmo que pagas fortunas a
instituições privadas para que avaliem o sistema”, diz.
O
Estado deixa de financiar oferta educacional, pesquisa, deixa de
investir recursos para infra-estutura, salário de docentes, mas
ao mesmo tempo, fiscaliza, supervisiona e fornece ao mercado os
indicadores. “O estado se afasta, mas radicaliza sua intervenção
– muito mais do que há 15 anos. Gasta muito mais dinheiro que
antes na avaliação. Mas dinheiro para quem? Duas grandes fundações
que enfrentam problemas financeiros quando os vestibulares
deixaram de ser unificados - recuperando papel de centralidade na
política universitária – delas depende o sistema principal de
avaliação das instituições públicas do governo que é o Provão”.
Resistência
Para
Gentili, a política de privatização não é tão bem aceita
assim. “Tem instituições que a adotaram, outras resistem. É
verdade que essas reformas neoliberais se mantém na medida em estão
mudando não só a universidade como a forma de pensar a
universidade – o neoliberalismo tem capacidade de penetração
capilar muito grande – e vai quebrando resistências, criando a
idéia de que não tem alternativa. A precarização das condições
de trabalho levam a todas essas formas de privatização visando
obter recursos. Mas há resistência de alguns setores da
universidade”.
Para
o professor, a bandeira de reforma universitária não pode ser do
governo. “Nós precisamos realizar a reforma universitária. Mas
numa base diferente da que o governo está propondo”. Segundo
avalia, é fundamental recuperar a discussão em torno do papel
das universidades e, finalmente, a possibilidade de criar espaços
de ação e trabalho coletivo que favoreçam a resistência de
forma integrada.
Ele
detecta enorme dificuldade para articular as lutas internas em nível
regional. “Na luta contra política neoliberal – ainda fraca,
débil – é importante gerar espaços comuns. A Universidade
Federal do Rio resistir ao neoliberalismo é bobagem. A batalha
interna é central, mas é preciso também articular essas lutas
entre todas as diferentes instituições para poder criar condições
para pensar e discutir a reforma universitária diferente da que o
governo está propondo. Nós, democratas, progressistas estamos
muitos na defensiva interna, sob o impacto dessas transformações
dentro das universidades. Mas devemos ir além para criar um espaço
comum de resistência”.
Uma ilha cercada por todos os lados
É
a imagem que nos vem à cabeça quando se ouve o professor Luiz
Carlos de Oliveira Lima, do Departamento de Economia do ICHS,
coordenador do curso de especialização em Gestão e Estratégias
em Agronegócios. Isso por conta de que o ICHS é a unidade da
Rural ponta de lança dos cursos de especialização latu-senso
pagos. O curso coordenado pelo professor Luiz Carlos é gratuito e
se difere da maioria dos cursos pagos de seu Instituto, não
apenas pelo fato de ser gratuito.
Adotando
uma postura de que o curso permaneça gratuito e da forma como foi
criado originalmente, Luiz Carlos diz que o fato de não ser pago,
“não tem absolutamente provocado nenhum problema no seu
funcionamento e nem redução ou prejuízo na sua qualidade acadêmica”,
reforçando que “dentro da universidade os cursos devem ser
gratuitos, mesmo aqueles de especialização ou os que estão
voltados para a formação profissional e para o mercado de
trabalho”, isso porque existe a infraestrutura básica e podem
ser ministrados dentro do horário normal de trabalho, o que, também
não interfere em sua qualidade, explica o coordenador.
Muito
diferente
As
diferenças entre o curso ministrado por Luiz Carlos e os que são
pagos podem ser enumeradas. Ele diz que uma delas é exatamente
pelo fato da gratuidade, já que “dar-se-á mais oportunidades
aquelas pessoas que não têm recursos para pagar, mas que têm
competência” e que a questão do pagamento restringe a demanda
apenas “para aqueles que tenham um determinado poder
aquisitivo”.
Além
disso, há a vantagem, segundo Luiz Carlos, da “liberdade de
escolha e seleção de pessoas que vão atuar no curso tendo as
mesmas obrigações” e de que, na verdade, “nós temos condições
de sustentar uma qualidade melhor, tendo em vista que não
dependemos de pagamento para que o curso continue a funcionar”,
isentando-o da pressão natural que sofrem e das concessões que têm
de fazer aos cursos pagos.
