Clique no link para ter acesso às  Edições Anteriores 


  ADUR  Informa

ANO  22

Nº 25

14 A 27/5

2001

FILIADA À CUT


       ADUR Informa - publicação da Associação dos Docentes da UFRuralRJ. 
       Conselho Editorial: Áurea Echevarria, Francisco de Assis da Silva, Nídia Majerowicz, 
                                          Ricardo L. L. Berbara e Valdomiro Neves Lima.
       Jornalistas Responsáveis: Regina Rocha (Reg. 16269/MTb) e 
                                                     Fortunato Mauro (Reg. 20732/MTb).
                 As matérias não assinadas são de responsabilidade do Conselho Editorial.

Privatização interna: soa o alarme

 O que vai acontecer com a Rural, a julgar pela crescente onda de cursos pagos que começam a proliferar em seu interior? Essa é uma pergunta que deve ser respondida “a partir do estabelecimento de um processo amplo e democrático de discussão que nos permita vislumbrar o futuro de nossa instituição”, avalia a professora Nídia Majerovicz, diretora da Adur. Sem que isso aconteça, vai se formando uma colcha de retalhos infindável. Aprova-se um curso aqui e outro acolá, “analisando-os no varejo, sem que a discussão de fundo seja feita, já que tanto o CEPE quanto o Consu, não a fazem da forma que deveria ser feita, no atacado e profundamente. Além, é claro, de não avaliarem o impacto desses cursos na estrutura universitária”, diagnostica Nídia, sentenciando que “quando nos dermos conta, vai ser tarde”.

Outras perguntas se seguem, no sentido da avaliação do impacto na estrutura acadêmica, financeira e administrativa da Rural, assim como a análise da interferência ou não em seu caráter público, mas que ficam sem respostas se um processo de discussão e convencimento democrático não for colocado em prática.

Para Pablo Gentili, a privatização na educação superior tem se apresentado sob diversas formas além dos cursos pagos, com a transferência de recursos para instituições privadas. O Andes-SN sustenta que é as fundações que facilitam as prestações de serviços pavimentam o caminho da privatização.

Estudantes e docentes apresentam aqui suas impressões sobre um processo que vem crescendo nas universidades federais, em especial na Rural. Infelizmente já se ouviu dizer, publicamente, por exemplo, que quem interessa são os que podem pagar. (Páginas 4 e 5)

Opinião 

“Sei da existência desses cursos e acho que este é o início da privatização da universidade pública. Universidade pública essa, que o governo deveria manter com qualidade elevada. Se até o Provão mostrou que a universidade pública é melhor do que a particular – quando ele era pra mostrar o inverso -, não há porque começar a instituir, agora, cursos pagos para transformar a universidade pública em particular. Eu acho que o governo está querendo tirar de sua responsabilidade o financiamento da universidade. Primeiro ele contingência os recursos e depois estabelece essa política que é bem aceita pelas administrações das universidades. Eu não poderia pagar um desses cursos e não tenho a menor idéia de para onde vão esses recursos, mas acho que é para pagar aos professores, que, aliás, já são pagos para isso”, diz Jean Martins Almeida, 26, estudante de Química Industrial. (Leia mais na Página 5)

Mobilização

O Governo Federal está longe de reunir as melhores condições para enfrentar o movimento popular e seguir aplicando o receituário do FMI. Os velhos espectros da corrupção cruzam corredores e salas dos três poderes, revelando a resistente aliança entre política e acumulação capitalista no Brasil. No entanto, FHC insiste. Em sua teimosia acaba de vitimar mais uma vez a universidade, negando-lhe reforçar, ainda que minimamente, seu quadro docente e aplicar alguma política de remuneração aos seus trabalhadores. (Página 3)


Página 2 

Investimento do Estudante?

No último dia 15 de abril, o ministro da Educação em entrevista publicada no JB, respondendo à pergunta do repórter Plínio Fraga sobre as denúncias de mercantilização do ensino e o sucateamento da Universidade pública, durante a sua gestão, mostra os números do MEC. No período 94 – 99, o ministro afirma que houve um crescimento de 28% das matrículas na graduação e pós-graduação, um crescimento de 12%, na média, do percentual de doutores nas universidades federais e ainda que a proporção de 1 computador para cada 200 estudantes passou para 1/19 , nessas instituições de ensino.

Paralelamente, pergunta o próprio ministro: “Uma Universidade que está sendo sucateada consegue responder por 70% da Educação do país? ”

Os dados apresentados (ou a estatística do MEC) têm  a contribuição da UFRuralRJ, com seus novos cursos, seus novos doutores e seus novos computadores. Entretanto, o grande número de professores substitutos contratados com salários aviltantes a falta de material nos laboratórios, o número excessivo de alunos por turma nos cursos básicos e mesmo, a falta de professores em várias delas, apontam na direção de uma necessária análise, mais rigorosa, daqueles dados. Na verdade, a expansão do número de matrículas não está acompanhada de um sério planejamento cuja meta deve ser uma formação de alta qualidade, do primeiro ao último dia de aula, do estudante regularmente matriculado em seu curso.

Grande parte das matrículas expandidas nesse período em nossa pós-graduação, ocorre em cursos de especialização latu-sensu, pagos (ou com “investimento do estudante” , como gostam de dizer seus organizadores) e, mesmo a pós-graduação strictu-sensu não consegue, contrariamente a maior parte dos programas de nossas congêneres públicas do Estado: UFRJ, UFF, UERJ, matricular gratuitamente seus estudantes regulares. Portanto, a expansão das matrículas na UFRuralRJ, está gerando dois novos tipos de estudantes: na graduação, um estudante desmotivado desde o início de seu curso, pelas condições vivenciadas nos primeiros contatos acadêmicos (salas de aula, laboratórios, horários), enquanto na pós-graduação,  um estudante que paga para cursar a Universidade pública e gratuita.

Como o mesmo corpo docente, é responsável pela formação desses estudantes, é preciso que, em torno de nossa Associação (ADUR-RJ), busquemos entender o quê o ministro da Educação quer falar, ao dizer na mesma entrevista: “A questão do financiamento do ensino superior não foi colocada ainda. Não está havendo muita pressão dos mais pobres sobre essa questão, porque eles infelizmente ainda não chegaram ao ensino superior. Mas vão chegar ”.

Assim, “os captadores de re-cursos (ou recursos)” voltarão, após séria reflexão sobre suas atividades, à verdadeira profissão que escolheram, como diz Michelangelo Trigueiro no livro “Universidades públicas: desafios e possibilidades no Brasil contemporâneo”, de Professores Universitários, criativos e otimistas no trabalho desafiador e instigante de preparar cidadãos de uma nação com nome de Brasil.

Como vive o trabalhador no Brasil

Segundo o IBGE, a taxa média de desemprego em 2000 ficou em 7,1%.

Segundo pesquisa conjunta da Fundação Seade e Dieese, o número de desempregados no ABC Paulista foi de 220 mil trabalhadores: a taxa de desemprego passou de 17,1% da População economicamente ativa (PEA) em fevereiro para 18% em março.

O custo da cesta básica subiu até 3,2% no Rio em abril. Foi o maior índice registrado pelo Instituto Fecomércio desde o início da pesquisa nos supermercados em 98.

O Dieese registrou aumento de preços nas 16 capitais pesquisadas. Em dez das 16 capitais já ultrapassou R$ 100.

Segundo o Dieese, o salário mínimo ideal para o sustento de uma família com quatro pessoal (dois adualtos e duas crianças) deveria ser de R$ 1.092,97. Ou seja, 6,1 vezes o valor vigente, de R$ 180,00.

O mínimo tem apenas 27,41% do poder de compra de quando foi criado, em julho de 1940.

50,1% dos ocupados no Brasil vivem com renda até dois salários mínimos. Isso equivale a aproximadamente 30,4 milhões de trabalhadores em 1999, de acordo com a Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios do IBGE.

Em São Paulo são 26% e em recife a taxa chega a 59,9%.

Mulheres e negros têm maior representação neste contingente.

No Brasil, segundo o Banco Mundial, os 20% mais pobres ficam com 2,6% da renda do país, enquanto os 20% mais ricos ficam com 63%.

No Brasil, 15 milhões vivem com menos de um dólar por dia.

43 milhões vivem com menos de dois dólares no país.

Protesto no Primeiro de Maio

Com índices como esses o trabalhador brasileiro chegou ao 1º de maio em 2001. Há 110 anos da instituição da data em nível mundial – que marcou os protestos em que trabalhadores dos EUA e do Canadá exigiam redução de jornada para oito horas, que culminaram com a morte de cinco líderes operários em Chicago – os trabalhadores seguem exigindo respeito e condições dignas de trabalho. “Hoje, comemorar o 1º de Maio é afirmar que nenhuma nova conquista será possível se não formos capazes de preservar nossas velhas conquistas e direitos contra a ofensiva destruidora e desregulamentadora dos tratados de livre comércio – como a Alça – das políticas de ajuste ditadas pelo FMI, que FHC aplica, dos ataques contra os direitos trabalhistas e a própria existência dos sindicatos”, sustenta Júlio Turra, da Executiva Nacional da Central Única dos Trabalhadores.

Neste 1º de maio, a CUT chamou manifestações em todo país contra o governo neoliberal de FHC, pela instauração da CPI da corrupção, pelo pagamento do FGTS integral e pela reposição dos salários das categorias em campanha salarial. No Rio, o protesto foi na Praça Mauá, com recreação, almoço e ato público com show. Nas cidades do país, trabalhadores foram às ruas protestar contra este governo que, submetido ao FMI, vem impondo ao povo miséria, arrocho de salário, aumento do desemprego e entrega do patrimônio público. Um governo envolvido em escândalos e desvio de recursos público. A Coordenação Estadual dos Servidores público propôs que todos os sindicatos do setor integrassem o ato público, mais uma etapa na campanha unificada deflagrada no início do ano pela reposição das perdas acumuladas ao longo de sete anos, mais uma obra do governo FHC.

Agenda 2001

19 e 20/5 - Plenárias do Andes-SN e dos SPF

31/5 - Dia nacional de defesa das políticas públicas

Junho - Indicativo de greve dos SPF

13 a 18/6 - Reuniaõ anual da SBPC e SBPC paralela em Salvador, Bahia.


Página 3 

Crise na política e na economia

Escândalos no Senado e  a ameaça de uma CPI da corrupção assombram o governo. Talvez não tanto quanto à eminência de um sério abalo financeiro, a exemplo do que ocorrer no México, na Rússia e no próprio Brasil, desta vez na Argentina. É neste contexto que se desenvolve a Campanha Salarial do funcionalismo, há sete anos sem reajuste, e que ganharam a adesão do Supremo Tribunal Federal, que julgou inconstitucional o fato de o governo não propor aumento ao funcionalismo. Em meio a tudo isso, porém, o governo Fernando Henrique não parece convencer-se da insatisfação popular. Não há a menor menção de mudança nas diretrizes governamentais. Maior prova disso é o cancelamento da chamada “agenda positiva” do MEC. Com ela o ministro Paulo Renato autorizaria a contratação imediata de 2.000 professores e criaria a gratificação salarial aos servidores técnico-administrativos.

Neste contexto, a Coordenação Nacional dos Servidores Públicos Federais prepara os dias 9 e 10 de maio como dias de mobilização e luta, rumo a junho onde se esperam maiores jornadas na luta contra o governo. 

Agenda positiva foi negada

O Ministério da Educação anunciara em março, através do Secretário de Ensino Superior, Antônio Macdowell Figueiredo, a tal agenda positiva onde se previam a contratação de 2000 professores para as IFES, a criação de uma gratificação para os técnico-administrativos e a aplicação de R$ 138milhões nas IFES. Era o chamado “pacote de abril”.

Mais o negócio gorou. O ministro Paulo Renato, sempre ele, anunciou no dia 25 de abril, que as medidas iam ter que esperar um pouco mais.

Por esse motivo, os reitores organizados na Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (ANDIFES) decidiram boicotar solenidade no Palácio do Planalto onde o governo federal anunciaria a criação do Fundo de financiamento da pesquisa nas IFES, no dia 26/4. Segundo o jornal O Globo, edição de 27 de abril, as cadeiras destinadas aos reitores ficaram desertas e a cerimônia foi esvaziada. Somente o reitor da UFRJ, José Henrique Vilhena de Paiva, compareceu. Ele foi conduzido ao cargo pelo ministro apesar de ter sido o terceiro colocado em uma prévia que contou com a participação de toda a comunidade.

O presidente da ANDIFES, Emídio Cantídio, compareceu apenas para repassar ao ministro carta aprovada pelos reitores, na qual transparece o estado de perplexidade e desânimo com o governo. Nesta mesma oportunidade, Cantídio acabou sendo recebido por Fernando Henrique e se comprometendo a redisacutir o assunto com a equipe econômica, como se tivesse ainda algum crédito com a comunidade cioentífica. A negativa do governo,, segundo acreidta o presidente da ANDIFES, pode detonar uma nova greve nas universidades.