Outro
ponto importante é a questão do número de alunos que, uma vez
reduzido, pode inviabilizar o funcionamento do curso e que “a
necessidade de se ter um número mínimo acaba afetando a própria
qualidade”, avalia o professor, como um dos problemas dos cursos
pagos.
Critério
da Qualidade
Outra
diferença que é fundamental para Luiz Carlos é o critério de
seleção ao curso por ele ministrado, que se dá pela qualidade,
“tanto no sentido de sua formação quanto no sentido do projeto
que ele pretende desenvolver ao longo do curso” - que tem duração
de dois anos. Como não há pressa na formação do aluno,
“significa dizer que nós podemos produzir trabalhos (como está
ocorrendo), com mais calma, com o tempo necessário de elaboração
por parte do aluno, enriquecendo mais o curso. Não é uma produção
em série, mas sim um curso artesanal”, compara Luiz Carlos.
A recíproca na questão do
tempo necessário pode não ser verdadeira com respeito aos cursos
pagos, já que “quanto mais rápido o aluno terminar o curso,
maior será a margem de lucro daquele investimento”, conclui o
professor.
ANDES-SN:
Fundações pavimentam privatizações
Para o diretor de
imprensa e divulgação do Andes-SN José Domingues Godói Filho,
as Fundações têm cumprido papel importante no processo de
privatização interna na mesma medida em que o governo vai
cortando recursos. Para ele, os cursos não têm porquê serem
cobrados. Ele lembra, no entanto que, na reforma do Estado
preconizada pelo governo, criou-se, para universidades e hospitais
públicos, instituições de pesquisa e museus, a figura das
organizações sociais – que adotariam pessoal terceirizado, e
regime celetista e para as quais seriam repassados os recursos
destinados às instituições. “As fundações criadas estão se
prestando para pavimentar o caminho das organizações sociais e a
reforma do Estado, em que o governo se descompromete, reduzindo
parte do orçamento”, explica. Neste projeto, as fundações
seriam responsáveis por obter um percentual dos recursos com
cobrança de mensalidade e captação no mercado.
“O Estado deve
garantir a execução dos cursos de especialização. Nos últimos
três anos esses cursos foram formas de caça níquel para
aumentar salário com justificativa de que eram para material para laboratório. Se 30 pessoas pagam R$ 5
mil, com R$ 150 mil não se faz nada”, exemplifica. Para ele, as
fundações apóiam a terceirização e permitem a privatização
interna.
Opinião
da comunidade
O Adur Informa foi a algumas
unidades para saber qual o nível de informação sobre este
assunto e, como já era esperado, o resultado foi que as pessoas,
principalmente os estudantes, sabem muito pouco ou quase nada
sobre tema tão importante para a vida acadêmica. Algumas frases
como “ouvi falar que...” e “me disseram que...” se repetem
a cada pessoa que é entrevistada, remetendo-nos a uma leitura de
que tanto esse assunto quanto outros de mesma importância,
deveriam ser amplamente discutidos pela comunidade universitária,
mas que, infelizmente não o são. Curioso é que a maioria das
pessoas é contrária a privatização das universidades públicas
e não concorda com o pagamento de cursos, mesmo que de
especialização latu-senso.
Eduardo Belmonte, 22,
estudante de Licenciatura em Física – ICE: “Sei da existência
de cursos de pós-graduação latu-senso que são pagos aqui na
Rural e o ICHS é quem se destaca nas pós-graduações pagas. É
claro que eu tenho opinião contrária a essa política, dentro de
uma universidade pública. Não tenho idéia de quantos cursos são
e, me parece, ouvi falar, que custam, em média, 1.200 reais de
“investimento”, ao longo do curso. Eu não poderia pagar um
desses cursos, mas acho que a questão vai além do valor.
Importante saber é que política é essa, independente de ser ou
não barato, simbólico ou não. O que nos passam é que os
recursos são aplicados na própria universidade, o que tira do
governo, a responsabilidade com a manutenção da mesma”.