Esta é também a opinião de José Domingues Godói Filho, diretor de Imprensa e Divulgação do ANDES-SN, para quem o governo apenas põe mais lenha na fogueira dos movimento. Ele também critica os valores anunciados bombasticamente pelo governo para a infraestrutrura das IFES “o valor total deste fundo de infraestrutura é de R$140 milhões em dois anos, R$ 70 milhões por ano. Para 52 universidades? Com R$ 1milhão por ano, a Rural recompõe as coisas? Não tem jeito”. Isso, além do agravante de que a prioridade de aplicação dos recursos, segundo FHC, seriam para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Domingues lembra que a negativa do governo ocorre um dia após o STF ter se posicionado em relação à obrigatoriedade do governo em dar aumento ao funcionalismo. Para ele, a não abertura de concursos é mais um elemento que vai de encontro ao eixo central da mobilização docente, a reposição de vagas e contratos pelo RJU. “O governo está fazendo com que o movimento dos SPF não tenha outra saída”.

Domingues conclui falando da importância dos dias 9 e 10 diante de uma conjuntura de indefinições por parte do governo; “O ministro não está resolvendo. O MPOG não funciona. Nos ministérios específicos as negociações não caminham”. Nos dias 9 e 10, portanto, a mobilização em cada local se organiza, cada qual em suas especificidades, para pressionar o governo e criar condições favoráveis de um movimento mais amplo que obrigue o governo ao atendimento das reivindicações unificadas dos servidores. 

Perdas já alcançam 78%

Em 25 de abril mais um fato veio se somar à onda de inquietação com o arrocho sobre o funcionalismo: o  Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, proposta em 1999 pelo PT e PDT. Isto por quê desde junho de 1999, quando foi aprovada a emenda 19 (Reforma Administrativa) , o governo federal, assim como os estados e municípios, estão obrigados a prever, pelo menos uma vez ao ano, a revisão dos salários. O relator, ministro Ilmar Galvão, reconheceu em seu relatório que o presidente não cumpre o inciso X do artigo 37 da Constituição Federal.

O Supremo, porém, se limita a falar de ilegalidade, não de injustiça. Por isso se refere aos últimos dois anos quando na verdade são sete anos sem reajuste. Neste período, segundo o IGP-DI, da Fundação Getúlio Vargas, a inflação acumulada é de 89%. Se fôssemos levar em consideração os últimos dois anos, 34%. A CUT, por sua vez, através do Departamento de Estudos Sócio-Econômicos e Políticos (Desep) calculou os reajustes necessários para repor as perdas salariais dos servidores públicos federais entre janeiro de 1995 e março de 2001. Baseado no Índice de Custo de Vida (ICV), do DIEESE, o índice alcançado é de 78,19%.

A histórica decisão, é bom que se diga, não produz efeitos imediatos por si só. Na verdade, no que cabe o STF, este endereçará um ofício ao presidente sobre a questão, sem mesmo estipular prazo para a confecção de um projeto de lei que dê aumento ao funcionalismo. No entanto, tal decisão expressa o reconhecimento por parte da corte máxima do país acerca da situação do funcionalismo. Fortalece o movimento reivindicatório em curso, além de possibilitar diversas ações no âmbito do judiciário.


Páginas  4 e 5

Cursos pagos: tendência é de aumento

Já são cerca de 30 cursos de especialização latu-senso que utilizam o mecanismo da cobrança de taxas ou mensalidades destinadas, maciçamente, para o pagamento de pró-labores a professores (cerca de 60%), via Fapur, e a tendência é de aumentarem. Não está muito claro, ainda, para onde vão os outros 40% dos recursos.

Para os dirigentes, que seguem a orientação do movimento nacional dos docentes - e essa questão é fartamente discutida nos fóruns do Andes-SN - o que acontece, hoje, na Rural, é “apenas a ponta de um iceberg que emerge nas IFES, no sentido da busca de saídas paliativas e isoladas para superar a grave crise de financiamento das universidades, devido ao contingenciamento de recursos imposto pelo Governo federal”, avalia a professora Áurea Echevarria, também diretora da Adur, dizendo ainda que, “na verdade, os dirigentes universitários deveriam fazer o enfrentamento e a denúncia constante da política de FHC para o ensino superior público brasileiro. Porém, ao contrário disso, preferem capitular diante das promessas de recursos que nunca chegam”. 

As diversas faces da privatização

Pablo Gentili,  doutor em Educação e professor do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, tem publicado numerosos livros e artigos sobre as reformas neoliberais no campo das políticas sociais. Como Pedagogia da Exclusão ou Neoliberalismo, qualidade total e educação, ambos da Editora Vozes.

Mas é o livro Falsificação do Consenso – Simulacro e imposição na reforma educacional do neoliberalismo - que o especialista, nascido em Buenos Aires em 1963, e que tem proferido numerosas palestras em universidades brasileiras, da América Latina, Central e da Europa, cita ao Jornal da ADUR como referência sobre o tema. Menciona, em especial, o capítulo “A complexidade do óbvio. Os significados da privatização no campo educacional”, em que explana sobre a universidade a caminho da privatização no caso argentino:

“Um fato curioso marcou esse processo. Apesar do forte apego que os setores universitários argentinos têm pela gratuidade do ensino superior, e inclusive no contexto de acirrados enfrentamentos entre o governo favorável à privatização e a comunidade acadêmica contrária a ela, os programas de pós-graduação acabaram sendo deixados praticamente fora da disputa, à medida que se configuravam como verdadeiras ilhas privatizadas dentro da própria universidade pública (...) Finalmente, os dirigentes universitários e os professores tampouco acabaram se constituindo numa força de oposição a esta forma de privatização. Os primeiros porque começaram a perceber que a possibilidade de uma oferta de cursos pagos e com um alto nível de demanda iria garantia o fluxo de caixa que o governo negava (...). Os segundos, porque começaram a ter nos cursos de pós-graduação uma fonte de renda complementar (e institucionalmente “oficial”) aos magros salários pagos pelo Ministério da Educação”.

A privatização é mito? Os cursos pagos são manifestação desta política? São bem aceitos? Como resistir diante de condições precárias e baixos salários? “A questão da privatização interna está acontecendo de várias formas. Não só o pagamento dos cursos revela isso”, pondera o pesquisador ao  ADUR Informa, comentando que várias universidades estão terceirizando e delegando responsabilidade a empresas privadas, como no caso de áreas administrativas e no campo da avaliação interna.

“Não tem a ver só com cobrar mensalidade ou taxas. Também significa transferência de recursos públicos para instituições privadas que passam a realizar certos tipos de atividades educacionais”, diz citando como exemplo o “Provão”, cuja realização o MEC delegou a duas grandes instituições privadas, as fundações Carlos Chagas e Cesgranrio.

Aumentar a participação de alunos – “os usuários” – no financiamento com o pagamentos de cursos de especialização é apenas uma parte. “Tem a ver com um mecanismo mais amplo de reestruturação do sistema universitário e educacional. Mas esta reestruturação inclui um processo de redefinição do papel do estado no campo educacional que se afasta da prestação de serviços educacionais mas ao mesmo tempo mantém ativa monitoração. O mesmo estado brasileiro que enfatiza que alunos devem pagar para que universidades melhorem é o mesmo que pagas fortunas a instituições privadas para que avaliem o sistema”, diz.

O Estado deixa de financiar oferta educacional, pesquisa, deixa de investir recursos para infra-estutura, salário de docentes, mas ao mesmo tempo, fiscaliza, supervisiona e fornece ao mercado os indicadores. “O estado se afasta, mas radicaliza sua intervenção – muito mais do que há 15 anos. Gasta muito mais dinheiro que antes na avaliação. Mas dinheiro para quem? Duas grandes fundações que enfrentam problemas financeiros quando os vestibulares deixaram de ser unificados - recuperando papel de centralidade na política universitária – delas depende o sistema principal de avaliação das instituições públicas do governo que é o Provão”.

 Resistência

Para Gentili, a política de privatização não é tão bem aceita assim. “Tem instituições que a adotaram, outras resistem. É verdade que essas reformas neoliberais se mantém na medida em estão mudando não só a universidade como a forma de pensar a universidade – o neoliberalismo tem capacidade de penetração capilar muito grande – e vai quebrando resistências, criando a idéia de que não tem alternativa. A precarização das condições de trabalho levam a todas essas formas de privatização visando obter recursos. Mas há resistência de alguns setores da universidade”.

Para o professor, a bandeira de reforma universitária não pode ser do governo. “Nós precisamos realizar a reforma universitária. Mas numa base diferente da que o governo está propondo”. Segundo avalia, é fundamental recuperar a discussão em torno do papel das universidades e, finalmente, a possibilidade de criar espaços de ação e trabalho coletivo que favoreçam a resistência de forma integrada.

Ele detecta enorme dificuldade para articular as lutas internas em nível regional. “Na luta contra política neoliberal – ainda fraca, débil – é importante gerar espaços comuns. A Universidade Federal do Rio resistir ao neoliberalismo é bobagem. A batalha interna é central, mas é preciso também articular essas lutas entre todas as diferentes instituições para poder criar condições para pensar e discutir a reforma universitária diferente da que o governo está propondo. Nós, democratas, progressistas estamos muitos na defensiva interna, sob o impacto dessas transformações dentro das universidades. Mas devemos ir além para criar um espaço comum de resistência”.   

Uma ilha cercada por todos os lados

É a imagem que nos vem à cabeça quando se ouve o professor Luiz Carlos de Oliveira Lima, do Departamento de Economia do ICHS, coordenador do curso de especialização em Gestão e Estratégias em Agronegócios. Isso por conta de que o ICHS é a unidade da Rural ponta de lança dos cursos de especialização latu-senso pagos. O curso coordenado pelo professor Luiz Carlos é gratuito e se difere da maioria dos cursos pagos de seu Instituto, não apenas pelo fato de ser gratuito.

Adotando uma postura de que o curso permaneça gratuito e da forma como foi criado originalmente, Luiz Carlos diz que o fato de não ser pago, “não tem absolutamente provocado nenhum problema no seu funcionamento e nem redução ou prejuízo na sua qualidade acadêmica”, reforçando que “dentro da universidade os cursos devem ser gratuitos, mesmo aqueles de especialização ou os que estão voltados para a formação profissional e para o mercado de trabalho”, isso porque existe a infraestrutura básica e podem ser ministrados dentro do horário normal de trabalho, o que, também não interfere em sua qualidade, explica o coordenador. 

Muito diferente

As diferenças entre o curso ministrado por Luiz Carlos e os que são pagos podem ser enumeradas. Ele diz que uma delas é exatamente pelo fato da gratuidade, já que “dar-se-á mais oportunidades aquelas pessoas que não têm recursos para pagar, mas que têm competência” e que a questão do pagamento restringe a demanda apenas “para aqueles que tenham um determinado poder aquisitivo”.

Além disso, há a vantagem, segundo Luiz Carlos, da “liberdade de escolha e seleção de pessoas que vão atuar no curso tendo as mesmas obrigações” e de que, na verdade, “nós temos condições de sustentar uma qualidade melhor, tendo em vista que não dependemos de pagamento para que o curso continue a funcionar”, isentando-o da pressão natural que sofrem e das concessões que têm de fazer aos cursos pagos.

Outro ponto importante é a questão do número de alunos que, uma vez reduzido, pode inviabilizar o funcionamento do curso e que “a necessidade de se ter um número mínimo acaba afetando a própria qualidade”, avalia o professor, como um dos problemas dos cursos pagos. 

Critério da Qualidade

Outra diferença que é fundamental para Luiz Carlos é o critério de seleção ao curso por ele ministrado, que se dá pela qualidade, “tanto no sentido de sua formação quanto no sentido do projeto que ele pretende desenvolver ao longo do curso” - que tem duração de dois anos. Como não há pressa na formação do aluno, “significa dizer que nós podemos produzir trabalhos (como está ocorrendo), com mais calma, com o tempo necessário de elaboração por parte do aluno, enriquecendo mais o curso. Não é uma produção em série, mas sim um curso artesanal”, compara Luiz Carlos.

A recíproca na questão do tempo necessário pode não ser verdadeira com respeito aos cursos pagos, já que “quanto mais rápido o aluno terminar o curso, maior será a margem de lucro daquele investimento”, conclui o professor.