Elisabete Menezes dos
Santos, 26, estudante de Engenharia de Alimentos – IT:
“Sei da existência de cursos pagos aqui na Rural e acho
interessante porque são bem mais baratos do que em universidades
particulares. Mas, a princípio, acho que na universidade pública,
eles deveriam ser gratuitos. Não sei quantos cursos pagos existem
aqui. Sobre o valor pago, acho que custam de 180 a 400 reais, por
mês. Eu não teria condições de pagar 400 reais por mês para
fazer um curso desse, a não ser que eu tivesse bolsa”.
Jorge da Costa, 23,
estudante de Educação Física – ICHS: “Eu ouvi falar por
alto que alguns cursos de pós-graduação, aqui na Rural, são
pagos, mas não sei qual é o procedimento. Eu sou da opinião de
que não deveriam existir cursos pagos dentro de uma universidade
pública, mas a alegação é de que a faculdade não tem
estrutura para manter esses cursos gratuitamente. Os recursos que
vêm desse mecanismo me parecem que são para pagar os
professores. Agora mesmo, no meu curso, por exemplo, há
professores temporários, substitutos e isso é um problema que
tem que ser resolvido o quanto antes. Eu não concordo com essa
política em qualquer nível, mas eu acho que os que puderem
pagar, que paguem e aqueles que não puderem têm de ter a isenção”.
Sthefania F. S. Ribeiro,
19, estudante de Educação Física – ICHS: “Fiquei
sabendo que a pós-graduação na Rural é paga assim que eu
cheguei aqui. Sou da opinião de que isso não é bom. Hoje é com
a pós-graduação e amanhã é com a graduação. Talvez isso
seja para que a gente vá se acostumando com a idéia de, no
futuro, ter que pagar. Eu até poderia pagar um desses cursos, mas
acho que uma universidade pública não deva cobrar. Essa é a política
de FHC: vender e privatizar tudo, em detrimento das questões
sociais. Eu não concordo com a privatização do ensino público”.
José Luiz de Oliveira,
estudante de pós-graduação do IQ: “Pós-graduação com
bolsa de estudo já é difícil imagine sendo pago”.
Hildomar do Nascimento,
estudante de pós-graduação do IQ: “Eu sei da existência
de cursos pagos pelo que falavam durante a campanha eleitoral para
reitor. Foi um assunto colocado muito em questão. Não tenho idéia
de quantos são e sei que a maior concentração está no ICHS. Não
acho que seja correto cobrar por esses cursos”.
Leonir Resende, 56, técnico-administrativo,
Decanato de Assuntos Comunitários: “Eu já estou até achando
que essa é a única maneira para que as pessoas se levantem e
comecem a fazer alguma coisa. A gente não luta apenas por salário.
Lutamos por manter a universidade pública, gratuita e de
qualidade e não estamos brincando. Claro que eu não sou a favor
da privatização, mas essa política deve servir pelo menos para
isso: para fazer com que as pessoas se mobilizem, espero”.
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Em
rota de extinção
Essa a conclusão que chega o professor do Instituto de
Agronomia, Jorge Jacob Neto, decano de Pesquisa e Pós-graduação
da UFRRJ, quando se refere à existência dos cursos de
especialização latu-senso pagos, que hoje se avolumam na
instituição. Defendendo alguns pontos de
vista polêmicos em relação a essa questão, o dirigente, em
entrevista ao Adur Informa, diz que há uma “concorrência
brutal da universidade privada”, sendo esse, um dos elementos
que provocará o fim dessa modalidade acadêmica. Afirma também,
que sua existência não prejudica o caráter público de uma
instituição como a Rural, por sua tradição e competência acadêmica.
Adur Informa: Qual a sua
opinião acerca dos cursos pagos?
Jorge Jacob Neto: A Rural começou
com esses cursos em meio a uma mudança significativa da
sociedade, que demandou por sua realização e os professores
atenderam. Nós tivemos diferentes tipos de cursos nesses últimos
anos e ficamos numa situação muito difícil de, como instituição,
criticar. Primeiro porque a LDB mudou as relações do trabalho
docente e as pessoas têm que entender o que ela diz: que as IFES
têm que colaborar com a sociedade e essa colaboração tem que
ser feita de diferentes formas, pela Extensão ou pela prestação
de serviço, o que não está muito claro.