ANDES-SN: Fundações pavimentam privatizações

Para o diretor de imprensa e divulgação do Andes-SN José Domingues Godói Filho, as Fundações têm cumprido papel importante no processo de privatização interna na mesma medida em que o governo vai cortando recursos. Para ele, os cursos não têm porquê serem cobrados. Ele lembra, no entanto que, na reforma do Estado preconizada pelo governo, criou-se, para universidades e hospitais públicos, instituições de pesquisa e museus, a figura das organizações sociais – que adotariam pessoal terceirizado, e regime celetista e para as quais seriam repassados os recursos destinados às instituições. “As fundações criadas estão se prestando para pavimentar o caminho das organizações sociais e a reforma do Estado, em que o governo se descompromete, reduzindo parte do orçamento”, explica. Neste projeto, as fundações seriam responsáveis por obter um percentual dos recursos com cobrança de mensalidade e captação no mercado.

“O Estado deve garantir a execução dos cursos de especialização. Nos últimos três anos esses cursos foram formas de caça níquel para aumentar salário com justificativa de que eram  para material para laboratório. Se 30 pessoas pagam R$ 5 mil, com R$ 150 mil não se faz nada”, exemplifica. Para ele, as fundações apóiam a terceirização e permitem a privatização interna. 

Opinião da comunidade

O Adur Informa foi a algumas unidades para saber qual o nível de informação sobre este assunto e, como já era esperado, o resultado foi que as pessoas, principalmente os estudantes, sabem muito pouco ou quase nada sobre tema tão importante para a vida acadêmica. Algumas frases como “ouvi falar que...” e “me disseram que...” se repetem a cada pessoa que é entrevistada, remetendo-nos a uma leitura de que tanto esse assunto quanto outros de mesma importância, deveriam ser amplamente discutidos pela comunidade universitária, mas que, infelizmente não o são. Curioso é que a maioria das pessoas é contrária a privatização das universidades públicas e não concorda com o pagamento de cursos, mesmo que de especialização latu-senso

Eduardo Belmonte, 22, estudante de Licenciatura em Física – ICE: “Sei da existência de cursos de pós-graduação latu-senso que são pagos aqui na Rural e o ICHS é quem se destaca nas pós-graduações pagas. É claro que eu tenho opinião contrária a essa política, dentro de uma universidade pública. Não tenho idéia de quantos cursos são e, me parece, ouvi falar, que custam, em média, 1.200 reais de “investimento”, ao longo do curso. Eu não poderia pagar um desses cursos, mas acho que a questão vai além do valor. Importante saber é que política é essa, independente de ser ou não barato, simbólico ou não. O que nos passam é que os recursos são aplicados na própria universidade, o que tira do governo, a responsabilidade com a manutenção da mesma”. 

Elisabete Menezes dos Santos, 26, estudante de Engenharia de Alimentos – IT: “Sei da existência de cursos pagos aqui na Rural e acho interessante porque são bem mais baratos do que em universidades particulares. Mas, a princípio, acho que na universidade pública, eles deveriam ser gratuitos. Não sei quantos cursos pagos existem aqui. Sobre o valor pago, acho que custam de 180 a 400 reais, por mês. Eu não teria condições de pagar 400 reais por mês para fazer um curso desse, a não ser que eu tivesse bolsa”. 

Jorge da Costa, 23, estudante de Educação Física – ICHS: “Eu ouvi falar por alto que alguns cursos de pós-graduação, aqui na Rural, são pagos, mas não sei qual é o procedimento. Eu sou da opinião de que não deveriam existir cursos pagos dentro de uma universidade pública, mas a alegação é de que a faculdade não tem estrutura para manter esses cursos gratuitamente. Os recursos que vêm desse mecanismo me parecem que são para pagar os professores. Agora mesmo, no meu curso, por exemplo, há professores temporários, substitutos e isso é um problema que tem que ser resolvido o quanto antes. Eu não concordo com essa política em qualquer nível, mas eu acho que os que puderem pagar, que paguem e aqueles que não puderem têm de ter a isenção”. 

Sthefania F. S. Ribeiro, 19, estudante de Educação Física – ICHS: “Fiquei sabendo que a pós-graduação na Rural é paga assim que eu cheguei aqui. Sou da opinião de que isso não é bom. Hoje é com a pós-graduação e amanhã é com a graduação. Talvez isso seja para que a gente vá se acostumando com a idéia de, no futuro, ter que pagar. Eu até poderia pagar um desses cursos, mas acho que uma universidade pública não deva cobrar. Essa é a política de FHC: vender e privatizar tudo, em detrimento das questões sociais. Eu não concordo com a privatização do ensino público”. 

José Luiz de Oliveira, estudante de pós-graduação do IQ: “Pós-graduação com bolsa de estudo já é difícil imagine sendo pago”. 

Hildomar do Nascimento, estudante de pós-graduação do IQ: “Eu sei da existência de cursos pagos pelo que falavam durante a campanha eleitoral para reitor. Foi um assunto colocado muito em questão. Não tenho idéia de quantos são e sei que a maior concentração está no ICHS. Não acho que seja correto cobrar por esses cursos”. 

Leonir Resende, 56, técnico-administrativo, Decanato de Assuntos Comunitários: “Eu já estou até achando que essa é a única maneira para que as pessoas se levantem e comecem a fazer alguma coisa. A gente não luta apenas por salário. Lutamos por manter a universidade pública, gratuita e de qualidade e não estamos brincando. Claro que eu não sou a favor da privatização, mas essa política deve servir pelo menos para isso: para fazer com que as pessoas se mobilizem, espero”.


Página 6 

Em rota de extinção

Essa a conclusão que chega o professor do Instituto de Agronomia, Jorge Jacob Neto, decano de Pesquisa e Pós-graduação da UFRRJ, quando se refere à existência dos cursos de especialização latu-senso pagos, que hoje se avolumam na instituição. Defendendo alguns pontos de vista polêmicos em relação a essa questão, o dirigente, em entrevista ao Adur Informa, diz que há uma “concorrência brutal da universidade privada”, sendo esse, um dos elementos que provocará o fim dessa modalidade acadêmica. Afirma também, que sua existência não prejudica o caráter público de uma instituição como a Rural, por sua tradição e competência acadêmica. 

Adur Informa:  Qual a sua opinião acerca dos cursos pagos?

Jorge Jacob Neto: A Rural começou com esses cursos em meio a uma mudança significativa da sociedade, que demandou por sua realização e os professores atenderam. Nós tivemos diferentes tipos de cursos nesses últimos anos e ficamos numa situação muito difícil de, como instituição, criticar. Primeiro porque a LDB mudou as relações do trabalho docente e as pessoas têm que entender o que ela diz: que as IFES têm que colaborar com a sociedade e essa colaboração tem que ser feita de diferentes formas, pela Extensão ou pela prestação de serviço, o que não está muito claro. 