AI: O Artigo 206 da Constituição Federal estabelece que o Ensino tem
que ser ministrado com base em princípios e, em um de seus
incisos, o IV, diz da “gratuidade do ensino público em
estabelecimentos oficiais”. Isso é um orientador definitivo.
JJN:
É genérico. Na verdade, o ensino gratuito nesse país de
Terceiro Mundo, devia ser gratuito da pré-escola até a
universidade, incluindo a pós-graduação strictu-senso.
Normalmente tem-se na ordem de 10% da massa de estudantes que
fazem pós-graduação strictu-senso e esse percentual é de
estudantes que vão “tocar” o sistema de ensino e pesquisa e
de geração de conhecimento. Isso não é mais verdade nos países
de Primeiro Mundo, onde encontramos uma quantidade muito maior de
pessoas fazendo o doutorado, por exemplo.
No
Brasil, a pós-graduação strictu-senso tem que ser garantida,
estimulada e aumentado o seu percentual – que ainda é baixo em
relação ao volume de estudante que nós temos.
AI: Como
é que o senhor avalia a possível contradição entre ter que
haver uma interface com as camadas menos privilegiadas socialmente
e as demandas emergentes e sofisticadas de mercado?
JJN:
A universidade tem um papel claramente definido: gerar a informação
e formar indivíduos qualificados. Isso, na verdade significa
pesquisar e ensinar. É fundamental que se faça pesquisa na
universidade. Eu tenho medo que estejamos caminhando para uma
universidade apenas propedêutica ou que se transforme em um escolão.
Isto não deu certo em nenhum país que tentou adequar-se a esse
modelo e a Inglaterra é um deles.
No
passado, foi criado um sistema chamado Embrater ou Emater, na área
de Ciências Agrárias, que dava apoio ao pequeno e ao médio
produtor. Nos últimos
15 ou 20 anos, as Emater sofreram muito com a política de
estabilização da Extensão e de financiamento. O pequeno
produtor não tem nenhuma condição de ter um profissional de
agronomia, veterinária ou zootecnia disponível de forma
integral. Custa caro. E se não tem a Emater, ele fica sem apoio e
sem tecnologia. Sem as Emater, o país fica sem Extensão e
responsabiliza, hoje, a universidade por esta atividade, que também
tem esse papel, é óbvio, mas ela não pode assumir o papel da
sociedade em fazer essa Extensão.
AI: Que professores são esses, que fazem esses cursos? São aqueles que
estão na pesquisa ou apenas aqueles que estão fora dos projetos
de pesquisa?
JJN:
São todos eles. Tanto os que estão à frente de pesquisas como
os que não estão. Evidentemente, o processo de pesquisa é muito
mais competitivo e deixou de fora algumas pessoas na questão da
titulação. Para um grupo de professores que não se titularam
nesses últimos anos, o massacre salarial é muito maior, uma vez
que os salários são irrisórios.
AI: Por conta disso há a possibilidade de proliferação desses cursos
de forma perigosa para a instituição, pela busca de compensação
salarial?
JJN:
Há e é perigoso. Mas
a compensação salarial é justa. E aqui é que a discussão fica
interessante. O mercado é quem regula se você tem ou não competência
para estar funcionando.
AI: Mas é correta essa regulação pelo mercado sobre a academia?
JJN:
Eu também tenho várias interrogações a respeito disso. Será
que isso é justo? Não devemos definir nossas pesquisas em função
do mercado, claro, mas há demandas que podemos dar conta sem
nenhum problema. O que não podemos é perder a liberdade. Se
perdermos a liberdade, acaba a graça e eu vou trabalhar em outro
lugar, vou para a Shell ou outra empresa. Agora, não podemos
achar que ao oferecermos qualquer curso teremos público. O que a
academia tem que fazer é monitorar o tempo todo essa questão.
Ela tem que ter coragem para enfrentar o mercado.
AI: A universidade pública deve fazer prestação de serviço?
JJN:
Nós não podemos fazer essa discussão sem pensar no mundo. Isso
já acontece no mundo todo há muitos anos e já está superado. E
superou-se de forma muito inteligente. Nos países mais democráticos,
França, Inglaterra, por exemplo, acontece que nas universidades a
prestação de serviços é fato há muito tempo e é
regulamentada. Existe, inclusive, possibilidade de se contratar
professores por projetos e esses se mantêm durante a existência
do projeto. Isso, se o projeto for competente o suficiente para
gerar informação e recursos. Se assim não for, são demitidos.
Agora, eu sou absolutamente contra esse método em um país de
Terceiro Mundo como o nosso. A universidade de Terceiro Mundo deve
ter outro papel, como já dissemos. Ela não pode se abrir por uma
razão muito simples: o nosso povo é pobre e se fosse rico, não
haveria nenhum problema. Pagar-se-ia a universidade como se paga
nos países desenvolvidos e se manteria bolsas para carência.
AI: O senhor não acha que o financiamento por parte do Estado deva
continuar, já que está em jogo a qualidade do Ensino, da
Pesquisa e da Extensão?
JJN:
Sem dúvida. Mas eu acho que deve haver a liberdade no mundo acadêmico
e ao mesmo tempo, haver a pesquisa orientada. Não se pode impedir
que o acúmulo de conhecimento de mercado, se é que podemos chamá-lo
assim, seja vendido. Vendido como? Como parceria. O que está
errado é o processo. A discussão certa é a de patente, de geração
de tecnologias.
Os
cursos profissionalizantes que estão sendo oferecidos no país têm
vida curta. Isso é discussão de momento e eles têm curta duração.
A oferta de cursos de especialização é uma brincadeira.
Qualquer universidade os oferece e com qualidade complicada.
Agora, tem alguém querendo fazer isso. Indivíduos têm o
conhecimento acumulado, junto a uma sociedade que demanda por ter
esse conhecimento, além de não haver cursos regulares de graduação
ou strictu-senso para determinadas áreas. Como é que vamos
fazer? Vamos impedir? Vamos querer deslocar professores para
ministrar um determinado curso, em período normal, ocupando espaço
e dinheiro da instituição pública sem contrapartida ou feed
back? Essa hipótese não existe.
AI: Quem é o público referencial desses cursos?
JJN:
São profissionais liberais, profissionais ligados a empresas e
grupos empresariais. E a cobrança desses cursos depende do público
referencial. Se uma empresa nos procura para fazer uma parceria ou
solicitando que prestemos um serviço de atualização ou
especialização de seus funcionários, nós cobraremos por isso.
A graduação e a pós-graduação strictu-senso devem continuar
sendo gratuitas, como já disse anteriormente.
AI: A existência de cursos dessa natureza pode mudar o perfil da Rural?
JJN:
Nunca. Essa instituição tem uma tradição de geração de
tecnologia e informação como pouquíssimas universidades públicas
têm.
AI: Quais os critérios que devem ser estabelecidos para que esses
cursos continuem a existir?
JJN:
Primeiro, o acadêmico. Esse é fundamental. E estamos começando,
internamente, essa discussão aqui na decania. Tudo aqui dentro
deve ser baseado na academia. Outro critério é a lei, além de
serem aprovados por todos os trâmites formais e democráticos da
instituição. Agora, é importante que as pessoas fiquem atentas,
porque é injusto que elas não estejam discutindo as coisas,
colocando seus pontos de vista e depois venham falar mal.
AI: E o destino dos recursos que são captados por esses cursos?
JJN:
Precisamos normatizar e definir regras, ou seja, primeiro a acadêmica;
segundo, a normatização financeira: pra onde vai esse dinheiro?
Como é que vai ser usado? Quem recebe? O professor vai ganhar?
Quanto ele vai ganhar? Os técnico-administrativos vão
participar? Eu sou favorável a isso, mesmo que este não esteja
envolvido diretamente, mas ele faz parte do corpo de atividade
meio da instituição.