AI: O Artigo 206 da Constituição Federal estabelece que o Ensino tem que ser ministrado com base em princípios e, em um de seus incisos, o IV, diz da “gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais”. Isso é um orientador definitivo.

JJN: É genérico. Na verdade, o ensino gratuito nesse país de Terceiro Mundo, devia ser gratuito da pré-escola até a universidade, incluindo a pós-graduação strictu-senso. Normalmente tem-se na ordem de 10% da massa de estudantes que fazem pós-graduação strictu-senso e esse percentual é de estudantes que vão “tocar” o sistema de ensino e pesquisa e de geração de conhecimento. Isso não é mais verdade nos países de Primeiro Mundo, onde encontramos uma quantidade muito maior de pessoas fazendo o doutorado, por exemplo.

No Brasil, a pós-graduação strictu-senso tem que ser garantida, estimulada e aumentado o seu percentual – que ainda é baixo em relação ao volume de estudante que nós temos.  

AI: Como é que o senhor avalia a possível contradição entre ter que haver uma interface com as camadas menos privilegiadas socialmente e as demandas emergentes e sofisticadas de mercado?

JJN: A universidade tem um papel claramente definido: gerar a informação e formar indivíduos qualificados. Isso, na verdade significa pesquisar e ensinar. É fundamental que se faça pesquisa na universidade. Eu tenho medo que estejamos caminhando para uma universidade apenas propedêutica ou que se transforme em um escolão. Isto não deu certo em nenhum país que tentou adequar-se a esse modelo e a Inglaterra é um deles.

No passado, foi criado um sistema chamado Embrater ou Emater, na área de Ciências Agrárias, que dava apoio ao pequeno e ao médio produtor.  Nos últimos 15 ou 20 anos, as Emater sofreram muito com a política de estabilização da Extensão e de financiamento. O pequeno produtor não tem nenhuma condição de ter um profissional de agronomia, veterinária ou zootecnia disponível de forma integral. Custa caro. E se não tem a Emater, ele fica sem apoio e sem tecnologia. Sem as Emater, o país fica sem Extensão e responsabiliza, hoje, a universidade por esta atividade, que também tem esse papel, é óbvio, mas ela não pode assumir o papel da sociedade em fazer essa Extensão. 

AI: Que professores são esses, que fazem esses cursos? São aqueles que estão na pesquisa ou apenas aqueles que estão fora dos projetos de pesquisa?

JJN: São todos eles. Tanto os que estão à frente de pesquisas como os que não estão. Evidentemente, o processo de pesquisa é muito mais competitivo e deixou de fora algumas pessoas na questão da titulação. Para um grupo de professores que não se titularam nesses últimos anos, o massacre salarial é muito maior, uma vez que os salários são irrisórios. 

AI: Por conta disso há a possibilidade de proliferação desses cursos de forma perigosa para a instituição, pela busca de compensação salarial?

JJN: Há e é perigoso.  Mas a compensação salarial é justa. E aqui é que a discussão fica interessante. O mercado é quem regula se você tem ou não competência para estar funcionando. 

AI: Mas é correta essa regulação pelo mercado sobre a academia?

JJN: Eu também tenho várias interrogações a respeito disso. Será que isso é justo? Não devemos definir nossas pesquisas em função do mercado, claro, mas há demandas que podemos dar conta sem nenhum problema. O que não podemos é perder a liberdade. Se perdermos a liberdade, acaba a graça e eu vou trabalhar em outro lugar, vou para a Shell ou outra empresa. Agora, não podemos achar que ao oferecermos qualquer curso teremos público. O que a academia tem que fazer é monitorar o tempo todo essa questão. Ela tem que ter coragem para enfrentar o mercado. 

AI: A universidade pública deve fazer prestação de serviço?

JJN: Nós não podemos fazer essa discussão sem pensar no mundo. Isso já acontece no mundo todo há muitos anos e já está superado. E superou-se de forma muito inteligente. Nos países mais democráticos, França, Inglaterra, por exemplo, acontece que nas universidades a prestação de serviços é fato há muito tempo e é regulamentada. Existe, inclusive, possibilidade de se contratar professores por projetos e esses se mantêm durante a existência do projeto. Isso, se o projeto for competente o suficiente para gerar informação e recursos. Se assim não for, são demitidos. Agora, eu sou absolutamente contra esse método em um país de Terceiro Mundo como o nosso. A universidade de Terceiro Mundo deve ter outro papel, como já dissemos. Ela não pode se abrir por uma razão muito simples: o nosso povo é pobre e se fosse rico, não haveria nenhum problema. Pagar-se-ia a universidade como se paga nos países desenvolvidos e se manteria bolsas para carência. 

AI: O senhor não acha que o financiamento por parte do Estado deva continuar, já que está em jogo a qualidade do Ensino, da Pesquisa e da Extensão?

JJN: Sem dúvida. Mas eu acho que deve haver a liberdade no mundo acadêmico e ao mesmo tempo, haver a pesquisa orientada. Não se pode impedir que o acúmulo de conhecimento de mercado, se é que podemos chamá-lo assim, seja vendido. Vendido como? Como parceria. O que está errado é o processo. A discussão certa é a de patente, de geração de tecnologias.

Os cursos profissionalizantes que estão sendo oferecidos no país têm vida curta. Isso é discussão de momento e eles têm curta duração. A oferta de cursos de especialização é uma brincadeira. Qualquer universidade os oferece e com qualidade complicada. Agora, tem alguém querendo fazer isso. Indivíduos têm o conhecimento acumulado, junto a uma sociedade que demanda por ter esse conhecimento, além de não haver cursos regulares de graduação ou strictu-senso para determinadas áreas. Como é que vamos fazer? Vamos impedir? Vamos querer deslocar professores para ministrar um determinado curso, em período normal, ocupando espaço e dinheiro da instituição pública sem contrapartida ou feed back? Essa hipótese não existe. 

AI: Quem é o público referencial desses cursos?

JJN: São profissionais liberais, profissionais ligados a empresas e grupos empresariais. E a cobrança desses cursos depende do público referencial. Se uma empresa nos procura para fazer uma parceria ou solicitando que prestemos um serviço de atualização ou especialização de seus funcionários, nós cobraremos por isso. A graduação e a pós-graduação strictu-senso devem continuar sendo gratuitas, como já disse anteriormente.  

AI: A existência de cursos dessa natureza pode mudar o perfil da Rural?

JJN: Nunca. Essa instituição tem uma tradição de geração de tecnologia e informação como pouquíssimas universidades públicas têm. 

AI: Quais os critérios que devem ser estabelecidos para que esses cursos continuem a existir?

JJN: Primeiro, o acadêmico. Esse é fundamental. E estamos começando, internamente, essa discussão aqui na decania. Tudo aqui dentro deve ser baseado na academia. Outro critério é a lei, além de serem aprovados por todos os trâmites formais e democráticos da instituição. Agora, é importante que as pessoas fiquem atentas, porque é injusto que elas não estejam discutindo as coisas, colocando seus pontos de vista e depois venham falar mal. 

AI: E o destino dos recursos que são captados por esses cursos?

JJN: Precisamos normatizar e definir regras, ou seja, primeiro a acadêmica; segundo, a normatização financeira: pra onde vai esse dinheiro? Como é que vai ser usado? Quem recebe? O professor vai ganhar? Quanto ele vai ganhar? Os técnico-administrativos vão participar? Eu sou favorável a isso, mesmo que este não esteja envolvido diretamente, mas ele faz parte do corpo de atividade meio da instituição.

Agora, eu acho que a nossa instituição é muito maior do que essa discussão de cursos de especialização. Cursos estes que, em sua grande maioria vão ser extintos, já que universidade nenhuma procura especialistas, que ficarão restritos ao seu ambiente de trabalho na empresa, apenas. 


Página 7

Avaliar não é julgar o aluno
Luiz Carlos Gomes de Melo - Prof. Aposentado
 

       A ADUR tem se destacado politicamente como um baluarte na defesa de uma universidade pública, gratuita, laica e de qualidade. Por acreditar que a ADUR também se preocupa com o nível de ensino de seus professores e, principalmente, com a política educacional que aqui são praticados, resolvi dar as contribuições abaixo. Nesse sentido, as leituras de Bordenave2, Paulo Freire, Frei Beto, Moacir Gadotti, Pedro Demo, Rubem Alves e outros, muito me ajudaram a seguir a mesma linha.

 No primeiro período dos cursos de graduação, em geral, ocorre um paradoxo, no mínimo, injusto, senão, desumano. Os alunos neófitos nem bem acabaram de passar pelo exame Vestibular, pagando taxas incompatíveis com o conjunto de serviços à sua disposição, são reprovados, em sua grande maioria, em disciplinas nas quais foram recém considerados aptos pela CPV. A desculpa dos professores é que eles passaram no Vestibular sem base! Então, questiona-se: para que serve, ou melhor, a quem serve aquele exame? É pelo menos paradoxal.

O mesmo comportamento dos colegas professores acaba se repetindo nos demais períodos, principalmente em disciplinas ditas básicas, com a desculpa ingênua de que os alunos não estudaram o suficiente! Não é o que tenho testemunhado na sala de estudos, o que pode ser constatado por quem se interessar. Em busca de respostas para tamanha injustiça, percebi que estes problemas têm raízes muito profundas. Do lado dos professores, constata-se que são vítimas de um sistema educacional cruel e covarde, a serviço dos detentores de grandes fortunas, a maioria deles sem o saber, cujo sistema, para perpetuar o acúmulo dessas riquezas, exige que o professor utilize as mesmas práticas  adotadas pelos seus antecessores, as quais remontam aos séculos 16 e 17, implantadas ainda pelos jesuítas1. Para aqueles que duvidam disso, lembrem-se que os melhores talentos (capital intelectual) estão sendo assalariados pelos Bill Gates, George Soros e Forbes da vida (coincidentemente multibilionários!). 

Apesar dos professores terem como augusta missão a de ensinar, são “despejados” nas salas de aulas sem a menor preparação, tão somente com os conhecimentos técnicos adquiridos. Assim sendo, quase nada sabem de metodologia de ensino e muito menos de relações humanas. Resultado: a grande maioria não sabe dar boas aulas e, o pior, ignora sequer como avaliar seus alunos. A maioria dos professores não consegue diferenciar avaliação de verificação da aprendizagem e teimam em achar que estão medindo adequadamente o conhecimento adquirido pelo alunado. Na verdade, as notas, para a grande maioria dos estudantes (talvez bem mais do que 95%), sejam totalmente injustas. O uso de  “pegadinhas” para apanhar os menos espertos tem-se demonstrado excessivo  fazendo do aluno um mero adivinho. 

Outro exemplo é o de provas com apenas cinco questões, valendo cada uma dois pontos, de formas que o estudante só possa tirar zero ou dois, quatro, seis, oito ou dez (praticamente inatingível). Este tipo de avaliação nivela o aluno por baixo, sendo, portanto, injusto. Para diferenciar a avaliação da verificação da aprendizagem, existe a prova “inteligente” e a prova “receita de bolo”. A primeira enfatiza o porquê fazer, acabando por se tratar de uma prova, embora difícil, suave, sem estressar o estudante e, aquele que realmente estudou, consegue terminá-la em menos de trinta minutos. Já a prova “receita de bolo” é geralmente quantitativa e voltada para o como fazer, podendo requerer até três horas ou mais para a sua realização. Isto para quem estudou muito, pois para os demais, coitados ... nem com “lembretes”. O que este tipo de prova está medindo? Será a resistência (física e psicológica) dos estudantes ou será outra a intenção do avaliador, como a de reprovar uma grande maioria? Em algumas turmas gigantescas só passa uma meia dúzia de gatos pingados. O que se pretende com isso? Será manter o status quo dos professores? Por que os professores insistem em corrigir os erros ao invés de aproveitar os acertos? Alegam turmas grandes, o que impede o conhecimento individual de seus alunos (despersonalizando o processo ensino-aprendizagem), bem como instalações inadequadas, ambiente desconfortável etc. Estas mesmas alegações também são prejudiciais ao corpo discente, refletidas nas reprovações. Uma determinada disciplina exige a elaboração de até sete provas teóricas, realizadas em horário inadequado e para todas as turmas ao mesmo tempo. A meu ver, é uma prática anti-didática, despersonalizando o processo ensino-aprendizagem. Então surgem as notas baixas, e, quando os alunos reclamam, constatam nas revisões que pode ter havido erro no somatório das pontuações ou excesso de rigor nas correções. 