Agora,
eu acho que a nossa instituição é muito maior do que essa
discussão de cursos de especialização. Cursos estes que, em sua
grande maioria vão ser extintos, já que universidade nenhuma
procura especialistas, que ficarão restritos ao seu ambiente de
trabalho na empresa, apenas.
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Avaliar
não é julgar o aluno
Luiz Carlos Gomes de Melo - Prof. Aposentado
A ADUR tem se destacado
politicamente como um baluarte na defesa de uma universidade pública,
gratuita, laica e de qualidade. Por acreditar que a ADUR também
se preocupa com o nível de ensino de seus professores e,
principalmente, com a política educacional que aqui são
praticados, resolvi dar as contribuições abaixo. Nesse sentido,
as leituras de Bordenave2,
Paulo Freire, Frei Beto, Moacir Gadotti, Pedro Demo, Rubem Alves e
outros, muito me ajudaram a seguir a mesma linha.
No primeiro período dos cursos de graduação, em geral,
ocorre um paradoxo, no mínimo, injusto, senão, desumano. Os
alunos neófitos nem bem acabaram de passar pelo exame Vestibular,
pagando taxas incompatíveis com o conjunto de serviços à sua
disposição, são reprovados, em sua grande maioria, em
disciplinas nas quais foram recém considerados aptos pela CPV. A
desculpa dos professores é que eles passaram no Vestibular sem
base! Então, questiona-se: para que serve, ou melhor, a quem
serve aquele exame? É pelo menos paradoxal.
O
mesmo comportamento dos colegas professores acaba se repetindo nos
demais períodos, principalmente em disciplinas ditas básicas,
com a desculpa ingênua de que os alunos não estudaram o
suficiente! Não é o que tenho testemunhado na sala de estudos, o
que pode ser constatado por quem se interessar. Em busca de
respostas para tamanha injustiça, percebi que estes problemas têm
raízes muito profundas. Do lado dos professores, constata-se que
são vítimas de um sistema educacional cruel e covarde, a serviço
dos detentores de grandes fortunas, a maioria deles sem o saber,
cujo sistema, para perpetuar o acúmulo dessas riquezas, exige que
o professor utilize as mesmas práticas
adotadas pelos seus antecessores, as quais remontam aos séculos
16 e 17, implantadas ainda pelos jesuítas1. Para aqueles que duvidam disso, lembrem-se que os melhores
talentos (capital intelectual) estão sendo assalariados pelos
Bill Gates, George Soros e Forbes da vida (coincidentemente
multibilionários!).
Apesar
dos professores terem como augusta missão a de ensinar, são
“despejados” nas salas de aulas sem a menor preparação, tão
somente com os conhecimentos técnicos adquiridos. Assim sendo,
quase nada sabem de metodologia de ensino e muito menos de relações
humanas. Resultado: a grande maioria não sabe dar boas aulas e, o
pior, ignora sequer como avaliar seus alunos. A maioria dos
professores não consegue diferenciar avaliação de verificação
da aprendizagem e teimam em achar que estão medindo adequadamente
o conhecimento adquirido pelo alunado. Na verdade, as notas, para
a grande maioria dos estudantes (talvez bem mais do que 95%),
sejam totalmente injustas. O uso de
“pegadinhas” para apanhar os menos espertos tem-se
demonstrado excessivo fazendo
do aluno um mero adivinho.
Outro
exemplo é o de provas com apenas cinco questões, valendo cada
uma dois pontos, de formas que o estudante só possa tirar zero ou
dois, quatro, seis, oito ou dez (praticamente inatingível). Este
tipo de avaliação nivela o aluno por baixo, sendo, portanto,
injusto. Para diferenciar a avaliação da verificação da
aprendizagem, existe a prova “inteligente” e a prova
“receita de bolo”. A primeira enfatiza o porquê fazer,
acabando por se tratar de uma prova, embora difícil, suave, sem
estressar o estudante e, aquele que realmente estudou, consegue
terminá-la em menos de trinta minutos. Já a prova “receita de
bolo” é geralmente quantitativa e voltada para o como fazer,
podendo requerer até três horas ou mais para a sua realização.
Isto para quem estudou muito, pois para os demais, coitados ...
nem com “lembretes”. O que este tipo de prova está medindo?
Será a resistência (física e psicológica) dos estudantes ou
será outra a intenção do avaliador, como a de reprovar uma
grande maioria? Em algumas turmas gigantescas só passa uma meia dúzia
de gatos pingados. O que se pretende com isso? Será manter o
status quo dos professores? Por que os professores insistem em
corrigir os erros ao invés de aproveitar os acertos? Alegam
turmas grandes, o que impede o conhecimento individual de seus
alunos (despersonalizando o processo ensino-aprendizagem), bem
como instalações inadequadas, ambiente desconfortável etc.
Estas mesmas alegações também são prejudiciais ao corpo
discente, refletidas nas reprovações. Uma determinada disciplina
exige a elaboração de até sete provas teóricas, realizadas em
horário inadequado e para todas as turmas ao mesmo tempo. A meu
ver, é uma prática anti-didática, despersonalizando o processo
ensino-aprendizagem. Então surgem as notas baixas, e, quando os
alunos reclamam, constatam nas revisões que pode ter havido erro
no somatório das pontuações ou excesso de rigor nas correções.
Ainda
sobre a verificação, existem outros absurdos, incoerentes com a
linha de pensamento da ADUR. É comum algumas disciplinas serem
ministradas em módulos, com vários professores responsáveis,
porém a verificação está, muita das vezes, a cargo de um ou de
apenas dois, podendo ocorrer distorções nas notas devido a critérios
diferentes. Face esses e outros absurdos, resolvi trazê-los para
esse fórum de discussão que é a ADUR, para tanto, apresento as
seguintes sugestões:
a)
criação de um grupo (ou de grupos) de apoio pedagógico, visando
a recuperação do estudante no lugar da reprovação pura e
simples; b) eliminar a prática de “pegadinhas”; c) acabar com
provas fora do horário da disciplina; d) acabar com provas
padronizadas para todas as turmas; e) dimensionar melhor a duração
das provas; f) humanizar mais as aulas e principalmente as provas;
g) reciclar permanentemente o corpo docente; h) criar um
compromisso permanente na ADUR de acompanhamento do processo
ensino-aprendizagem, e, finalmente, espero por uma avaliação
justa, dentre outras sugestões. Afinal, avaliar é buscar justiça3. Avaliar é construir a cidadania. Ensinar é
querer bem aos educandos4.
1.LUCKESI,
Cipriano Carlos. Entrevista ao JB, em 30/07/2000. 2.BORDENAVE, Juan Diaz et PEREIRA, Adair M. Estratégias
de Ensino-Aprendizagem. 12ª ed. Petrópolis: Vozes. 1991, 312p.
3.HOFFMANN, Jussara. Entrevista ao JB, em
12/09/1999.
4.FREIRE,
Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários á prática
educativa. 11ª
ed. São Paulo: Paz e Terra. 1999, 165 p.
Relatório
Financeiro
Bimestre -
Setembro/Outubro
(Disponível apenas na mídia impressa).
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Dez anos de Luzia na Adur
Dia 30 de maio a Adur
completa 22 anos de existência. Antes disso, no dia seis de maio,
a Luzia completou dez anos de trabalho na Adur. Além do Dia das Mães,
a Adur, seus sindicalizados, seus diretores e funcionários têm,
no mês de maio, muito mais o que comemorar, afinal são duas
datas importantes. São mais de duas décadas de Adur que conta
com uma década de Luzia. São dez... Vinte e poucos anos de
convivência. Talvez se deva comemorar um só Dia das Mães. Isso
mesmo, apenas um. Afinal, em seu sentido pleno, a Adur não deixou
de ser uma mãe – buscou congregar todos os seus filhos - e a
Luzia, nem se fala.
Luzia Aparecida da Silva
Lopes, escolhida em processo de seleção pública que contou com
duzentos e quarenta e três candidatos. Após uma
pré-seleção restaram quarenta e dois. Vieram as provas e
só ficaram oito, que participaram de uma entrevista. O
resultado deu no que deu. Luzia, a sua terceira batalha, venceu.
Luzia
segundo ela mesma:
"E lá se vão dez
anos. Num sábado de abril de 1991 ultrapassei a barreira de
Irajá e conheci esse pequeno pedaço de maravilha que é a ADUR,
centrada em um espaço tão bucólico e tão bonito dentro da
Rural.