Ainda sobre a verificação, existem outros absurdos, incoerentes com a linha de pensamento da ADUR. É comum algumas disciplinas serem ministradas em módulos, com vários professores responsáveis, porém a verificação está, muita das vezes, a cargo de um ou de apenas dois, podendo ocorrer distorções nas notas devido a critérios diferentes. Face esses e outros absurdos, resolvi trazê-los para esse fórum de discussão que é a ADUR, para tanto, apresento as seguintes sugestões: 

a) criação de um grupo (ou de grupos) de apoio pedagógico, visando a recuperação do estudante no lugar da reprovação pura e simples; b) eliminar a prática de “pegadinhas”; c) acabar com provas fora do horário da disciplina; d) acabar com provas padronizadas para todas as turmas; e) dimensionar melhor a duração das provas; f) humanizar mais as aulas e principalmente as provas; g) reciclar permanentemente o corpo docente; h) criar um compromisso permanente na ADUR de acompanhamento do processo ensino-aprendizagem, e, finalmente, espero por uma avaliação justa, dentre outras sugestões. Afinal, avaliar é buscar justiça3. Avaliar é construir a cidadania. Ensinar é querer bem aos educandos4.

1.LUCKESI, Cipriano Carlos. Entrevista ao JB, em 30/07/2000. 2.BORDENAVE, Juan Diaz et PEREIRA, Adair M. Estratégias de Ensino-Aprendizagem. 12ª ed. Petrópolis: Vozes. 1991, 312p.
3.HOFFMANN, Jussara. Entrevista ao JB, em 12/09/1999.
4.FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários á prática educativa. 11ª ed. São Paulo: Paz e Terra. 1999, 165 p. 

Relatório Financeiro

Bimestre - Setembro/Outubro
(Disponível apenas na mídia impressa).


Página 8

Dez anos de Luzia na Adur

Dia 30 de maio a Adur completa 22 anos de existência. Antes disso, no dia seis de maio, a Luzia completou dez anos de trabalho na Adur. Além do Dia das Mães, a Adur, seus sindicalizados, seus diretores e funcionários têm, no mês de maio, muito mais o que comemorar, afinal são duas datas importantes. São mais de duas décadas de Adur que conta com uma década de Luzia. São dez... Vinte e poucos anos de convivência. Talvez se deva comemorar um só Dia das Mães. Isso mesmo, apenas um. Afinal, em seu sentido pleno, a Adur não deixou de ser uma mãe – buscou congregar todos os seus filhos - e a Luzia, nem se fala.

Luzia Aparecida da Silva Lopes, escolhida em processo de seleção pública que contou com duzentos e quarenta e três candidatos.  Após uma pré-seleção restaram quarenta e dois.  Vieram as provas e só ficaram oito, que participaram de uma entrevista.  O resultado deu no que deu. Luzia, a sua terceira batalha, venceu.

Luzia segundo ela mesma:

"E lá se vão dez anos. Num sábado de abril de 1991 ultrapassei a barreira de Irajá e conheci esse pequeno pedaço de maravilha que é a ADUR, centrada em um espaço tão bucólico e tão bonito dentro da Rural.

Tive a graça de ser escolhida entre tantos candidatos.  Aí começava uma etapa que com certeza é uma das mais bonitas e prazerosas em minha vida profissional.

O espírito político da ADUR ensinou-me a descobrir a cidadã que existe em mim e que até aquela data permanecia um tanto quanto adormecida.

Sempre fui de 'vestir a camisa', mas aqui, sinto como se o time fosse meu. Tenho vontade, sempre, de qe tudo seja feito de maneira impecável na expectativa de que os resultados sejam sempre os esperados por todos. Sinto-me muito feliz por comemorar 10 anos de ADUR", conta ela.

Uma Benção

Como se vê, sua dedicação e o amor pela Adur são visíveis. Fato importante em seu trabalho, já que o faz com o maior zelo e “porque sei que isso contribui com a entidade e para que ela não tenha nenhum aspecto ou resultado negativo”, diz Luzia, com uma pontinha de humildade e inibição.  Talvez o que melhor expresse isso é o que ela mesma define: “a Adur para mim é uma benção. É um local onde encontrei grandes e verdadeiros amigos, além de excelentes colegas de trabalho. Tenho um enorme respeito por todos os filiados”.

Mas o que ainda melhor ilustra essa afinidade, é uma frase que foi escrita no Adur Informa de novembro de 1995, do professor Luiz Mauro, quando ecerrava sua gestão na entidade: “A Luzia é um barato!”. Parabéns Luzia. Salve Luzia!   

Rural em  “Estado de Sítio” dia 15/5

Depois da exibição do filme Jango, de Sylvio Tendler no dia 17/4, na ADUR, prossegue a proposta do núcleo  “Educação, Política s Sociedade”. A apresentação de vídeos seguidos de debates conta, desta vez com o filme Estado de Sítio, de Costa-Gravas. O cineasta francês que notabilizou-se, sobretudo, a partir de Z (1969), suspense político que denuncia abusos da ditadura militar na Grécia dos anos 60. Seus filmes seguintes consagram-no como um mestre do cinema político: A confissão (1970), Estado de Sítio (1973) Desaparecido (1982, Palma de Ouro em Cannes) e Hanna K. (1983). A apresenta será nesta terça-feira, dia 15/5, a partir das 17h, na sede da entidade.

A iniciativa foi apreciada pelo público que foi à sede dia 17 de abril. A professora Lucília de Paula, da diretoria ampliada da ADUR e coordenadora do projeto espera que a atividade se consolide como um momento de congraçamento entre os segmentos da comunidade. Além de incentivar o debate político e a ampliação da consciência crítica. 

Terror na América Latina

Os regimes militares que se instalaram entre os anos 60 e 80 em países localizados no Cone Sul: Brasil, Uruguai, Argentina e Chile foram apoiados pelos Estados Unidos no contexto da Guerra Fria e da chamada “ameaça do comunismo”.  Provocaram a intervenção das Forças Armadas na vida política e a instalação da ditadura militar no Cone Sul: entre 1964 e 1985 no Brasil, entre 1973 e 1984 no Uruguai entre 1973 e 1989 no Chile e entre 1976 e 1983 na Argentina. Suprimem a liberdade democrática, promovem a extinção dos partidos políticos, a restrição dos poderes Legislativo e Judiciário e o fechamento de sindicatos e de organizações estudantis. Há forte censura à imprensa, e qualquer oposição ao governo é proibida. Adversários do regime são punidos com perseguições, prisões e deportações. 

Era comum a prática de tortura como método de interrogatório dos suspeitos de subversão. Em muitos casos, os governos militares do Cone Sul apóiam-se mutuamente em suas estratégias de repressão e manutenção do poder. As Mães da Praça de Maio ficaram conhecidas internacionalmente por sua peregrinação diária à praça de Buenos Aires em busca dos filhos desaparecidos. Gamma/Almanaque Abril.

 

 Início da página

 

Edições Anteriores      Comunicação       Home