Tive a graça de ser
escolhida entre tantos candidatos. Aí começava uma etapa
que com certeza é uma das mais bonitas e prazerosas em minha vida
profissional.
O espírito político da
ADUR ensinou-me a descobrir a cidadã que existe em mim e que até
aquela data permanecia um tanto quanto adormecida.
Sempre fui de 'vestir a
camisa', mas aqui, sinto como se o time fosse meu. Tenho vontade,
sempre, de qe tudo seja feito de maneira impecável na expectativa
de que os resultados sejam sempre os esperados por todos. Sinto-me
muito feliz por comemorar 10 anos de ADUR", conta ela.
Uma
Benção
Como se vê, sua dedicação
e o amor pela Adur são visíveis. Fato importante em seu
trabalho, já que o faz com o maior zelo e “porque sei que isso
contribui com a entidade e para que ela não tenha nenhum aspecto
ou resultado negativo”, diz Luzia, com uma pontinha de humildade
e inibição. Talvez o que melhor expresse isso é o que ela
mesma define: “a Adur para mim é uma benção. É um local onde
encontrei grandes e verdadeiros amigos, além de excelentes
colegas de trabalho. Tenho um enorme respeito por todos os
filiados”.
Mas o que ainda melhor
ilustra essa afinidade, é uma frase que foi escrita no Adur
Informa de novembro de 1995, do professor Luiz Mauro, quando
ecerrava sua gestão na entidade: “A Luzia é um barato!”.
Parabéns Luzia. Salve Luzia!
Rural
em “Estado de Sítio” dia 15/5
Depois da exibição do
filme Jango, de Sylvio Tendler no dia 17/4, na ADUR, prossegue a
proposta do núcleo “Educação, Política s Sociedade”.
A apresentação de vídeos seguidos de debates conta, desta vez
com o filme Estado de Sítio, de Costa-Gravas. O cineasta francês
que notabilizou-se, sobretudo, a partir de Z (1969), suspense político
que denuncia abusos da ditadura militar na Grécia dos anos 60.
Seus filmes seguintes consagram-no como um mestre do cinema político:
A confissão (1970), Estado de Sítio (1973) Desaparecido (1982,
Palma de Ouro em Cannes) e Hanna K. (1983). A apresenta será
nesta terça-feira, dia 15/5, a partir das 17h, na sede da
entidade.
A iniciativa foi
apreciada pelo público que foi à sede dia 17 de abril. A
professora Lucília de Paula, da diretoria ampliada da ADUR e
coordenadora do projeto espera que a atividade se consolide como
um momento de congraçamento entre os segmentos da comunidade. Além
de incentivar o debate político e a ampliação da consciência
crítica.
Terror
na América Latina
Os regimes militares que se
instalaram entre os anos 60 e 80 em países localizados no Cone
Sul: Brasil, Uruguai, Argentina e Chile foram apoiados pelos
Estados Unidos no contexto da Guerra Fria e da chamada “ameaça
do comunismo”. Provocaram
a intervenção das Forças Armadas na vida política e a instalação
da ditadura militar no Cone Sul: entre 1964 e 1985 no Brasil,
entre 1973 e 1984 no Uruguai entre 1973 e 1989 no Chile e entre
1976 e 1983 na Argentina. Suprimem a liberdade democrática,
promovem a extinção dos partidos políticos, a restrição dos
poderes Legislativo e Judiciário e o fechamento de sindicatos e
de organizações estudantis. Há forte censura à imprensa, e
qualquer oposição ao governo é proibida. Adversários do regime
são punidos com perseguições, prisões e deportações.
Era comum a prática de
tortura como método de interrogatório dos suspeitos de subversão.
Em muitos casos, os governos militares do Cone Sul apóiam-se
mutuamente em suas estratégias de repressão e manutenção do
poder. As Mães da Praça de Maio ficaram conhecidas
internacionalmente por sua peregrinação diária à praça de
Buenos Aires em busca dos filhos desaparecidos. Gamma/Almanaque
Abril.
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